Não foi barato, mas foi uma sensação. Em maio de 2007, a Suzlon pagou 450 milhões de euros (US$ 698 milhões) pela aquisição de 33,6% da Repower. Foi a maior aquisição já feita por uma companhia indiana na Alemanha. Mas, desde o início, os construtores alemães de turbinas nunca sentiram-se confortáveis com os seus novos patrões, temendo que os projetos de suas turbinas fossem em breve copiados na Índia. Tanti, que assumiu a diretoria do grupo de supervisão da Repower, insiste que essa não é a sua intenção.
Na verdade, a legislação empresarial alemã teria tornado impossível tal transferência de tecnologia. A Suzlon teria necessitado de um acordo de subordinação para ter acesso aos projetos. Para isso, Tanti precisaria submeter uma proposta de compra aos acionistas da Repower, mas primeiro teria que adquirir as ações dos principais acionistas, incluindo a Areva. Os franceses contavam com a opção, que poderia ser colocada em prática após um ano, de vender a sua participação acionária na Repower.
O ano ainda não terminara quando irrompeu o primeiro desentendimento devido à suspeita de que a Repower estivesse sendo vampirizada pelos indianos. Tanti irritou-se e reclamou publicamente da falta de respeito pelo seu compromisso por parte da companhia com sede em Hamburgo. "Afinal, estou criando empregos", argumentou Tanti. Mas ele não deixou dúvidas de que desejava obter o controle acionário majoritário sobre a Repower. E era exatamente isto o que o mercado desejava ouvir. Em meados de maio, o preço da ação da companhia subiu de 160 euros (US$ 248) para 240 euros (US$ 372) na época da aquisição.
O problema de Tanti foi que as ações da Areva, que ele pretendia adquirir no final de maio, ficaram subitamente muito caras. Porém, ninguém esperava por aquilo que ele fez a seguir. Quatro dias antes de a opção de compras das ações da Areva expirar, ele sugeriu, durante uma entrevista à imprensa financeira em Bombaim, que a Suzlon poderia cogitar vender algumas das suas ações da Repower para obter um lucro.
Derrubando as ações
A notícia teve o efeito desejado. A ação da Repower caiu de 240 euros para 200 euros (US$ 310). Os executivos na sede da Repower em Hamburgo ficaram furiosos. O fato de um grande acionista derrubar o preço das ações da companhia não tinha precedentes. O comportamento de Tanti provocou "grandes irritações", afirmou diplomaticamente um porta-voz da companhia. A tentativa indiana de acalmar os alemães através de uma mensagem de e-mail teve pouco efeito, da mesma forma que a notícia, divulgada alguns dias depois, de que ele pretendia comprar as ações de propriedade da Areva e a companhia de energia espanhola Martifer, após tudo isso.
Qualquer que tenha sido o objetivo da manobra de Tanti, ela atraiu a atenção da Autoridade Federal de Supervisão de Serviços Financeiros da Alemanha (BaFin). "Não há nenhuma investigação em curso, mas estamos observando a situação", diz a porta-voz da BaFin, Anja Engelland. O interesse da sua agência no caso provavelmente aumentou bastante na semana passada.
Na quinta-feira daquela semana a Suzlon anunciou a compra das ações da Areva. Segundo os negociantes, a Tanti pagou menos do que o valor atual das ações, mas a Areva aparentemente ficou satisfeita em sair com um lucro de 350 milhões de euros(US$ 543 milhões). Além disso, os indianos adquiriram discretamente as ações da Repower no mercado nos últimos dias, passando a controlar 66% da parcela acionária da companhia. Esta notícia não foi bem recebida pelos investidores, e, na sexta-feira, a ação da Repower caiu 6,5%. Mais uma vez, as preocupações quanto a uma possível transferência de know-how são grandes. Embora um porta-voz da Suzlon tenha dito que tais temores são "pura especulação", a companhia não chegou a negar que eles sejam justificados.
Porém, Tanti enfrenta problemas que poderão ser bem mais ameaçadores do que a insatisfação na Repower. Nos Estados Unidos, a Suzlon atualmente enfrenta o maior fracasso da sua história relativamente curta. Os indianos foram obrigados a fazer um recall de 1.251 lâminas de rotores de uma usina eólica no meio-oeste dos Estados Unidos, quando várias destas lâminas quebraram-se após terem sido utilizadas por um curto período.
Um porta-voz da Suzlon disse que as lâminas quebraram devido a uma alteração forte e imprevista da direção do vento, e afirmou que agora a companhia pretende reforçar as lâminas gigantes -a um custo estimado em US$ 30 milhões. Os especialistas nesta indústria duvidam que isso será suficiente. Segundo eles, os reparos em um ponto fraco de uma lâmina são caros, e geralmente só duram alguns anos. Além disso, a Suzlon poderia ser processada por danos pelos seus clientes.
De toda forma, os números são bons
Mas Tulsin Tanti não acredita que nenhum desses problemas seja insuperável. Ele tem fé nos seus números, e os números são bons. As vendas da companhia cresceram 71% -o que representa três vezes a média da indústria- no último ano fiscal. As receitas da Suzlon chegaram ao equivalente a 2,2 bilhões de euros (US$ 3,4 bilhões), e os lucros antes dos descontos referentes a impostos foram de 310 milhões de euros (US$ 480 milhões). A companhia domina o mercado indiano e detém uma fatia de 14% do mercado global. As suas fábricas funcionam em Pipestone, no Estado norte-americano de Minnesota, e em Tianjin, na China. Ela tem encomendas no valor de 2,8 bilhões de euros (US$ 4,3 bilhões). A Suzlon pretende dobrar a produção anual em 2010.
Mas pode haver um solavanco no caminho que há pela frente. O que acontecerá caso comecem a desaparecer as vantagens decorrentes do fato de a empresa estar situada na Índia? A Suzlon deve grande parte do seu sucesso aos baixos custos de produção. Mas e se estes subirem? Até mesmo os agricultores indianos, aqueles que trabalham arduamente nos campos próximos às turbinas eólicas, perceberam que alguém está ganhando muito dinheiro com essas usinas.
"De repente eles passaram a cobrar 20 vezes mais pela terra", reclamam os dirigentes da Suzlon. Outros querem pagamentos de aluguéis pelos terrenos onde situam-se as turbinas, bem como indenização pela restrição ao direito de locomoção nessas áreas.
Se a Suzlon recusa-se a pagar, os agricultores bloqueiam as rotas de acesso com os seus búfalos. Em 2007, 44 turbinas eólicas, ou um terço da capacidade total, tiveram que ser desativadas temporariamente em Sangli devido a ações deste tipo. Em uma outra localidade, a população rural pobre roubou escadas de alumínio e cabos de cobre de 63 novas turbinas e vendeu as peças valiosas para vendedores de ferro velho.
Recentemente, na vila de Chikhli, no distrito de Satara, moradores irados fizeram com que as turbinas fossem paradas porque sentiram que foram ludibriados pelos corredores de imóveis quando venderam as suas terras. Embora as vendas tenham ocorrido dez anos atrás, os ex-proprietários de terra estão convencidos de que ainda têm dinheiro a receber. A Suzlon sofrerá as conseqüências deste problema, não importando se decidir cooperar ou não com os agricultores.
(Por Michaela Schiessi, Der Spiegel, UOL, 13/06/2008)