Ibama e deputados têm estratégias distintas para passivos de hidrelétricas no RS
hidrelétrica barra grande
Hidrelétrica de Itá
hidrelétrica de machadinho
2008-06-12
A recente discussão sobre as compensações ambientais e socioeconômicas relativas às hidrelétricas de Itá, Machadinho e Barra Grande, que afetaram áreas do Rio Grande do Sul e Santa Catarina, vem apontando para diferentes estratégias de solução por parte das instituições federal e estadual. Enquanto a Superintendência Regional do Ibama propõe trazer para o Estado gaúcho uma série de atividades de pós-licenciamento ambiental, a Assembléia Legislativa (AL-RS) criou uma subcomissão que parece estar mais focada no problema das compensações financeiras (royalties) e tributária (de retorno do ICMS) aos municípios de influência das referidas hidrelétricas.
De acordo com a Assessoria de Comunicação do Ibama/RS a Superintendência Regional do órgão conseguiu gestionar, em Brasilia, medidas para que seja realizado o monitoramento ambiental desses empreendimentos já licenciados. A idéia é capacitar os técnicos locais do órgão para atuar em atividades de pós-licenciamento de projetos não apenas das hidrelétricas em questão, mas de outros empreendimentos de grande porte, como o da Rota do Sol e do Porto de Rio Grande. Com isto, o Ibama-RS pretende ter um controle mais próximo dos desdobramentos dos impactos ambientais.
No último dia 15 de maio a Procuradoria da República de Erechim se reuniu com o Ibama-RS para discutir temas pendentes da reunião anterior, realizada em 29/04, visando encaminhar, entre outros assuntos, a criação do refúgio da vida silvestre do Rio Pelotas e dos Campos de Cima da Serra, segundo o Decreto Federal 4.340, de 22/8/2002. A área total proposta para este corredor ecológico, de 268.195 hectares, atinge, no Rio Grande do Sul, os municípios de São José dos Ausentes (em 54,8% de seu território), Bom Jesus (20%) e Cambará do Sul (8,6%). Municípios catarinenses também serão abrangidos, e há uma rejeição de prefeitos de municípios de ambos os estados quanto à criação da reserva.
No entanto, há diversas pendências não cumpridas no licenciamento ambiental das hidrelétricas. Conforme representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), presentes ao encontro convocado pelo MPF em 15 de maio, em Erechim, somente em relação a Machadinho, são 400 itens não cumpridos pelo consórcio Maesa.
Comissão dos municípios
Na AL-RS, o foco dos debates tem sido as compensações financeira e tributária dos municípios das áreas de influência das hidrelétricas. Com este objetivo, foi criada uma subcomissão específica para debater este assunto, formalizada no último dia 4. Em princípio, a subcomissão ficou no âmbito da Comissão de Assuntos Municipais. Contudo, quando de sua criação oficial, na semana passada, passou a ser compartilhada com a Comissão de Saúde e Meio Ambiente.
Há questionamentos sobre até que ponto esta subcomissão poderá auxiliar na resolução dos impasses complexos gerados a partir da falta de cumprimento de acordos após o licenciamento ambiental das hidrelétricas. Primeiro, porque muitas condicionantes, como a criação do corredor ecológico, atingem também municípios catarinenses (11), fora do âmbito da AL-RS. Segundo, porque, na semana passada, ficou claro que os trabalhos serão direcionados mais para as questões econômicas (de compensações) do que ambientais, o que se evidenciou pela presença do presidente da Comissão de Economia e Desenvolvimento da AL-RS, Nelson Härter (PMDB), que reforçou a rejeição dos prefeitos quanto à criação do refúgio.
A reportagem do AmbienteJÁ ouviu, no último dia 5 de junho, o deputado Raul Carrion (PCdoB), que foi um dos primeiros a propor a criação da subcomissão para tratar dos passivos de Itá, Machadinho e Barra Grande. Ele sustenta que a AL-RS vai fazer a sua parte para dar espaço ao debate e que inclusive tem poder de encaminhamento dessas questões em nível federal. Confira a entrevista:
AmbienteJÁ – Por que a discussão da compensação dos municípios atingidos por hidrelétricas do Rio Uruguai passou agora também para a Comissão de Saúde e Meio Ambiente [antes estava apenas na Comissão de Assuntos Municipais]?
Carrion – Nós fizemos uma primeira audiência pública, na Comissão de Assuntos Municipais, que reuniu as comissões de Assuntos Municipais e de Saúde e Meio Ambiente. Nós fomos procurados por prefeitos e vice-prefeitos... é um problema que envolve mais de dez municípios do Rio Grande do Sul, outros tantos de Santa Catarina, que são o caso de barragens de Machadinho, de Itá, de Barra Grande e, por outro lado, envolve questões ambientais, ainda que a discussão não seja só ambiental, seja também das conseqüências econômicas, sociais etc. Então fizemos primeiramente uma audiência pública destas duas comissões. Nesta audiência pública, entre os encaminhamentos, e pela necessidade de dar continuidade a este debate, surgiu a idéia de uma subcomissão que novamente reunisse as duas comissões – a municipal, com as preocupações dos prefeitos – eles têm preocupações com relação aos royalties, com perda de áreas, e uma série de coisas. Então, envolve questões municipais e ambientais. A partir daí, encaminhamos conjuntamente, eu e o deputado Sossella [Gilmar Sossela/PDT], um pedido de uma subcomissão que reunisse novamente as duas comissões que haviam feito a audiência pública. Nós já tínhamos aprovado na Comissão de Assuntos Municipais a realização desta subcomissão e, posteriormente, no dia 4 [de junho], a Comissão de Saúde e Meio Ambiente aprovou, no final, a subcomissão. Então já está criada a subcomissão, tem deputados de Assuntos Municipais e tem deputados da Saúde e Meio Ambiente, e agora nós vamos assumir na semana que vem [nesta semana], fazer uma reunião.
AmbienteJÁ – Como esta subcomissão vai dar conta do problema dos passivos dos municípios em razão das hidrelétricas se este problema envolve também municípios de fora do RS?
Carrion – Não há problema. Nós podemos chamar prefeitos daqui. Nós não temos poder de formar uma comissão em Santa Catarina. Nós só temos poder de formar uma comissão no Rio Grande do Sul. Mas eu acho que eles [os prefeitos] têm que lutar para que a Assembléia Legislativa de Santa Catarina forme uma comissão. Nós podemos até tentar discutir esta preocupação, quando reunirmos, aqui.
AmbienteJÁ – É possível dar um encaminhamento para a questão dos royalties no Âmbito do RS?
Carrion – No caso dos royalties... qual é a preocupação? É que eles não são pagos em função do verdadeiro valor da tarifa. São pagos em cima de um outro valor, de um diferencial sobre a tarifa, bem menor. Então, o preço a que são vendidos é um. O preço a que são pagos os royalties é outro. Isso é uma questão em que nós pressionamos o representante da Aneel [Agência Nacional de Energia Elétrica], aqui, da CEEE, e ele não soube responder absolutamente nada. Vamos dizer que tiremos uma opinião diferente... vamos então encaminhar para o governo federal. Uma Assembléia Legislativa faz tratativas em nível nacional. Agora a segunda questão: a distribuição do ICMS. A distribuição dos royalties é em função da área atingida. A do ICMS é só em cima do município sede da hidrelétrica.
AmbienteJÁ – E no caso da compensação ambiental exigida devido aos erros no licenciamento da Usina de Barra Grande, como vai ficar?
Carrion – Esta comissão não necessariamente vai conseguir resolver problemas do passado. Ela tem que pensar já nas futuras hidrelétricas, veremos que medidas têm que ser tomadas, que normas têm que ser definidas para evitar problemas como hoje ocorrem. E em relação a esta aí, existem denúncias, existe uma série de determinações do Ibama que não foram seguidas e que estão aí "para inglês ver". Então uma subcomissão, neste caso, tem um poder político de pressionar, de chamar o Ibama. Se tem uma norma e não foi cumprida, como é que é? E se os deputados de Santa Catarina não tiveram agilidade, não tiveram a preocupação, dormiram no ponto, ou estão nas mãos de outros interesses, o problema é deles. Nós, do Rio Grande do Sul, vamos fazer a nossa parte. Os municípios do Rio Grande do Sul, nós vamos defender.
AmbienteJÁ – Os produtores rurais e prefeitos dos municípios da área de influência de Itá, Machadinho e Barra Grande não querem que suas terras seja ocupadas por uma reserva ecológica – que seria a compensação pelos problemas de licenciamento de Barra Grande. Como a subcomissão da AL-RS vai encaminhar isto?
Carrion – A subcomissão vai se reunir... recém ontem [04/06] foi aprovada na Comissão de Saúde e Meio Ambiente, não podíamos chamar a comissão para funcionar sem que as duas comissões [Assuntos Municipais e Saúde e Meio Ambiente] estivessem reunidas. Então nós, na semana que vem [nesta semana], vamos definir um dia, conversar com os deputados que foram indicados, instalaremos a comissão, para fazer um plano de trabalho.
AmbienteJÁ – Existe uma posição dos deputados desta subcomissão sobre como formar o corredor ecológico sem subtrair terras utilizadas na produção rural desses municípios atingidos pelas hidrelétricas?
Carrion – Nós não podemos impedir que surjam hidrelétricas. Nós vamos lutar para, em primeiro lugar, ver quais as irregularidades que existem em relação às já existentes; que medidas podem ser tomadas para pressionar que as exigências legais sejam cumpridas. Isto é uma parte. Sobre o passado, é isto que vamos fazer. E se houver situações de agricultores desalojados, que não foram reassentados, nós vamos batalhar por eles. É isto. Então tem que conhecer bem o problema. Em segundo lugar, nós vamos, em relação às futuras hidrelétricas, discutir normas mais rígidas, mais sérias, que sejam respeitadas, e se elas se mostrarem inadequadas, vamos propor normas novas. Terceiro, nós vamos discutir esta questão do ICMS, inclusive órgãos do Estado se dispuseram já a discutir. Nós achamos incorreto que o ICMS seja só da sede da hidrelétrica e os demais municípios que foram atingidos, que estão contribuindo com suas terras, para isto, não tenham parte – o que é injusto. É uma questão de ICMS do Rio Grande do Sul. Santa Catarina, que eles façam como acharem melhor. E quarto, vamos discutir questões como esta dos royalties, que nos parece o seguinte: se é um royalty, que é um percentual sobre a energia vendida, tem que ser sobre o valor pago pela energia, e não por um valor diminuído por uma proporção.
AmbienteJÁ – A Aneel não tem este cálculo?
Carrion – A Aneel não veio [à reunião do dia 04/06], veio um representante da CEEE que falou por ela. E quando se levantou esta questão, ele disse que não sabia.
(Por Cláudia Viegas, AmbienteJÁ, 12/06/2008)