O climatologista Patrick Michaels, da Universidade de Virgínia, nos Estados Unidos, é o mais conhecido entre os chamados céticos do aquecimento global. A qualificação é paradoxal, pois ele colaborou com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e não contesta os princípios científicos que sustentam a advertência, feita pela conferência da ONU, sobre o aumento nas emissões de gases do efeito estufa.
A diferença é que, ao contrário do IPCC, ele não vê nada de catastrófico nas mudanças climáticas. Pesquisador do Instituto Cato, em Washington, Michaels dedica-se a palestras e a escrever artigos contra o que considera uma visão apocalíptica da climatologia. Ele argumenta que o fato de suas pesquisas contarem com o apoio de indústrias de energia reforça a credibilidade de seus artigos, pois faz com que sejam examinados com maior rigor por seus críticos. O cientista, que recentemente participou do seminário internacional “Aquecimento global — O dilema político e econômico”, promovido pelo Centro de Liderança Pública (CLP) e pelo Ibmec, em São Paulo, concedeu a seguinte entrevista a VEJA.
Empresas de energia ajudam a financiar seus estudos sobre o aquecimento global. Isso não afeta a credibilidade de seu trabalho? Ao contrário, reforça. Como a contribuição do setor energético é de conhecimento público, os críticos dedicam vigor especial à busca de erros em minhas pesquisas. Todo artigo que publico é revisado minuciosamente por especialistas. Para sobreviverem a tal escrutínio, meus argumentos precisam ser bastante sólidos.
O senhor concorda com a afirmação de que a temperatura global está aumentando? Sim.
O senhor concorda que isso ocorre devido à ação humana? Sim, é correta a tese de que a temperatura na superfície terrestre aumenta devido à crescente emissão de gás carbônico. Mudanças na concentração desse gás fazem com que a temperatura fique mais alta na superfície, enquanto a estratosfera esfria. Ocorreram dois períodos recentes de aquecimento do ar na superfície terrestre. O primeiro foi no início do século XX, entre 1910 e 1945, e o último começou nos anos 70 e dura até hoje. O aquecimento da primeira metade do século passado provavelmente pouco teve a ver com a eventual influência humana na composição da atmosfera. Esteve muito mais relacionado ao aumento da temperatura do Sol. Já o segundo período parece estar muito mais vinculado ao fator humano e ao aumento do nível de gás carbônico na atmosfera.
Qual desses períodos foi mais quente? As magnitudes do primeiro e do segundo período de aquecimento global mal podem ser diferenciadas estatisticamente, pois são muito semelhantes. De qualquer forma, o atual período é 0,8 grau mais quente que o anterior. Praticamente metade desse aumento de temperatura tem como causa mudanças nas concentrações de dióxido de carbono no ar, que se elevaram muito no segundo período.
Suas opiniões parecem moderadas para quem é considerado o mais influente cético em relação ao aquecimento global. Afinal, em que pontos o senhor discorda das teses apresentadas nos relatórios do IPCC? Não há discordâncias relevantes entre minha opinião e os dados do IPCC. Eu mesmo contribuí com analises de pesquisas que foram utilizadas pelo IPCC. Considero, no entanto, que algumas previsões são exageradas. Quando aplicamos a taxa atual de elevação de temperatura em modelos de computador, chegamos à conclusão de que o aquecimento no século XXI não será maior do que a previsão mais otimista do IPCC.
Ou seja, por volta do ano 2100 a temperatura global estará apenas 1,7 grau acima da atual. Digo isso porque a taxa de aquecimento tem sido notavelmente constante. O aumento na temperatura é proporcional à concentração de gás carbônico e ao impacto desse gás no efeito estufa. Esses fatores indicam uma tendência de aquecimento constante, mas não crescente. Outra ressalva diz respeito à maneira como as previsões climáticas são feitas. Apesar de serem baseadas nas análises e nos métodos mais modernos que existem, é preciso cautela. Basta olhar pela janela e comparar a realidade com a previsão do tempo divulgada dias atrás. Se os erros são tão freqüentes no curto prazo, imagine quanto se pode errar em um período mais longo.
O senhor considera irrelevante o aumento de 1,7 grau na temperatura até o fim do século? Há grande chance de essa previsão nem sequer se concretizar. A tecnologia que usaremos daqui a 100 anos nas indústrias, nos automóveis e nas usinas geradoras de eletricidade será provavelmente mais eficiente em termos de emissão de gás carbônico do que a atual. Infelizmente, não posso precisar como serão as novas tecnologias, mas a história da evolução tecnológica é um guia do avanço que pode ocorrer. Por essa razão, nossa previsão sobre o aumento na emissão de gás carbônico é bastante questionável. Não há como saber se os índices atuais de poluição serão mantidos no fim do século XXI.
Quais seriam as conseqüências do aumento de 1,7 grau na temperatura média global? Há grande variedade de opiniões. Alguns economistas pensam que um aquecimento modesto seria benéfico. As visões apocalípticas da mudança climática estão associadas à idéia, com pouco embasamento científico, de que a Groenlândia está perdendo sua camada de gelo. Muitos estudos comprovam que, entre as décadas de 50 e 60, as temperaturas naquela região foram, em média, mais altas do que na última década.
Que benefício pode existir no aquecimento global? O clima não é apenas aquilo que se mede no termômetro, mas uma combinação de temperatura e umidade. Em locais com a devida umidade, quanto maior a temperatura da superfície, maior é a quantidade de seres vivos. Os trópicos são o exemplo. Essa é uma das vantagens do aquecimento. Outra diz respeito às taxas de mortalidade, que são mais altas no inverno do que no verão. Se, com o aquecimento, tivermos invernos mais curtos, o número de mortes também diminuirá. Quando a temperatura sobe de forma drástica, como ocorreu durante as ondas de calor na Europa, algumas pessoas morrem por não estar preparadas para mudanças climáticas bruscas. O calor será menos nocivo se a temperatura aumentar gradualmente.
Uma prova do perigo do aquecimento global citada com freqüência são seus efeitos sobre os ursos-polares. Com a diminuição da área congelada no Ártico, a espécie enfrenta maior dificuldade para encontrar alimento. O número de ursos-polares já está diminuindo... Pesquisas do governo canadense revelam que, na realidade, o número de ursos-polares é alto.
Outra conseqüência incontestada no meio científico é a elevação do nível do mar. Isso não é um problema? Devido a fatores geológicos, não climáticos, nos últimos 100 anos o nível do mar subiu quase 30 centímetros na costa leste dos Estados Unidos. Poucas pessoas perceberam, pois os moradores da costa se adaptaram perfeitamente ao novo nível.
As geleiras dos Andes estão diminuindo. Como ficariam as populaces andinas se elas desaparecessem? Quando o gelo das montanhas se derrete, como está ocorrendo nos Andes, pode-se tentar represá-lo. Dizem que, devido ao risco de terremotos, é perigoso construir barragens para captar a água do degelo nos Andes. Mas esse tipo de represamento existe na Califórnia, que também é uma região de atividade sísmica intensa. Sugerir que os sul-americanos não conseguiriam se adaptar a tal situação é falta de respeito para com esses povos.
Se o senhor estiver correto e o aquecimento global não for uma ameaça para a humanidade, isso significa que é desnecessário reduzir as emissões de dióxido de carbono e de outros gases do efeito estufa? É extremamente imprudente gastar dinheiro para tentar reduzir as emissões de gás carbônico. O custo para chegar a isso seria muito alto. Esse capital poderia ser mais bem investido em pesquisa e desenvolvimento de novas fontes de energia. Um exemplo: a resposta política do governo americano ao aquecimento global foi uma lei, aprovada em 2005, que exige a substituição de certa quantidade de gasolina por etanol. Nos Estados Unidos, existe apenas uma matéria prima capaz de produzir grande quantidade desse combustível, que é o milho. A demanda foi tamanha que, no ano passado, os Estados Unidos dedicaram a esse fim 33% da colheita de milho. A colheita americana representa 54% da produção mundial. Em outras palavras, 15% de todo o milho do planeta foi desviado para a produção de combustível. Como conseqüência, o preço do milho, da soja e do trigo subiu dramaticamente. Hoje se vêem em vários países protestos contra o preço abusivo dos alimentos. O caso do etanol americano foi o resultado de uma intervenção política irracional.
Outras tentativas de reduzir as emissões também devem ser abandonadas? É impossível reduzir drasticamente as emissões e ainda dispor de recursos para investir em novas fontes de energia. Não existe uma alternativa que seja ao mesmo tempo tecnológica e politicamente viável. O fracasso do Protocolo de Kioto é um exemplo dessa incapacidade. Se todos os países fizessem o que prometeram ao assinar esse documento, a temperatura deixaria de subir 0,7 grau em cinqüenta anos. O primeiro problema é que se trata de uma variação pequena demais para ser medida.
O segundo é que o custo para chegar a isso seria muito alto e provavelmente ineficaz. Um exemplo: nos Estados Unidos, a gasolina atualmente custa cerca de 1 dólar o litro. Pensavase, há alguns anos, que a elevação do preço em 25 centavos seria suficiente para atingir o objetivo do Protocolo de Kioto no que diz respeito às emissões automotivas. O preço está onde está devido à alta do barril de petróleo e o consumo de combustível praticamente não mudou. A questão é saber até que ponto é preciso encarecer a energia para que as emissões caiam pela metade.
Muito melhor seria investir em tecnologia agora para que, daqui a 100 anos, estejamos em um patamar tão avançado que torne possível encontrar uma solução técnica para o aquecimento. Difícil será incentivar as pesquisas tecnológicas se a economia for arruinada pelas tentativas de tentar frear agora o aquecimento global. Essa saída é contraprodutiva.
Grande parte da pressão para que o Brasil barre a destruição da Amazônia está ligada ao temor de que o desmatamento contribua para o aquecimento global. Em sua opinião, essa é a razão correta para proteger a floresta? Não. A verdadeira razão, nesse caso, é o valor intrínseco da floresta. Os números mostram que o desmatamento não é o grande culpado pelo aumento do aquecimento global, se comparado com a queima de combustíveis fósseis. Tentar justificar a preservação com o argumento do aquecimento global é uma mentira. Acredito que a preservação das áreas silvestres é uma decisão social e econômica que as pessoas nos países em desenvolvimento precisam tomar.
Os países emergentes argumentam que não é justo terem de reduzir suas emissões de poluentes porque os países ricos, para chegar ao patamar em que estão, poluíram muito mais. O senhor concorda? É um argumento falso. Os países pobres podem até afirmar que sua emissão de poluentes per capita é bem menor que a dos países ricos. Se o cálculo for feito em proporção ao PIB de cada país, no entanto, chegaremos à conclusão de que poluem muito. Essa é a maneira correta de analisar o assunto.
Por que tantos cientistas respeitados corroboram a idéia de que é preciso reduzir as emissões de gases do efeito estufa quanto antes? Não acredito que muitos cientistas defendam essa posição.
Como o senhor vê as posições sobre o aquecimento dos dois candidatos à Presidência dos Estados Unidos? Os discursos de Barack Obama e John McCain são indistinguíveis. Tudo indica que, se o atual presidente dificilmente vai aprovar qualquer lei que restrinja as emissões de dióxido de carbono, é quase certo que o próximo vai fazê-lo. Infelizmente.
O climatologista Patrick Michaels, da Universidade de Virgínia, nos Estados Unidos, é o mais conhecido entre os chamados céticos do aquecimento global. A qualificação é paradoxal, pois ele colaborou com o Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC) e não contesta os princípios científicos que sustentam a advertência, feita pela conferência da ONU, sobre o aumento nas emissões de gases do efeito estufa.
A diferença é que, ao contrário do IPCC, ele não vê nada de catastrófico nas mudanças climáticas. Pesquisador do Instituto Cato, em Washington, Michaels dedica-se a palestras e a escrever artigos contra o que considera uma visão apocalíptica da climatologia. Ele argumenta que o fato de suas pesquisas contarem com o apoio de indústrias de energia reforça a credibilidade de seus artigos, pois faz com que sejam examinados com maior rigor por seus críticos. O cientista, que recentemente participou do seminário internacional “Aquecimento global — O dilema político e econômico”, promovido pelo Centro de Liderança Pública (CLP) e pelo Ibmec, em São Paulo, concedeu a seguinte entrevista a VEJA.
Empresas de energia ajudam a financiar seus estudos sobre o aquecimento global. Isso não afeta a credibilidade de seu trabalho? Ao contrário, reforça. Como a contribuição do setor energético é de conhecimento público, os críticos dedicam vigor especial à busca de erros em minhas pesquisas. Todo artigo que publico é revisado minuciosamente por especialistas. Para sobreviverem a tal escrutínio, meus argumentos precisam ser bastante sólidos.
O senhor concorda com a afirmação de que a temperatura global está aumentando? Sim.
O senhor concorda que isso ocorre devido à ação humana? Sim, é correta a tese de que a temperatura na superfície terrestre aumenta devido à crescente emissão de gás carbônico. Mudanças na concentração desse gás fazem com que a temperatura fique mais alta na superfície, enquanto a estratosfera esfria. Ocorreram dois períodos recentes de aquecimento do ar na superfície terrestre. O primeiro foi no início do século XX, entre 1910 e 1945, e o último começou nos anos 70 e dura até hoje. O aquecimento da primeira metade do século passado provavelmente pouco teve a ver com a eventual influência humana na composição da atmosfera. Esteve muito mais relacionado ao aumento da temperatura do Sol. Já o segundo período parece estar muito mais vinculado ao fator humano e ao aumento do nível de gás carbônico na atmosfera.
Qual desses períodos foi mais quente? As magnitudes do primeiro e do segundo período de aquecimento global mal podem ser diferenciadas estatisticamente, pois são muito semelhantes. De qualquer forma, o atual período é 0,8 grau mais quente que o anterior. Praticamente metade desse aumento de temperatura tem como causa mudanças nas concentrações de dióxido de carbono no ar, que se elevaram muito no segundo período.
Suas opiniões parecem moderadas para quem é considerado o mais influente cético em relação ao aquecimento global. Afinal, em que pontos o senhor discorda das teses apresentadas nos relatórios do IPCC? Não há discordâncias relevantes entre minha opinião e os dados do IPCC. Eu mesmo contribuí com analises de pesquisas que foram utilizadas pelo IPCC. Considero, no entanto, que algumas previsões são exageradas. Quando aplicamos a taxa atual de elevação de temperatura em modelos de computador, chegamos à conclusão de que o aquecimento no século XXI não será maior do que a previsão mais otimista do IPCC.
Ou seja, por volta do ano 2100 a temperatura global estará apenas 1,7 grau acima da atual. Digo isso porque a taxa de aquecimento tem sido notavelmente constante. O aumento na temperatura é proporcional à concentração de gás carbônico e ao impacto desse gás no efeito estufa. Esses fatores indicam uma tendência de aquecimento constante, mas não crescente. Outra ressalva diz respeito à maneira como as previsões climáticas são feitas. Apesar de serem baseadas nas análises e nos métodos mais modernos que existem, é preciso cautela.
Basta olhar pela janela e comparar a realidade com a previsão do tempo divulgada dias atrás. Se os erros são tão freqüentes no curto prazo, imagine quanto se pode errar em um período mais longo.
O senhor considera irrelevante o aumento de 1,7 grau na temperatura até o fim do século? Há grande chance de essa previsão nem sequer se concretizar. A tecnologia que usaremos daqui a 100 anos nas indústrias, nos automóveis e nas usinas geradoras de eletricidade será provavelmente mais eficiente em termos de emissão de gás carbônico do que a atual. Infelizmente, não posso precisar como serão as novas tecnologias, mas a história da evolução tecnológica é um guia do avanço que pode ocorrer. Por essa razão, nossa previsão sobre o aumento na emissão de gás carbônico é bastante questionável. Não há como saber se os índices atuais de poluição serão mantidos no fim do século XXI.
Quais seriam as conseqüências do aumento de 1,7 grau na temperatura média global? Há grande variedade de opiniões. Alguns economistas pensam que um aquecimento modesto seria benéfico. As visões apocalípticas da mudança climática estão associadas à idéia, com pouco embasamento científico, de que a Groenlândia está perdendo sua camada de gelo. Muitos estudos comprovam que, entre as décadas de 50 e 60, as temperaturas naquela região foram, em média, mais altas do que na última década.
Que benefício pode existir no aquecimento global? O clima não é apenas aquilo que se mede no termômetro, mas uma combinação de temperatura e umidade. Em locais com a devida umidade, quanto maior a temperatura da superfície, maior é a quantidade de seres vivos. Os trópicos são o exemplo. Essa é uma das vantagens do aquecimento. Outra diz respeito às taxas de mortalidade, que são mais altas no inverno do que no verão. Se, com o aquecimento, tivermos invernos mais curtos, o número de mortes também diminuirá. Quando a temperatura sobe de forma drástica, como ocorreu durante as ondas de calor na Europa, algumas pessoas morrem por não estar preparadas para mudanças climáticas bruscas. O calor será menos nocivo se a temperatura aumentar gradualmente.
Uma prova do perigo do aquecimento global citada com freqüência são seus efeitos sobre os ursos-polares. Com a diminuição da área congelada no Ártico, a espécie enfrenta maior dificuldade para encontrar alimento. O número de ursos-polares já está diminuindo... Pesquisas do governo canadense revelam que, na realidade, o número de ursos-polares é alto.
Outra conseqüência incontestada no meio científico é a elevação do nível do mar. Isso não é um problema? Devido a fatores geológicos, não climáticos, nos últimos 100 anos o nível do mar subiu quase 30 centímetros na costa leste dos Estados Unidos. Poucas pessoas perceberam, pois os moradores da costa se adaptaram perfeitamente ao novo nível.
As geleiras dos Andes estão diminuindo. Como ficariam as populaces andinas se elas desaparecessem? Quando o gelo das montanhas se derrete, como está ocorrendo nos Andes, pode-se tentar represá-lo. Dizem que, devido ao risco de terremotos, é perigoso construir barragens para captar a água do degelo nos Andes. Mas esse tipo de represamento existe na Califórnia, que também é uma região de atividade sísmica intensa. Sugerir que os sul-americanos não conseguiriam se adaptar a tal situação é falta de respeito para com esses povos.
Se o senhor estiver correto e o aquecimento global não for uma ameaça para a humanidade, isso significa que é desnecessário reduzir as emissões de dióxido de carbono e de outros gases do efeito estufa? É extremamente imprudente gastar dinheiro para tentar reduzir as emissões de gás carbônico. O custo para chegar a isso seria muito alto. Esse capital poderia ser mais bem investido em pesquisa e desenvolvimento de novas fontes de energia. Um exemplo: a resposta política do governo americano ao aquecimento global foi uma lei, aprovada em 2005, que exige a substituição de certa quantidade de gasolina por etanol.
Nos Estados Unidos, existe apenas uma matéria prima capaz de produzir grande quantidade desse combustível, que é o milho. A demanda foi tamanha que, no ano passado, os Estados Unidos dedicaram a esse fim 33% da colheita de milho. A colheita americana representa 54% da produção mundial. Em outras palavras, 15% de todo o milho do planeta foi desviado para a produção de combustível. Como conseqüência, o preço do milho, da soja e do trigo subiu dramaticamente. Hoje se vêem em vários países protestos contra o preço abusivo dos alimentos. O caso do etanol americano foi o resultado de uma intervenção política irracional.
Outras tentativas de reduzir as emissões também devem ser abandonadas? É impossível reduzir drasticamente as emissões e ainda dispor de recursos para investir em novas fontes de energia. Não existe uma alternativa que seja ao mesmo tempo tecnológica e politicamente viável. O fracasso do Protocolo de Kioto é um exemplo dessa incapacidade. Se todos os países fizessem o que prometeram ao assinar esse documento, a temperatura deixaria de subir 0,7 grau em cinqüenta anos. O primeiro problema é que se trata de uma variação pequena demais para ser medida.
O segundo é que o custo para chegar a isso seria muito alto e provavelmente ineficaz. Um exemplo: nos Estados Unidos, a gasolina atualmente custa cerca de 1 dólar o litro. Pensavase, há alguns anos, que a elevação do preço em 25 centavos seria suficiente para atingir o objetivo do Protocolo de Kioto no que diz respeito às emissões automotivas. O preço está onde está devido à alta do barril de petróleo e o consumo de combustível praticamente não mudou. A questão é saber até que ponto é preciso encarecer a energia para que as emissões caiam pela metade.
Muito melhor seria investir em tecnologia agora para que, daqui a 100 anos, estejamos em um patamar tão avançado que torne possível encontrar uma solução técnica para o aquecimento. Difícil será incentivar as pesquisas tecnológicas se a economia for arruinada pelas tentativas de tentar frear agora o aquecimento global. Essa saída é contraprodutiva.
Grande parte da pressão para que o Brasil barre a destruição da Amazônia está ligada ao temor de que o desmatamento contribua para o aquecimento global. Em sua opinião, essa é a razão correta para proteger a floresta? Não. A verdadeira razão, nesse caso, é o valor intrínseco da floresta. Os números mostram que o desmatamento não é o grande culpado pelo aumento do aquecimento global, se comparado com a queima de combustíveis fósseis. Tentar justificar a preservação com o argumento do aquecimento global é uma mentira. Acredito que a preservação das áreas silvestres é uma decisão social e econômica que as pessoas nos países em desenvolvimento precisam tomar.
Os países emergentes argumentam que não é justo terem de reduzir suas emissões de poluentes porque os países ricos, para chegar ao patamar em que estão, poluíram muito mais. O senhor concorda? É um argumento falso. Os países pobres podem até afirmar que sua emissão de poluentes per capita é bem menor que a dos países ricos. Se o cálculo for feito em proporção ao PIB de cada país, no entanto, chegaremos à conclusão de que poluem muito. Essa é a maneira correta de analisar o assunto.
Por que tantos cientistas respeitados corroboram a idéia de que é preciso reduzir as emissões de gases do efeito estufa quanto antes? Não acredito que muitos cientistas defendam essa posição.
Como o senhor vê as posições sobre o aquecimento dos dois candidatos à Presidência dos Estados Unidos? Os discursos de Barack Obama e John McCain são indistinguíveis. Tudo indica que, se o atual presidente dificilmente vai aprovar qualquer lei que restrinja as emissões de dióxido de carbono, é quase certo que o próximo vai fazê-lo. Infelizmente.
(Por Diogo Schelp,
Revista Veja, Planeta Sustentável, 11/06/08)