(29214)
(13458)
(12648)
(10503)
(9080)
(5981)
(5047)
(4348)
(4172)
(3326)
(3249)
(2790)
(2388)
(2365)
biocombustíveis segurança alimentar
2008-06-12

As “verdades e mentiras” que se confundem na polêmica sobre os agrocombustíveis ignoram ou invertem certos efeitos, como o fato de que empregar soja para fazer biodiesel não reduz a produção de alimentos, pelo contrário, aumenta, segundo especialistas. Quem procura resolver a equação, destacando que nem sempre há oposição entre produção de alimentos e agroenergia, é Segundo Urquiaga, pesquisador da Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa).

O óleo, que representa entre 18% e 20% da soja, foi sempre um “subproduto” que agora ganha maior valor por sua conversão em biodiesel, afirma Urquiaga. O derivado principal dessa leguminosa é a proteína, que constitui cerca de 40% e que estão concentrados na casca, destinada, sobretudo, à alimentação do gado. Assim, quando mais óleo se destinar ao combustível mais aumentará, e em proporção maior, a produção de proteína que, no final da cadeia, servirá para a alimentação humana, explica o pesquisador à IPS.

Além disso, por sua capacidade de fixar o nitrogênio do ar, a soja é um cultivo ideal para recuperar pastagens degradadas, em um sistema integrado de semeadura e pecuária, acrescenta o especialista. A inoculação de bactérias para potenciar essa capacidade de fixação do fertilizante é uma tecnologia desenvolvida pelo centro de Agrobiologia da Embrapa, onde trabalha Urquiaga. Essa faculdade fixadora, característica das leguminosas, já foi incorporada a algumas variedades de cana-de-açúcar e há possibilidade de estendê-la a alimentos cotidianos da população brasileira, como arroz, milho e mandioca, e de ampliá-la aos feijões, o que indica o “caminho longo e prometedor” que a ciência deve percorrer, reconhece o pesquisador.

O investimento em ciência oferece “os melhores retornos” e pode encontrar novas áreas agrícolas, como ocorreu com o cerrado, a extensa savana que ocupa todo o centro do Brasil e que era considerado “improdutivo” até a década de 70, recorda Urquiaga. Estes são aspectos esquecidos nas distorcida polêmica sobre a agroenergia, atropelada pela crise mundial dos alimentos, lamenta o cientista. A discussão tende a incriminar de maneira simplista os biocombustíveis, refinados de cultivos que também servem para a alimentação humana, pois lhes “roubam” terras cultiváveis, sem admitir a possibilidade de sinergias, acrescenta.

A resposta brasileira, tanto do governo quanto dos empresários do agronegócio, é que a existência de pelo menos 50 milhões de hectares de pastagens degradadas, cuja produtividade poderia ser recuperada, permite expandir os biocombustíveis sem afetar os alimentos nem as selvas amazônicas. Trata-se de uma área equivalente a quase toda a que hoje é destinada à produção de grãos neste enorme país, o que permitiria, em teoria, duplicá-la. O problema é que esse reaproveitamento das velhas pastagens não se materializa até agora de maneira significativa, e a pecuária segue sua marcha sobre a Amazônia, provocando desmatamento, que é a maior fonte de gases causadores do efeito estufa no Brasil. Os ambientalistas se preocupam com o efeito dominó.

Os produtores de etanol de cana-de-açúcar, com maior poder econômico, adquirem as melhores terras deslocando os cultivos de soja e outros grãos que, por sua vez, empurram a pecuária, menos rentável e que necessita de grandes áreas, para terras amazônicas mais baratas ou inclusive gratuitas, em virtude da posse fraudulenta de terrenos públicos. Mais grave é o “efeito exponencial”, porque com um hectare vendido ao plantador de soja o pecuarista poderá comprar cinco hectares ou mais de floresta para desmatar, disse à IPS Sérgio Guimarães, coordenador do Instituto Centro de Vida, que atua no Mato Grosso, o Estado que mais produz soja no Brasil e o que mais desmata a Amazônia.

Os biocombustíveis foram propostos para mitigar o aquecimento global, pois sua queima emite menos gases causadores do efeito estufa do que os derivados dos hidrocarbonos. Mas, perderam a batalha pela opinião pública, responsabilizados por parte da crise alimentar e por danos ambientais e sociais, como o desmatamento amazônico e o trabalho em condições de escravidão no Brasil. O governo parece ter conseguido – pelo menos perante boa parte dos governantes e autoridades presentes na Cúpula Alimentar Mundial realizada na semana passada em Roma – absolver seu etanol de cana, distinguindo-o do similar produzido os Estados Unidos a partir do milho e à custa de altos subsídios.

A cana apresenta uma eficiência energética muitas vezes superior ao milho, e o açúcar é hoje uma exceção de baixos preços no mercado mundial, além do que o Brasil exporta crescentes excedentes de grãos e outros alimentos, apesar da grande expansão de seu etanol nos últimos anos. Mas, cerca de 80% do biodiesel brasileiro são feitos a partir da soja, plantada pelos grandes produtores, embora o governo conceda estímulos à sua produção a partir de outras oleaginosas, como o rícino, pinhão, girassol e algumas palmeiras, que quase não são consumidos como alimentos e que contemplam o cultivo de pequenos agricultores.

A soja e a cana preocupam por seu papel na segurança alimentar, pois são plantações em terras que poderiam produzir alimentos populares, como arroz e feijão, mas, principalmente por reter insumos e crédito, enquanto a recuperação das pastagens degradadas carece de estímulos, avalia Adriano Campolina, diretor da organização não-governamental internacional ActionAid nas Américas. De todas as formas, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, deveria estar promovendo, em lugar do etanol, “os programas brasileiros de maior êxito, como o Fome Zero, o Bolsa Família e o crédito à agricultura familiar, que são um caminho efetivo para reduzir a fome”, disse Campolina à IPS.

(Por Mario Osava, IPS, Envolverde, 11/06/2008)


desmatamento da amazônia (2116) emissões de gases-estufa (1872) emissões de co2 (1815) impactos mudança climática (1528) chuvas e inundações (1498) biocombustíveis (1416) direitos indígenas (1373) amazônia (1365) terras indígenas (1245) código florestal (1033) transgênicos (911) petrobras (908) desmatamento (906) cop/unfccc (891) etanol (891) hidrelétrica de belo monte (884) sustentabilidade (863) plano climático (836) mst (801) indústria do cigarro (752) extinção de espécies (740) hidrelétricas do rio madeira (727) celulose e papel (725) seca e estiagem (724) vazamento de petróleo (684) raposa serra do sol (683) gestão dos recursos hídricos (678) aracruz/vcp/fibria (678) silvicultura (675) impactos de hidrelétricas (673) gestão de resíduos (673) contaminação com agrotóxicos (627) educação e sustentabilidade (594) abastecimento de água (593) geração de energia (567) cvrd (563) tratamento de esgoto (561) passivos da mineração (555) política ambiental brasil (552) assentamentos reforma agrária (552) trabalho escravo (549) mata atlântica (537) biodiesel (527) conservação da biodiversidade (525) dengue (513) reservas brasileiras de petróleo (512) regularização fundiária (511) rio dos sinos (487) PAC (487) política ambiental dos eua (475) influenza gripe (472) incêndios florestais (471) plano diretor de porto alegre (466) conflito fundiário (452) cana-de-açúcar (451) agricultura familiar (447) transposição do são francisco (445) mercado de carbono (441) amianto (440) projeto orla do guaíba (436) sustentabilidade e capitalismo (429) eucalipto no pampa (427) emissões veiculares (422) zoneamento silvicultura (419) crueldade com animais (415) protocolo de kyoto (412) saúde pública (410) fontes alternativas (406) terremotos (406) agrotóxicos (398) demarcação de terras (394) segurança alimentar (388) exploração de petróleo (388) pesca industrial (388) danos ambientais (381) adaptação à mudança climática (379) passivos dos biocombustíveis (378) sacolas e embalagens plásticas (368) passivos de hidrelétricas (359) eucalipto (359)
- AmbienteJá desde 2001 -