Em clara resposta às informações de que o Espírito Santo é o grande líder na aplicação de agrotóxicos no país, a Secretaria de Estado da Agricultura, Abastecimento, Aqüicultura e Pesca (Seag) fez convênio com a Associação de Certificação de Produtos Orgânicos do Espírito Santo - Chão Vivo. Mas deu migalhas, com desembolso a longo prazo: setembro de 2010. O Resumo de convênio n° 48/2008 foi publicado na edição de segunda-feira (9/06) do Diário Oficial do Espírito Santo. O "concedente" é o governo do Estado, através da Seag. A "convenente" é a Certificadora Chão Vivo.
Segundo o texto, o objeto do convênio é "consolidar e ampliar o uso de sistema agro-ecológicos de produção e manejo nas propriedades, viabilizar a certificação e a comercialização dos produtos, promovendo e criando as condições de desenvolvimento ambiental, social e econômico para as comunidades envolvidas". O valor total do convênio é de R$ 1.113.350,00. E a contrapartida, da Chão Vivo, será de R$ 156.350,00. O convênio já está em vigor e vai até "30 de setembro de 2010". É assinado pelo secretário da Seag, César Colnago.
A confirmação de que o Espírito Santo é um mar de venenos agrícolas foi feita pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). O instituto divulgou na semana passada seu documento "Indicadores de Desenvolvimento Sustentável - Brasil 2008", com dados referentes a 2005. O IBGE informa que o Espírito Santo é o estado campeão nacional no uso de herbicidas no País. Se são considerados todos os agrotóxicos - fungicidas, herbicidas, bactericidas, inseticidas, acaricidas, entre outros -, o Espírito Santo é o segundo estado no país no consumo dos venenos agrícolas.
Os herbicidas são empregados para combater o que as empresas chamam de ervas daninhas nas lavouras. Em 2005, em cada hectare (área com 10 mil metros quadrados, equivalente a um campo de futebol) do Espírito Santo as empresas e os fazendeiros usaram 3,7 kg de herbicida. A quantidade tornou o Estado líder brasileiro no uso de herbicidas. No conjunto do uso dos agrotóxicos, o Espírito Santo, com o uso de 4,7 quilos por hectare, fica atrás apenas de São Paulo, que consome 7,7 quilos por hectare, média de 2005. Neste ano, a média nacional foi de 3,2 quilos de agrotóxicos por hectare.
O Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA) aponta que a responsabilidade sobre tanto uso de agrotóxicos no Espírito Santo é do governo Paulo Hartung. Explica que o governo colocou o Instituto de Defesa Agropecuária e Florestal (Idaf) e o Instituto Capixaba de Pesquisa, Assistência Técnica e Extensão Rural (Incaper), outro órgão da Seag, a serviço do agronegócio, que não consegue produzir sem aplicar venenos.
No Estado o principal agronegócio é do eucalipto da Aracruz Celulose, seguido da produção de cana-de-açúcar e da fruticultura do mamão e do maracujá. A divulgação dos dados sobre o intenso uso de venenos agrícolas no Espírito Santo levou a um requerimento para criação da Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) dos Agrotóxicos na Assembléia Legislativa.
O requerimento da CPI é da deputada Janete de Sá (PMN). Mas ela já ressalva que visa apurar "possíveis irregularidades com danos à vida humana e ao meio ambiente em face de uso de agrotóxicos comercializados por empresas privadas instaladas no Estado do Espírito Santo".
A autora destaca em outro trecho que "o atual governo do Estado possui um trabalho sério e efetivo de controle do uso do solo rural no Estado". Ambientalistas e agricultores são claros em apontar a responsabilidade do governo Paulo Hartung pela permissividade no uso dos agrotóxicos no Estado.
No Espírito Santo são freqüentes as denúncias de que os venenos usados na agricultura contaminam os agricultores e consumidores. Há denúncias de que na região de uso intenso de agrotóxicos, como em Santa Maria de Jetibá, crianças estão nascendo com doenças genéticas. Algumas morrem durante o parto e outros exigem cuidados da família por anos.
Os venenos usados na produção de alimentos intoxicam 500 mil brasileiros por ano, e 10 mil trabalhadores morrem anualmente no Brasil contaminados pelos agrotóxicos. Dos intoxicados por venenos agrícolas, cerca de 10% ficam definitivamente incapacitados para o trabalho, o que totaliza uma perda de 50 mil trabalhadores/ano no País.
Os agrotóxicos castram os brasileiros (provocam impotência sexual e frigidez); provocam doenças genéticas; causam doenças que podem levar ao suicídio e que deprimem o sistema imunológico, facilitando o desenvolvimento de um sem número de doenças; vários tipos de câncer, entre muitas outras.
As transnacionais do agrotóxico faturam muito e em escala crescente: uma receita de US$ 5 bilhões em 2007, contra US$ 3,9 bilhões em 2006, e US$ 4,6 bilhões em 2004. O mercado brasileiro está aquecido, pois há tecnologias recentes no campo. Os agrotóxicos não eram usados nas plantações do milho. Agora, são. Há, também, o crescimento da área plantada com soja, cana, café e citros. Com a demanda mundial por grãos aquecida, o consumo dos venenos agrícolas no Brasil também aumentará. Para 2008, a estimativa é que as vendas cresçam aproximadamente 10%.
Em 2005, o Brasil consumiu 365,5 mil toneladas de venenos agrícolas. O País é o quarto lugar no ranking mundial de consumo de agrotóxicos. O astronômico lucro das empresas é que justifica a defesa do uso destes produtos químicos que contaminam e permanecem no ambiente poluindo o solo, o ar e a água, e a minimização dos riscos a que estão expostos os consumidores e agricultores.
As análises, como as do Programa Nacional de Análise de Resíduos de Agrotóxicos em Alimentos (Para), não consideram que os venenos se potencializam mutuamente. A lei de agrotóxicos não preconiza a mistura dos venenos agrícolas para aplicação.
Mas a mistura é comum, como nas capinas químicas realizadas pela Aracruz Celulose nos eucaliptais. Além dos venenos empregados nos eucaliptais, os agrotóxicos são intensamente usados na cultura da cana-de-açúcar, nas pastagens e produção em grande escala de frutas como o mamão e o maracujá.
(Por Ubervalter Coimbra, Século Diário, 11/06/2008)