Proposta que limita ao poder público o serviço de saneamento e de abastecimento de água no Paraná causou polêmica depois de sofrer uma pequena alteração que impede os municípios de contratarem empresas privadas
A Proposta de Emenda à Constituição (PEC) que pretende restringir ao poder público o serviço de saneamento e de abastecimento de água no Paraná deve ser votada nesta semana pelos deputados estaduais. A “PEC da Água”, como ficou conhecida, provocou polêmica depois que a palavra “preferencialmente” foi suprimida do terceiro parágrafo da proposta. A mudança, embora sutil, impede que os municípios contratem empresas privadas para prestar o serviço – o que na opinião de advogados constitucionalistas consultados pela Gazeta do Povo torna a PEC inconstitucional.
Se aprovada, apenas dois municípios paranaenses seriam atingidos diretamente: Paranaguá e Andirá, onde os serviços são prestados por empresas privadas (leia mais na página). Além disso, os prefeitos só poderão contratar o serviço de empresas públicas e de economia mista. Invariavelmente quem ganha com isso é a Sanepar, que ampliará o número de municípios atendidos – hoje são 344 dos 399.
A alteração na redação da PEC foi proposta pelos deputados Alexandre Curi (PMDB), 1º secretário, e pelo presidente da Assembléia Legislativa, deputado Nelson Justus (DEM). Curi justificou dizendo ter recebido reclamações de prefeitos que contrataram empresas privadas para gerir o sistema de saneamento e abastecimento de água. “Com o termo preferencialmente na PEC, a interpretação era dúbia”, resume. “O volume de investimento feito pela Sanepar é grande no município e o serviço prestado atende à demanda da população”, resume. Tanto Justus quanto Curi dizem estar otimistas na aprovação da “PEC da Água”.
O presidente da Associação dos Municípios do Paraná, Valentim Zanello Milléo, é contra a proposta. “Não posso consentir com uma proposta que tira a autonomia das prefeituras de contratar uma empresa de saneamento e abastecimento de água – seja ela pública ou privada”, reagiu. “Vou procurar o Alexandre Curi e o Justus para conversar sobre isso”, completou Milléo. É justamente na questão da perda da autonomia dos municípios, ressalta o deputado Durval Amaral (DEM), que preside a Comissão de Constituição (CCJ) e Justiça da Casa, que está a inconstitucionalidade desta PEC. Amaral lembra que essa proposta não passou pela CCJ. “O presidente Nelson Justus designou uma comissão especial para atestar a constitucionalidade”, explicou Amaral. Justus preferiu não comentar a questão da constitucionalidade da PEC.
O presidente executivo da Academia Brasileira de Direito Constitucional, Flávio Pansieri, é categórico ao afirmar que a PEC é inconstitucional pois prevê que apenas empresas públicas podem prestar o serviço. “Essa proposta não segue o princípio da simetria com a Constituição Federal, portanto é inconstitucional”, reafirma. “Além disso, fere a autonomia dos municípios”, concluiu. Ele explica ainda que os contratos firmados entre empresas privadas e municípios têm de ser respeitados. “Os prefeitos que se sentirem lesados, caso a PEC seja aprovada, devem entrar com uma Adin (Ação de Inconstitucionalidade) no Tribunal de Justiça do Paraná”, aconselha Pansieri.
O presidente em exercício de Direito Constitucional da Ordem dos Advogados, seccional Paraná, Zulmar Fachin, também considera que a proposta fere a Constituição. “É possível pensar na inconstitucionalidade pois a PEC estaria em desacordo com o princípio da ordem econômica. Ela (proposta) inviabiliza a participação de empresas privadas na prestação deste serviço”, explica. O próprio diretor comercial da Sanepar, Natálio Stica, reconheceu numa entrevista concedida à Gazeta do Povo que os municípios são proprietários da concessão do serviço, como garante a Constituição.
(Por Karlos Kohlbach,
Gazeta do Povo, 09/06/2008)