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pesca industrial contaminação do pescado fiscalização ambiental
2008-06-09

Como já não bastasse a intensa pressão de pesca sobre a lagosta, com técnicas tradicionais (covos) e predatórias (redes, compressores) agora inventaram a última moda em tecnologia de acabar de vez com a lagosta nordestina: as marambaias de tambor.

“Marambaia” são estruturas originalmente feitas com troncos de árvores da mata de tabuleiro, e depois com sarrafos e tábuas, usadas por pescadores artesanais como atrator de lagostas.

Em artigo anterior (Velas de Icapuí) fiz um relato histórico sobre a pesca, ou melhor, sobre a “sobre-pesca” da lagosta no mar nordestino, e os problemas sócio-ambientais associados ao ouro do mar, como foi apelidado o crustáceo marinho mais cobiçado pela culinária internacional. Muitas das informações usadas naquela coluna foram aprendidas durante minha visita aos projetos sócio-ambientais da Prainha do Canto Verde, um dos poucos pequenos oásis sócio ambiental no meio da ocupação desordenada e conflitante da costa brasileira. Isso graças às ações da ong Instituto Terramar liderada por Renée Schärer, um suíço que após aposentar-se de seu alto cargo de Diretor Comercial da Swissair, tornou-se nos últimos 20 anos mais um herói anônimo da luta pelas causas sociais e ambientais brasileiras.

Renée mudou-se para a Prainha do Canto Verde e dedicou-se a apoiar as comunidades locais na busca de alternativas para melhorar a qualidade de vida dessas comunidades. Tem trabalhado sobretudo pela implantação do turismo comunitário como alternativa de renda local, lutando contra a especulação imobiliária e a invasão de grupos hoteleiros que normalmente se instalam nessas regiões carentes em lideranças comunitárias. O Terramar também apóia a preservação de tradições culturais como a corrida de jangadas, as festas religiosas e pequenos projetos de tecnologia social, como a genial prática de ensinar os moradores da Prainha a manter a água retirada do poço (muitas vezes contaminada com bactérias) em garrafas expostas no telhado. Essa prática simples faz com que a radiação solar elimine a Escheriquia coli, uma bactéria comum, mas que em concentrações elevadas causa diarréia e contribui para a mortalidade infantil.

Ainda como parte de seu trabalho social, nosso Guilherme Tell nordestino luta pela preservação dos valores culturais do pescador cearense e combate incansavelmente a exploração predatória da lagosta devido ao seu papel fundamental na sustentabilidade econômica (e portanto social) dessas comunidades.

A lagosta, outrora usada como misca, tornou-se o principal recurso econômico da pesca na nossa plataforma calcárea a partir da década de 70, disputada desesperadamente por pescadores artesanais, em total desigualdade de condições com a pesca comercial. Enquanto os artesanais usam suas jangadas e paquetes para instalar cangalhas e manzuás (= covos) em seus pesqueiros tradicionais a frota comercial, normalmente dominada por pessoas que não dependem do recurso para sobreviver, invadem seus sítios de pesca com suas embarcações equipadas com compressores e marambaias, tirando o sustento de centenas de famílias. Ás vezes são políticos locais e comerciantes que se associam na maracutáia, quer dizer.... na marambaia.. Os oportunistas desse garimpo ambiental, com mais recursos tecnológicos, tendem a monopolizar a cadeia produtiva local com sua frota predadora. O recurso vale tanto no mercado interno e internacional que o estoque comercial está ameaçado e o estoque “social” já colapsou há muito tempo.

O problema é o de sempre. Alguém inventa um modo de explorar um determinado recurso que prejudica um estoque finito, limitado, e que deveria ser compartilhado por todos em escala compatível com a capacidade do meio ambiente em repor o que é capturado. Foi o que aconteceu com a lagosta e sua exploração desenfreada com o uso de redes e compressores. Nos últimos anos, de tanto ser pressionado o governo adotou medidas para proteger o recurso, proibindo o uso de compressores e redes, e disponibilizando recursos para fiscalização e indenizações.

Segundo Renée, por falta de verbas a fiscalização parou em outubro do ano passado, e as frotas de compressores não apenas voltaram com tudo, como também trouxeram essa nova tecnologia de pesca da lagosta sem muito esforço. As marambaias de tambor, feitas com tonéis de ferro amassados para criar um refúgio mais atraente para as lagostas, funcionam como tocas artificiais que na verdade tornam as lagostas já sobre-exploradas alvo fácil para as frotas comerciais. Hoje pode haver mais de um milhão dessas armadilhas instaladas traidoramente no fundo do mar nordestino por barcos comerciais. O texto a seguir, enviado na semana passada, Renée dá os detalhes do problema:

“Depois de ter gasto mais de 30 milhões de reais para o re-ordenamento da pesca da lagosta o Governo baixou a guarda em outubro do ano passado e a fiscalização parou. Apesar de ter indenizado donos de barco para retirar apetrechos de pesca ilegais como redes de pesca e compressores, a pesca ilegal continua mais forte do que nunca, incentivado pela falta de fiscalização durante os últimos 6 meses. O dinheiro das indenizações esta sendo investido na compra de compressores e marambaias.

A frota de compressor, que ainda opera na completa ilegalidade, conta com uma arma poderosa, que são milhares de marambaias confeccionadas com tambores de produtos químicos e tóxicos, usado para agregar as lagostas para fácil captura pelos mergulhadores. Conhecido como agregadores de lagostas (“lobster aggregation devices” - LAD) os tambores aumentam o poder e a eficiência de pesca de tal forma que um esforço de pesca de um barco de compressor pode ser 5 vezes mais do que um barco a motor pescando com 400 manzuã.

Outro fator que preocupa é o uso de tonéis de produtos tóxicos numa reciclagem que representa um alto perigo de contaminar lagostas e talvez até peixes. Não há estudos sobre lagostas contaminadas ou sobre os próprios tambores, embora o Procurador Francisco Machado do Ministério Publico Federal numa reunião (maio 2008) com membros do comitê de gestão da lagosta , o Ibama e a ANVISA tenha pedido um estudo com a máxima urgência, até a data de hoje não há nenhum resultado. Uma única lagosta contaminada detectado no controle sanitário de importação na Europa ou nos Estados Unidos, poderá leva a proibição de importação de peixes, lagostas e camarão do Brasil e poderá levar ao fechamento da pesca da lagosta por motivos sanitários. Até agora nenhuma das empresas tem pedido providências ao governo e tampouco parecem a bancar o custo das analises de laboratório.

De acordo com informações de outros estados as marambaias estão espalhados pela costa desde o estado de Sergipe até o Ceará. Estimativas, de difícil verificação, da quantidade de tambores vão desde 500.000 até 2 milhões. Quer dizer que a frota de barcos de compressor do Brasil estimada em 800 barcos, se apropriou da zona costeira do Brasil, sem que haja alguma resposta do Estado brasileiro. Em janeiro de 2008 em uma operação de fiscalização com o barco “Tainha” arrendado pela Prefeitura de Beberibe com fiscais do Ibama, policia militar e pescadores localizou o barco QUALIPESCA lançando tambores no mar de Beberibe.

O barco foi apreendido com 480 tambores a bordo. No GPS confiscado pelo Ibama constam 1300 posições marcadas ao longo da costa do Ceará. De acordo com informações do Ibama o barco está registrado em nome da empresa de pesca QUALIMAR com sede em Pernambuco. De acordo com informações nas praias algumas empresas de pesca que compram lagosta no Ceará e no Rio Grande do Norte, financiam a compra de tambores (custo R$ 25.00 a unidade, preço de 2005 era R$ 5.00).

Fracasso das medidas de ordenamento - quando faltam 10 dias do inicio da pesca para as embarcações legais, fica claro que o governo não tem vontade (recursos) nem competência para salvar a pesca da lagosta e que o setor empresarial não vai mexer um dedo para ajudar. Estamos longe de conseguir a meta de reduzir o esforço de pesca para 40 milhões de covos. Cálculos que serão divulgado no dia 20 de maio – para dar prazo ao Governo de publicar os dados que se manejam no maior segredo – apontam que o esforço de pesca da frota legal é de 98 milhões covos/ano, mais que o dobro da meta do Ministro Gregolim. Uma estimativa do esforço de pesca da frota ilegal – estes barcos sim, estão pescando durante o defeso e tem toneladas de lagostas armazenadas, pronto para ser exportadas – feito pelo Instituto Terramar aponta um esforço entre 80 e 160 milhões de covos/ano.

Estamos muito longe da sonhada recuperação da pesca. Ao contrário, hoje o colapso da pesca de US$ 80 milhões nos parece uma possibilidade real, com conseqüências desastrosas para armadores, pescadores e as comunidades que dependem da pesca para sua sobrevivência e para a economia do Ceará

Depois de reuniões com o Ministro da Pesca, Altemir Gregolim e o Presidente do Ibama nas últimas semanas onde não foram apresentadas soluções pelo governo, a sociedade civil e movimentos de pescadores do Ceará estão articulando uma audiência com o Presidente Lula como último recurso. O novo Ministro Carlos Minc ainda tem a chance de evitar o pior. Mas as seguintes medidas extraordinárias devem ser adotadas em caráter emergencial:

1. Operação da Marinha do Brasil e outras forças de fiscalização para re-estabelecer a soberania do Estado sobre a zona de 12 milhas, que foi confiscado pelos barcos de compressor com até 1 milhão de tambores tóxicos desde a costa do estado de Sergipe até o norte do Ceará

2. Garantir o acesso das embarcações permissionadas para pesca da lagosta, a eficiência da pesca ilegal de compressor com uso das marambaias prejudica aos pescadores que utilizam o único apetrecho permitido – o manzuã.

3. Plano de ordenamento com garantia de recursos a longo prazo para recuperar os estoques da lagosta.

Sem estas medidas Carlos Minc, corre o risco de ser conhecido como o Ministro do primeiro pais do mundo que consegue acabar com a lagosta Panulirus argus. Os pescadores do Ceará tem boas memórias do Carlos Minc; Como Vereador do PT ajudou organizar a chegada e a recepção dos pescadores da jangada SOS Sobrevivência - após a viagem de 74 dias em protesto contra a pesca predatória da lagosta - com a participação especial de Dorival Caymmi.

Prainha do Canto Verde, 17 de maio de 2008”

Ou seja, a questão agora é emergencial! A lagosta está a ponto de entrar em colapso irreversível se nada for feito pelas autoridades ambientais e pelo os órgão responsáveis pelo manejo pesqueiro. As denúncias de Renée estão aí e precisam ser averiguadas e acompanhadas de ações imediatas de fiscalização por parte do governo, e também pela mobilização da comunidade local que luta para proteger seus recursos de forma co-participativa. O governo precisa continuar a fazer a sua parte.

(Por Frederico Brandini, OEco, 07/06/2008)

* Oceanógrafo, é Professor Adjunto da Universidade Federal do Paraná. Foi pesquisador do Programa Antártico Brasileiro e diretor do Centro de Estudos do Mar da UFPR em Pontal do Paraná


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