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segurança alimentar alta no preço dos alimentos biocombustíveis
2008-06-06

Os vilões da história do encarecimento dos alimentos são 13 e passam por razões estruturais e conjunturais, associadas à oferta e à demanda, segundo o Sistema Econômico Latino-americano e do Caribe. Para enfrentá-los, a cooperação regional é imprescindível. “É preciso atuar em diferentes frentes, a partir de uma coordenação política que defenda os interesses regionais”, disse à IPS o secretário permanente do Sela, o mexicano José Rivera, às portas de uma reunião regional que diagnosticou o problema durante o final de semana.

A reunião buscou subsídios para adotar uma posição concertada da América Latina e Caribe enquanto acontece em Roma a Conferência de ato Nível sobre Segurança Alimentar Mundial. “As reuniões se multiplicam porque existe a conscientização de que a crise alimentar afeta com mais força os que têm uma vida mais precária”, disse à IPS o francês Gerard Gómez, chefe do escritório para a região da Organização das Nações Unidas. Dez milhões de pessoas na região poderão somar-se aos 80 milhões que já não podem procurar os alimentos mínimos que necessitam, disse Gómez lembrando um estudo da Comissão Européia para a América Latina e o Caribe (Cepal).

Por que os preços sobem? Um estudo do Sela identificou 13 razões, estruturais e conjunturais e que estão relacionadas tanto com a oferta quanto com a demanda de alimentos. A primeira é o aumento do investimento financeiro em commodities (matérias-primas). Nos últimos três anos, enquanto o investimento em ouro e metais se manteve estável, em outras commodities cresceu sete vezes. Analistas do Banco Internacional de Pagamentos da Basiléia, na Suíça, estimam que 30% da incidência nos preços dos alimentos por parte da especulação financeira, a partir dos US$ 7 trilhões investidos em “outras commodities” entre 2004 e 2007, frente a menos de um trilhão nos quatro anos anteriores.

Esta causa esta causa está associa com a segunda, que a debilidade do dólar e as baixas taxas internacionais de juros, que leva os agentes financeiros em busca de refúgio na aquisição de matérias-primas impulsionando seus preços. A terceira é o aumento dos preços do petróleo, que não é apenas um insumo para a produção e o transporte, pois também gera aumento no consumo em paises que produzem hidrocarbonos, lembrou Rivera. Quando o petróleo estava na casa dos US$ 30 o barril, em 2000, uma tonelada de leite em pó era comprada por UAS$ 1.500. Agora que o petróleo passa dos US$ 130 o barril, a tonelada do leite em pó é cotada acima dos US$ 4.500.

As restrições à exportação de alimentos são outra razão, países da Ásia, com o Equador na América Latina, restringiram as exportações de arroz, enquanto outros, como a Argentina, impuseram restrições e cobram tributos sobre as vendas externas de carnes e grãos. O quinto motivo conjuntural é a redução dos estoques, em particular de cereais, que desde 1995 diminuem à razão de 3,4% ao ano. Historicamente, as existências de cereais eram 30% da produção global, e agora estão em torno de 20%.

Entre as causas estruturais está o aumento da demanda na Ásia. Por exemplo, o consumo de milho no sul, leste e sudeste dessa região, somados, ficou em 200 milhões de toneladas no período 2003-2004, e em 227 milhões de toneladas em 2007-2008. Também cresce a demanda por alimentos para uso animal, sobretudo milho. Os Estados Unidos destinaram para esse fim 47% das 332 milhões de toneladas que produziu no ano passado.

Agrocombustível no banco dos réus
Outro vilão é o aumento da demanda para biocombustíveis. O dedo do Sela aponta o milho para produzir etanol nos Estados Unidos e a colza para o biodiesel na Europa. “Dos 48 milhões te toneladas de aumento do total do consumo doméstico de milho em 2007, quase 30 milhões foram destinados exclusivamente à produção de etanol”. A FAO (Organização das Nações Unidas para a Agricultura e a Alimentação), por princípio, rechaça o uso dos alimentos para a produção de combustível”, recordou à IPS seu representante na Venezuela, o salvadorenho Francisco Arias. “Devemos desenvolver pesquisas para produzir biocombustíveis que não derivem de alimentos”, disse à IPS o delegado do México e embaixador na Venezuela, Mario Chacón. “Em nosso país temos uma planta chamada higuerilla (Jatropha curcas, também conhecida como pinhão) que é oleaginosa, e pode-se usar palha e resíduos vegetais em lugar de produtos alimentícios”, acrescentou.

Outro fator estrutural com peso sobre os preços dos combustíveis é a mudança climática, que levou fortes secas a países que são grandes produtores de alimentos, como Austrália, Estados Unidos e Ucrânia. Na América Latina, as tempestades tropicais Noel e Olga e o furacão Félix afetaram a produção de alimentos em Cuba, Haiti, Nicarágua e República Dominicana. As inundações castigaram zonas produtoras na Bolívia e no Equador. Por outro lado, houve incidência dos maiores custos na produção (fertilizantes, sementes, inseticidas e maquinário), no transporte e na logística (armazenamento e distribuição) dos alimentos, associados aos altos preços do petróleo.

Um fator de escassa incidência na América Latina ainda são as limitações da terra e da água existentes para uso agrícola, e que em outras regiões do mundo competem com demandas para outros usos, principalmente urbanos. Também há limitações para o uso de novas tecnologias, produto em países como os latino-americanos de um baixo investimento e desenvolvimento. Rivera recordou a respeito que “a melhor maneira de reduzir os preços dos alimentos será através de aumentos na produtividade, mais do que a superfície semeada”.

Finalmente, as políticas protecionistas nos países industrializados do Norte “distorceram por mais de cinco décadas o mercado mundial agrícola”, disse o Sela. Por exemplo, o Haiti produzia há 30 anos quase todo arroz que consumia, mas teve de reduzir tarifas alfandegárias para obter empréstimos multilaterais nos anos 80. O resultado foi uma maciça importação de arroz dos Estados Unidos, que por ser subsidiado podia ter seu valor reduzido, e os produtores deixaram de trabalhar a terra, perderam seus trabalhos e foram para as cidades. Rivera disse que as políticas de países do Norte, tais como apoio doméstico, subsídios às exportações e restrições para o acesso a mercados “impedem o investimento e a expansão da produção e o comércio em países produtores eficientes”.

As delegações presentes à reunião do Sela, que reúne 26 países latino-americanos e caribenhos, concordaram que a região deve responder à crise de preços dos alimentos com um programa regional de segurança alimentar. Os governos interessados poderiam reativar um Comitê de Ação sobre segurança alimentar, uma figura em voga nos primeiros tempos do Sela (anos 70 e 80) para examinar tarefas práticas conjuntas ou coordenadas. “Disse a eles que a Colômbia com apenas quatro milhões de hectares destinados a produzir alimentos, e a Venezuela com apenas dois milhões, poderiam acertar um plano para ativar outros três milhões de hectares nas bacias dos rios compartilhados Orenoco e Meta”, disse à IPS o embaixador de Bogotá em Caracas, Fernando Marín.

A reunião indicou que é necessário um fundo econômico especial para ajudar países da região em contingências alimentares, tomando por base a disposição da Alternativa Bolivariana das Américas formada por Bolívia, Cuba, Nicarágua e Venezuela, para criar-se um fundo com US$ 100 milhões destinados a esse fim. Por último, os representantes da região pedira ao Sela que depois da atual Conferência de Roma convoque uma reunião para analisar seus resultados e avançar na estratégia latino-americana e caribenha sobre segurança alimentar.


(Por Humberto Márquez, IPS, Envolverde, 05/06/2008)


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