Com um projeto de decreto legislativo, de número 13, setores do agronegócio articulam derrubar, no Congresso, as principais medidas de combate ao desmatamento na Amazônia, como o corte de crédito rural e o embargo à produção em áreas devastadas.
A proposta chegou a ser incluída na pauta de ontem da Comissão de Constituição e Justiça do Senado, mas teve a votação adiada para a semana que vem. "A minha expectativa é aprovar", disse a senadora Kátia Abreu (DEM-TO). "Se querem fazer [o combate ao desmatamento], podem fazer, mas arrumem uma lei."
O alvo do projeto apresentado por Kátia Abreu é o decreto 6.321, assinado em dezembro pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva e pela então ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. O decreto estabeleceu as principais medidas de combate ao desmatamento na Amazônia, em resposta aos primeiros sinais da retomada do ritmo acelerado da devastação.
O projeto tem apenas dois artigos. Se aprovado, sustará cinco artigos do decreto de Lula. Como se trata de uma iniciativa exclusiva do Congresso, não há possibilidade de veto do presidente. A conseqüência da medida seria a nulidade dos principais mecanismos de combate ao desmatamento.
O bloqueio do crédito rural a produtores que tenham desmatado ilegalmente suas propriedades, regulamentado por resolução do Banco Central, seria só uma das vítimas da ação em curso. A regra, cuja entrada em vigor está prevista para 1º de julho, enfrenta forte pressão contrária do agronegócio, e teve origem no decreto de Lula.
A proposta de Kátia Abreu também acaba com a exigência de recadastramento dos imóveis rurais na Amazônia, mecanismo que tem por objetivo permitir a identificação dos responsáveis pelo desmatamento ilegal. Acaba também com a punição imposta a quem não fizer o recadastramento -cerca de 80% dos proprietários de terras até o momento: a inibição do cadastro rural.
Caso venha a ser aprovado, o decreto também impediria o embargo de propriedades, assim como da produção feita em área desmatada ilegalmente. Somente neste ano, o Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente) embargou 331 propriedades, equivalente a 700 km2. O instituto já apreendeu 4,3 mil toneladas de grãos e programa a apreensão de gado.
O principal argumento de Kátia Abreu é que o decreto de Lula "ofende a livre iniciativa" ao impor punições além de multas e aumento de impostos, sem recorrer a novas leis.
A liderança do governo no Senado informou que a orientação do Planalto é derrubar a proposta dos ruralistas, mas não há maioria folgada. O ministro Carlos Minc (Meio Ambiente) caça votos.
Trata-se de mais uma batalha da guerra contra as medidas de combate ao desmatamento, na seqüência da pressão de governadores -sobretudo Blairo Maggi (MT)- contra o corte de crédito aos desmatadores. Essa pressão precipitou a queda de Marina Silva.
(Por Marta Salomon, Folha Online, 05/06/2008)