A cúpula da ONU sobre alimentação rumava para um impasse enquanto os países continuavam divididos sobre as políticas de biocombustíveis, concordando somente em manter "o atual diálogo internacional", segundo um esboço da declaração da cúpula. Os EUA, o Brasil e alguns países europeus defenderam suas políticas pró-biocombustíveis na reunião, convocada pela Organização para Alimentação e Agricultura da ONU (FAO), enquanto países em desenvolvimento como Venezuela as criticaram fortemente.
O secretário da Agricultura dos EUA, Ed Schafer, disse: "Duvido que se chegue a um acordo positivo sobre os biocombustíveis". Mais tarde, autoridades americanas disseram que Washington esperava que se pudesse chegar a um consenso. Jacques Diouf, o diretor-geral da FAO, liderou o ataque contra o desvio de plantações de alimentos para produzir biocombustíveis. Em seu discurso de abertura, ele disse que "ninguém" entende por que os países ricos estão subsidiando o desvio de cereais "para alimentar carros".
Diplomatas e autoridades da FAO disseram que uma maneira de resolver a divergência seria levar a discussão do biocombustível à Parceria Global de Bioenergia, um grupo criado na cúpula do G8 em Gleneagles três anos atrás, que inclui os países do G8 mais alguns países em desenvolvimento como Brasil, China e México e organizações internacionais.
No centro do debate dos biocombustíveis está a discórdia em relação a seu impacto sobre os preços dos alimentos. Governos europeus apoiaram ontem a posição dos EUA e a do Brasil, dizendo que os biocombustíveis são apenas uma das causas do aumento dos preços dos alimentos, citando como outros fatores o aumento dos preços do petróleo, o maior consumo nos países em desenvolvimento, o clima adverso e as proibições a exportações.
"É uma questão de proporcionalidade", disse uma autoridade americana. "[Os biocombustíveis] fazem parte do problema mas não são a principal causa da inflação dos alimentos. O petróleo e o crescimento da demanda são muito mais importantes." A disputa sobre os biocombustíveis obscureceu um consenso alcançado ontem, de se aumentar os investimentos em agricultura para atacar a desaceleração da produtividade agrícola, e os anúncios de vários países de contribuições de milhões de dólares para ajuda alimentar e projetos agrícolas.
A França prometeu US$ 1 bilhão, a Espanha US$ 500 milhões e o Banco de Desenvolvimento Islâmico anunciou uma contribuição de US$ 1,5 bilhão para desenvolvimento agrícola e ajuda alimentar nos próximos cinco anos. Kofi Annan, o ex-secretário geral da ONU, disse ao "Financial Times" que níveis mais altos de investimentos são críticos para suprir a crescente demanda global por alimentos conforme a população mundial aumenta. A FAO estima que o consumo global de alimentos duplicará nos próximos 30 anos.
Mas apesar de os países terem concordado que é vital reforçar a produtividade agrícola, discordaram sobre como se alcançar isso. Os EUA disseram que o mundo precisa usar organismos geneticamente modificados. Shafer disse que "não há como" aumentar a produção sem OGMs. Os governos europeus são contrários à idéia. O presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, disse que a reunião do G8 em julho abordará a questão do aumento da produção de alimentos.
(Por Javier Blas, Financial Times, tradução de Luiz Roberto Mendes Gonçalves, UOL, 05/06/2008)