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impactos mudança climática br segurança energética
2008-06-05

O Brasil se orgulha de ter uma matriz energética com 45% de fontes renováveis, o triplo dos países industrializados, mas, exatamente por isso, será mais vulnerável à mudança climática, segundo uma pesquisada Universidade Federal do Rio de Janeiro divulgada nesta semana. As condições climáticas previstas para as três últimas décadas deste século reduzirão a produção energética das fontes renováveis em todo o País, com exceção da cana-de-açúcar, destacou Roberto Schaeffer, um dos coordenadores do estudo feito pelo Instituto de Pós-graduação e Pesquisa em Engenharia (Coppe) da UFRJ.

O potencial brasileiro de geração de energia eólica poderá sofrer uma queda de 60%, devido à menor freqüência de ventos velozes no interior do País. O biodiesel também seria gravemente afetado porque o clima mais quente diminuiria, ou tornaria impossível, a produção de algumas oleaginosas no nordeste e norte do território brasileiro. Também as centrais hidrelétricas, que respondem por 85% da eletricidade gerada no Brasil, terão sua capacidade afetada pela redução e irregularidade das chuvas.

A perda, curiosamente, seria menor, de 1%, na hipótese de altas emissões de gases causadores do efeito estufa, o cenário A2 do Grupo Intergovernamental de Especialistas sobre Mudança Climática (IPCC) da Organização das Nações Unidas. Em caso de menores emissões, o cenário B2, a redução subiria para 2,2¨. É uma previsão “conservadora”, segundo Schaeffer, que se agravaria por dificuldades como a perda da capacidade de geração elétrica das pequenas represas por escassez de água nas estiagens e chuvas torrenciais concentradas em um período, o que obrigaria a ampliar as comportas e renunciar à água armazenada para não romper os diques.

Além disso, o aumento da temperatura ambiente elevará em 8% o consumo total de eletricidade no Brasil até 2030, considerando a evolução do clima segundo as projeções até o período 2071-2100. A nordeste, a região mais pobre do País, seria a mais afetada. Com sua zona semi-árida mais seca ainda, deixaria de produzir matéria-prima para o biodiesel e a bacia do rio São Francisco, sua maior fonte de eletricidade, poderá perder até 7,7% de sua capacidade de geração até o final do século.

O estudo sobre Mudança Climática e Segurança Energética no Brasil, que mobilizou oito pesquisadores do Programa de Planejamento Energético da Coppe/URFRJ, busca demonstrar que os planos para o futuro não podem se basear nas condições atuais, devendo incluir os efeitos do clima nas projeções. Acrescente-se um grau de “incertezas maiores” que exigem melhores dados sobre os muitos fatores que têm impacto na geração de energia, com o potencial remanescente dos rios amazônicos e efeitos do clima em seus fluxos, disse Alexandre Szklo, outro coordenador da pesquisa. “Estamos em um quarto escuro com possíveis cacos de vidro no chão”, comparou.

A política para fontes alternativas não deve mudar, apesar das alterações climáticas, afirmou Szklo. A energia eólica pode perder 60% de seu potencial total, mas ventos “excepcionalmente bons” se concentrarão nas costas e no mar próximo, tornando “mais factíveis os investimentos” nessa fonte, explicou este especialista. As incertezas se multiplicarão, mas o quadro apresentado permite “certa tranqüilidade”, já que a redução de 1% a 2% na oferta de hidroeletricidade “está dentro dos parâmetros de risco do setor”, afirmou Mauricio Tolmasquín, presidente da Empresa de Pesquisa Energética (EPE), órgão de planejamento do Ministério de Minas e Energia.

A hidroeletricidade continuará sendo a via mais importante para o Brasil, a tecnologia futura poderá compensar as perdas agrícolas que no nordeste poderão sofrer algumas espécies oleaginosas, como o rícino e a soja, e os ventos continuarão com a intensidade necessária na costa brasileira, onde se concentra a população e a demanda energética, disse Tolmasquín na apresentação do estudo. A mudança climática requer “hipóteses heróicas” de alternativas no futuro, como a produção de biocombustíveis por hidrólese enzimática, que já é tecnicamente possível, mas a custos inviáveis, e avanços nos processos de armazenamento de energia, disse Luis Fernando Legey, coordenador do Programa de Planejamento Energético do Coppe. Além disso, é preciso “mudar hábitos de consumo” para economizar energia, diante do crescimento da população mundial, acrescentou.

Para o presidente da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Jerson Kelman, as linhas de transmissão de alta tensão, que somam 80 mil quilômetros no Brasil, permitem solucionar efeitos da mudança climática nas partes mais prejudicadas do País. O sistema elétrico brasileiro é totalmente interligado, de maneira que a escassez de energia em uma região pode ser compensada por outra. Na crise de 2001, que submeteu algumas áreas do Brasil a racionamento e apagões, o sul do País, que teve chuvas abundantes, poderia oferecer eletricidade excedentes a outras regiões, mas não havia linhas de transmissão suficientes, recordou Kelman, também presente na divulgação do estudo.

(Por Mario Osava, IPS, Envolverde, 03/06/2008)

 


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