O requerimento que pede esclarecimentos sobre o processo de Licenciamento das Usinas Hidrelétricas Santo Antônio e Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia, será novamente apreciado pelo Conselho Nacional do Meio Ambiente (Conama), órgão consultivo e deliberativo do Ministério do Meio Ambiente (MMA) que dispõe sobre a política ambiental. O requerimento foi submetido à aprovação do Conama no dia 25 de abril, mas gerou polêmica e acabou não sendo votado por falta de quorum.
A polêmica na última reunião aconteceu por causa da forte pressão que o requerimento sofreu por parte de dirigentes e assessores do Instituto Brasileiro de Meio Ambiente e Recursos Renováveis (Ibama) e do Ministério do Meio Ambiente. Decidiu-se, na ocasião, que o documento passaria por modificações e seria votado em junho. "O documento não passou por nenhuma mudança substancial. Alguns termos que estavam sendo considerados acusatórios foram substituídos", explica a pesquisadora na área de energia Telma Delgado Monteiro, uma das autoras do documento.
Telma explica que foram acrescentadas perguntas específicas à Fundação Nacional do Índio (Funai), Fundação Nacional da Saúde (Funasa), Ibama e MMA, referentes a algumas das questões mais contundentes, além de acrescentar no anexo a fundamentação dos argumentos. O requerimento será apresentado na próxima reunião do Conama, nos dias 17 e 18 de junho.
Requerimento
Além de Telma, o requerimento foi elaborado pelos conselheiros do Conama Luis Carlos Maretto, da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé, e Zuleica Nycz, da Associação de Proteção ao Meio Ambiente (Apromac). O documento teve base na Ação Civil Pública ajuizada pela organização Amigos da Terra - Amazônia Brasileira.
De acordo com Zuleica Nycz, faltam informações no processo de licenciamento, e é sobre elas que o requerimento questiona. "Várias organizações e especialistas indicaram a existência de inúmeras lacunas não esclarecidas, o que nos faz deduzir que houve irregularidades nesse processo", diz.
Para Zuleica, a principal dúvida é a de que a licença foi dada sem a comprovação da viabilidade ambiental. "A própria equipe técnica do Ibama atestou a inviabilidade do empreendimento, recomendando novos estudos, mas estas recomendações não foram acatadas pelos funcionários que emitiram a licença. Tudo leva a crer que a licença foi dada por pressão política e não com fundamentação técnica", explica.
Ela recorda a ausência de aprofundamento dos estudos relacionados à questão indígena, colocando em risco a sobrevivência de povos isolados. Segundo Luis Carlos Maretto, em entrevista ao site Amazônia.org.br, a instalação do complexo desconsidera a existência de diversos grupos de índios isolados na região. O requerimento questiona especificamente a Funai em relação à não inserção dos impactos em terras indígenas nos estudos das usinas do rio Madeira.
Complexo Madeira
O Complexo Madeira compreende duas usinas hidrelétricas, Santo Antônio e Jirau, que juntas pretendem gerar 6.450 megawatts, aproximadamente metade da usina hidrelétrica de Itaipu. Santo Antônio está a seis quilômetros de Porto Velho, e Jirau, a 150 quilômetros. Com a hidrelétrica, uma área de mais de 50 mil hectares será alagada, atingindo diretamente cerca de 5 mil famílias.
A construção das hidrelétricas sofre forte pressão por parte de movimentos sociais e ambientalistas, devido aos impactos que o empreendimento causa ao meio ambiente, às comunidades locais e povos indígenas. Apesar disso, o governo já promoveu o leilão de Santo Antônio, vencido por um consórcio liderado por Furnas Centrais Elétricas, e de Jirau, vencida pelo consórcio liderado pelo grupo francês Suez Energy, que após vencer o leilão anunciou a proposta de mudar o local de construção da usina.
Para os autores do requerimento, a licença não dá respaldo para a construção da usina em um local diferente. "Fomos surpreendidos por essa notícia e lançamos uma nota à imprensa através do GT Energia, do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais. Estamos acompanhando os desdobramentos do caso com interesse. Se o licenciamento não iniciar do ponto zero, é um desrespeito aos Princípios subjacentes à Política Nacional de Meio Ambiente", explica Zuleica.
Conama
As expectativas em relação à próxima reunião do Conama é de que o documento seja aprovado. "Procedemos conforme combinado entre todas as partes, e até mesmo apresentamos previamente a segunda versão aos conselheiros mais reticentes. Como não recebemos nenhum comentário a favor ou contra o teor do requerimento, quero acreditar que não teremos maiores dificuldades para aprovar o documento", explica Zuleica. Telma Delgado concorda. "É esse a atitude que denotaria a transparência do Conama e acreditamos que essa oportunidade pode ser um momento histórico para os ambientalistas e para a própria instituição", conclui.
(
Amazonia.org.br, 04/06/2008)