Depois de ver sua atuação ser questionada pela Associação dos Índios da Amazônia Peruana (Aidesep), a companhia francesa Perenco corre o risco de ver proibida pela justiça do Peru a exploração de uma concessão petroleira que ela havia adquirido em janeiro, mas que constituiria uma ameaça para a sobrevivência de tribos de índios isoladas.
Situado na fronteira com o Equador, o "Block 67" da petrolífera Perenco possui um potencial de produção estimado em 100.000 barris de petróleo por dia. Mas este "block" se estende por um território virgem no coração da selva amazônica que abrigaria "índios que se mantêm em situação de isolamento voluntário", segundo precisa a Aidesep.
"Algumas dessas tribos decidiram permanecer à margem daquilo que nós chamamos de desenvolvimento", explica o vice-presidente da Aidesep, Robert Guimaraez. Este denuncia a atitude do governo peruano, que "enxerga a Amazônia como um território vazio, ao passo que dezenas de tribos isoladas vivem na selva amazônica do Peru".
Para proteger essas tribos, a Aidesep empreendeu em 2007 uma ação em justiça contra as petrolíferas Repsol YPF (espanhola), Burlington Resources (americana) e Barrett (comprada pela Perenco em janeiro).
"A presença dessas companhias constitui uma ameaça para a vida e para os direitos dos índios isolados. Por viverem no mais completo isolamento, esses índios não desenvolveram qualquer defesa imunológica [contra os vírus externos] e, portanto, todo contato pode ser fatal para a sua saúde", argumenta Handersson Casafranca, um advogado da Aidesep. Ao serem convocados, na sexta-feira, 30 de maio, pelo tribunal de Maynas, os representantes da Perenco e das duas outras petrolíferas "apresentaram um recurso pedindo a anulação das acusações, isso com o objetivo de prolongar os ritos do processo, de modo a poderem prosseguir sua atividade enquanto isso", avalia.
Num artigo que foi publicado em novembro de 2007 pelo jornal "El Comercio de Lima", o presidente peruano Alan Garcia havia argumentado em defesa das petrolíferas. "Contra o petróleo, os ecologistas criaram a figura do nativo da selva "desconectado", ou seja, um indivíduo desconhecido, mas que se presume que exista. E por causa deste desconhecido, milhões de hectares não devem ser explorados".
Para a ONG Survival, que luta em defesa dos direitos dos indígenas, a presença desses povos não dá margem a dúvida alguma. Na sexta-feira (30/5), ela divulgou fotos mostrando um grupo que, segundo a Fundação Nacional do Índio no Brasil (Funai), vivia em situação de isolamento voluntário na região leste do Peru até ser obrigada a refugiar-se do lado brasileiro da fronteira para fugir dos traficantes de madeira. Mais de uma centena de povos vivem de maneira isolada em todo o mundo, dos quais mais da metade se encontram no Brasil ou no Peru, segundo a Survival.
(Por Chrystelle Barbier, Le Monde, tradução de Jean-Yves de Neufville, UOL, 03/06/2008)