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mata atlântica Rio de Janeiro
2008-06-02

A jabuticabeira levou 22 anos para dar fruto, vem ver que linda”, convida Deise Moreira Paulo, proprietária de uma área verde no Norte Fluminense. Sem notar, ela dá uma aula sobre preservação ambiental: “Se lá atrás eu fosse pensar em ver o fruto, não teria plantado”.

O pedaço de terra que a funcionária aposentada da Petrobras exibe com orgulho tem 48 hectares, 38 deles cobertos por remanescentes da Mata Atlântica, um dos biomas mais ricos do Brasil. E que acaba de passar por uma varredura por satélite.

A nova edição do Atlas dos Remanescentes Florestais da Mata Atlântica, publicada na terça-feira 27, aponta que o desmatamento dessas áreas caiu 69% entre 2000 e 2005. Mostra, também, restarem apenas 7,26% do que um dia foi essa mata no Brasil. Pela primeira vez, o Atlas incluiu os remanescentes em seis estados do Nordeste. E, sem eles, o porcentual de vegetação restante ficaria em menos de 6,5% (há cinco anos, era de 6,98%). Há 20 anos, o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) e a Fundação SOS Mata Atlântica monitoram a floresta. Nesse período, 15,88 mil quilômetros quadrados de Mata Atlântica sumiram do mapa – o equivalente a um terço do estado do Rio de Janeiro.

“A situação é crítica, especialmente devido à elevada fragmentação florestal”, diz Márcia Hirota, coordenadora do Atlas. “Isso é um agravante para a proteção da rica biodiversidade da Mata Atlântica”, explica a diretora de Gestão do Conhecimento da Fundação SOS Mata Atlântica. Hirota aponta, sem pestanejar, a importância crescente das áreas preservadas e, por conseqüência, dos proprietários dessas áreas.

A notícia positiva é que proprietários privados como Deise Paulo têm impedido que a devastação seja maior. Mais de 75% do que ainda existe da mata está em terras particulares, fora de parques estaduais ou da União. “Muitos proprietários têm consciência e estão preservando essas áreas. É preciso que sejam valorizados, pois estão fazendo algo não para si próprios, mas para a posteridade”, avalia Hirota.

Desde 2000, a legislação ambiental brasileira prevê a criação de unidades de conservação denominadas Reserva Particular do Patrimônio Natural (RPPN). Elas são criadas por iniciativa do proprietário, em caráter permanente e sem a desapropriação da área. Há mais de 750 RPPNs no Brasil, e 500 delas estão na Mata Atlântica. Deise Paulo, além de dona de duas reservas particulares, é a diretora-executiva da Associação do Patrimônio Nacional, a primeira a surgir no País, que reúne as RPPNs no Rio de Janeiro.

O estado tem uma relação peculiar com a Mata Atlântica. No Atlas que analisou o período de 1990 a 1995, foi o campeão do desmatamento. Na edição atual, é o que menos desmatou. Essa mudança é resultado de uma série de ações correlatas. A ligação entre causas e efeitos explica, por exemplo, a história recente do mico-leão-dourado. A espécie nativa passou de risco crítico de extinção a “apenas” ameaçada em 2003, após um longo trabalho de campo. Para salvar o mico, é preciso recuperar seu hábitat: a floresta.

“As reservas não têm tamanho para abrigar os micos em quantidade suficiente para a sobrevivência da espécie”, explica Denise Rambaldi, secretária-geral da Associação Mico-Leão-Dourado, criada em 1992. “Nosso maior desafio é restaurar o hábitat natural e criar corredores entre as áreas preservadas.” A ONG já plantou 24 hectares de corredores da biodiversidade, como são chamadas as áreas que reconectam fragmentos de floresta. A Associação também incentiva proprietários de áreas rurais a aderirem a instrumentos legais, como as Áreas de Preservação Permanente e as RPPNs.

O mico-leão-dourado é o garoto-propaganda de Silva Jardim, município do Norte Fluminense, a 100 quilômetros da capital, que tem espantosos 33% de sua área total (que é de 93,9 mil hectares) cobertos por Mata Atlântica intocada, como informa o novo Atlas. Não por acaso, Silva Jardim concentra o maior número de RPPNs do Brasil (não em extensão territorial, mas em quantidade). São 10 reservas particulares, além de outras 12 em processo de regularização até o final deste ano.

Foi em uma delas que, há 22 anos, Deise Paulo plantou sua jabuticabeira. Em outra, a família da bióloga Cecília Amorim de Freitas criou a 110ª RPPN do Brasil, a Reserva Botânica das Águas Claras, de aproximadamente 100 alqueires, com 60% da área de floresta preservada. Uma vez por semana, Cecília de Freitas deixa o bairro de Santa Teresa, no centro do Rio, e ruma para a propriedade. Ela é casada com um professor e pesquisador do Jardim Botânico, e revela como mantém e preserva a área ao mesmo tempo. “Não se pode deixar um pedaço de terra parado. Então nós cultivamos a pupunha, que traz retorno financeiro, e plantas ornamentais. E servirmos de laboratório de pesquisa para a UFRJ e o Jardim Botânico”, diz. Uma das teses elaboradas na reserva mostrou que das nascentes de Silva Jardim brota a água que abastece a região dos Lagos (que inclui Cabo Frio e Búzios, e tem forte apelo turístico).

Uma parte da propriedade de Cecília de Freitas servia de pasto para gado antes da compra, em 1989. O descampado serviu para o cultivo de pupunha, palmito da região amazônica que dá em moitas e vem substituindo o palmito-juçara, extraído da palmeira nativa da Mata Atlântica e ameaçada de extinção. “O cultivo da pupunha na região coíbe o corte ilegal de palmito-juçara, emprega mais que a pecuária, e dá algum retorno financeiro”, analisa a proprietária. O sítio dela produz cerca de 50 quilos de pupunha por semana, entregues a restaurantes na zona sul carioca, e emprega 13 funcionários.

Na área das RPPNs é permitido desenvolver atividades como o turismo ecológico, trilhas, apicultura e coleta de sementes. Sem ilusões. “Ser dono de RPPN não é uma profissão”, avisa a bióloga, para quem a condição implica cuidar da terra e fazer parte de um movimento organizado. Ela dá um exemplo de como o retorno pode ser surpreendente: “Vi muitas nascentes, que eu não sabia que existiam, voltarem a verter água por causa da recuperação da mata ao redor. E isso em 20 anos”.

Nas últimas décadas, outra mudança também aconteceu em Silva Jardim, conforme avalia o secretário de Meio Ambiente, Rafael Badia Rezende: “Quem vem para a nossa cidade é filho de proprietário ou comprador novo. Ao contrário de antes, eles preferem manter a desmatar. A maioria vem para cá no fim de semana, e planeja um dia morar aqui”. A cidade sofre estagnação econômica e retração populacional. Entre 1998 e 2007, a população passou de 26 mil a 21 mil habitantes. Por conta do chamado ICMS Verde, nova lei estadual que repassará parte da arrecadação aos municípios com florestas preservadas, Rezende acredita que a situação vá melhorar um pouco.

A nova legislação também afetará os proprietários de RPPN, que se preparam para mudanças. “Até então, nossa preocupação era apenas preservar. Agora vamos conviver com a política pública, o que é desejável, mas traz muitas implicações”, pondera Deise, para quem o maior trunfo das reservas particulares é dividir com o proprietário o compromisso da preservação. Algo que, no entender dela, poderia ser mais bem explorado na política ambiental brasileira. “Os extremos nunca levam a lugar nenhum”, diz, sobre os ambientalistas mais inflexíveis, e conclui: “A RPPN mexe com o que existe de melhor dentro da pessoa, com o desejo de preservar algo bom, de deixar para sempre algo importante para você”. Como uma jabuticabeira.

(Por Phydia de Athayde, Carta Capital, 30/05/2008)

 


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