As pesquisas do Grupo de Polímeros Professor Bernhard Gross, do Instituto de Física de São Carlos (IFSC) da USP, unem diversas áreas do conhecimento. O que começou há mais de trinta anos, com estudos de físicos sobre materiais, hoje envolve química, biologia, engenharia e áreas inovadoras, como eletrônica orgânica e nanotecnologia. Os resultados podem ser vistos na forma de novas tecnologias, como componentes eletrônicos produzidos com materiais orgânicos e sensores que combinam polímeros com moléculas biológicas.
"Uma das linhas de estudo era a pesquisa com eletretos, materiais análogos aos magnetos, que armazenam cargas elétricas e são utilizados na produção de microfones para aparelhos telefônicos, por exemplo", conta o professor Osvaldo Novais de Oliveira Junior, coordenador do Grupo, falando sobre o início dos trabalhos da equipe, à época composta somente por físicos. Na década de 1980 foram desenvolvidos eletretos para telefones que atendiam todas as especificações oficiais, em parceria com a Telebras (empresa estatal que controlava a telefonia do Brasil na época). A tecnologia foi transferida para uma indústria, mas não chegou a uma produção em escala industrial e nem ao mercado.
Os eletretos só chegaram aos telefones brasileiros na década seguinte, por meio de componentes importados. No final dos anos 90 houve uma grande mudança na ênfase dos estudos do Grupo, que se voltaram para os polímeros (plásticos) especiais, condutores de eletricidade e luminescentes. "O plástico luminescente poderá substituir as telas de televisão e computador", aponta Osvaldo. "A tecnologia já existe, mas ainda não atingiu um custo de produção razoável".
As pesquisas com polímeros luminescentes levaram a uma área mais ampla chamada "eletrônica orgânica", que busca obter dispositivos feitos com materiais orgânicos para substituir os compostos inorgânicos usados em componentes eletrônicos (semicondutores, entre outros). Apesar de as substâncias orgânicas permitirem o uso de uma variedade maior de materiais, com menor custo de processamento, o desafio é criar aplicações específicas, mais focalizadas nas necessidades da indústria.
Aplicações
"Por meio da eletrônica orgânica seria possível criar uma tela flexível, de pequena espessura, ocupando grandes áreas", planeja o professor. "Há a possibilidade de usar painéis de plástico luminescente para iluminar ambientes, o que ainda não é viável devido à competição das lâmpadas fluorescentes, que têm baixo custo". Os polímeros também podem ser aplicados em etiquetas para produtos de supermercados, com os preços controlados por radiofreqüência. Bastaria ao consumidor passar o carrinho por um portal e já teria o valor total da compra. Uma idéia semelhante seria adotada em cartões inteligentes, em que as informações seriam armazenadas no próprio plástico do cartão, sem necessidade de chips.
O uso de materiais orgânicos na produção de polímeros gerou pesquisas sobre sua estrutura para obter informações em nível molecular, levando a desenvolvimentos em nanotecnologia. "Com isso, chegou-se aos estudos sobre sistemas biológicos, que envolvem eletrônica orgânica, química, física e engenharia", relata Osvaldo. As aplicações podem ser estendidas para a biologia e as ciências médicas. Biossensores para análises clínicas combinariam polímeros com biomoléculas para identificar diversos tipos de materiais. Estudos sobre o crescimento celular são realizados para aprimorar os mecanismos de identificação.
Nos laboratórios do Grupo de Polímeros do IFSC surgiram as bases para o funcionamento da língua eletrônica, que teve seu desenvolvimento em parceria com a Embrapa Instrumentação Agropecuária. "O princípio da língua eletrônica é a identificação de substâncias salgadas, doces, azedas e amargas, como o paladar humano, por meio da resposta elétrica de um conjunto de sensores em contato com os compostos", explica o professor Valtencir Zucolotto, que pesquisou o sistema. "Agora foi desenvolvida uma espécie de versão biológica da língua eletrônica, com as mesmas funcionalidades, feita com filmes ultrafinos de materiais orgânicos".
O princípio do sistema é adotado em uma tecnologia que imobilize anticorpos ou antígenos para diagnosticar doença de Chagas e leishmaniose, entre outras doenças. "As proteínas (antígenos ou anticorpos) presentes nos filmes interagirão com as amostras de sangue dos pacientes, e a resposta elétrica do filme permitirá que a doença seja detectada", descreve Zucolotto. O professor coordena uma nova linha de pesquisa do Grupo, que vai criar instrumentos para a medição da toxicidade de nanopartículas (como nanotubos de carbono) à saúde humana e ao meio ambiente.
(Por Júlio Bernardes, Agência USP, 30/05/2008)