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amazônia
2008-06-02

Documentos inéditos do regime militar mostram a preocupação com a saída clandestina de riquezas minerais

Há mais de 40 anos o governo brasileiro tenta tomar providências para provar que "a Amazônia tem dono", como afirmou o presidente Luiz Inácio Lula da Silva, na semana passada, preocupado com o interesse estrangeiro sobre a região. Documentos inéditos da época do regime militar (1964-1985), guardados no Arquivo Nacional, em Brasília, mostram que em 1967 o governo já se preocupava seriamente com a saída clandestina das riquezas minerais do País, especialmente as da Amazônia, e produziu um estudo com diretrizes específicas para cuidar da região.

No ofício de 2 de agosto de 1967, número 021-3S/4193/67, do Conselho de Segurança Nacional, classificado como "ultra-secreto", o governo apresenta um estudo sobre o "Descaminho das riquezas naturais do País". O início do texto produzido pelo Conselho de Segurança Nacional, ao qual o Estado teve acesso, afirma que o objetivo do estudo era "propor medidas que visem a impedir ou, pelo menos, limitar o descaminho de nossas riquezas naturais e o contrabando em nosso País, de modo a atestar o esforço e a indignação do governo revolucionário em face da alta corrupção e da ausência de patriotismo".

Segundo o estudo, as "denúncias incidem, com marcante constância, sobre grupos estrangeiros, com ou sem testas-de-ferro brasileiros, e predominantemente americanos". E exibe problemas semelhantes aos enfrentados até hoje na região. "Os campos de pouso clandestinos têm servido, muitas vezes, para aterrissagem de aeronaves suspeitas, brasileiras e estrangeiras (americanas, sobretudo) que realizam o transporte do material contrabandeado."

MATERIAL RADIOATIVO

Dentro do Conselho de Segurança Nacional, o assunto foi considerado prioridade. "Esta secretaria possui em seus arquivos vasta documentação referente ao descaminho e ao contrabando realizados no País. Há informações estarrecedoras em todas as divisões ou seções das Forças Armadas, bem como no Serviço Nacional de Informações (SNI) e neste gabinete que comprovam e tornam incontestáveis as constantes denúncias que continuam a ser feitas sobre o assunto."

Pelo levantamento do conselho, as principais riquezas desviadas eram "ouro, pedras preciosas, madeira e minérios contendo material radioativo". Para retirar o material, as autoridades do governo brasileiro constataram que a maior parte do contrabando deixava o Brasil transportado em embarcações fluviais e levado para navios. Também deixava o território nacional em aviões particulares e "até mesmo em bagagem de passageiros que se utilizam das aeronaves da FAB". Na visão do conselho, isso servia para atestar "a tranqüilidade e a rotina das operações garantidas pela impunidade e pelo suborno nos vários escalões".

O diagnóstico apresentado no estudo lembra que o roubo de riquezas brasileiras é "um fenômeno muito antigo e vem desafiando os governos e a administração da República pela complexidade de sua solução, num país de extensão continental com enormes fronteiras e litoral de difícil controle". O documento está impregnado da visão nacionalista dos integrantes do Conselho de Segurança Nacional que reagem indignados à colaboração de brasileiros no contrabando das riquezas nacionais para o exterior.

"Pior é o apoio organizado que os apátridas nascidos em território brasileiro têm dado à dilapidação de nossas riquezas naturais, acobertando, protegendo, legislando e julgando os casos de descaminho e contrabando de modo a se locupletarem regiamente com o dinheiro da corrupção", diz o texto.

OURO E MADEIRA

O estudo lista números de evasão de recursos constatados pelo governo. Em relação à evasão de ouro, relatório da Exatoria Federal de Santarém (PA) mostra que durante o ano de 1965 os garimpos do município de Itaituba produziram 816.361 quilos de ouro. Segundo o Conselho de Segurança Nacional, somente o garimpo de Griporozinho, pertencente ao município de Itaituba, atingia média de produção diária de 30 quilos de ouro, chegando a quase 1 tonelada por mês.

Na extração de madeira, o governo constata o mesmo tipo de irregularidade. "Muitas firmas exploram ilegalmente a madeira neste País, com realce das instaladas na região Norte que se especializam em madeiras de lei", cita o texto. "O preço dessa madeira, saída de modo fraudulento, é da ordem de US$ 6 mil o metro cúbico laminado. No entanto, esse metro cúbico é comprado dos mateiros por aproximadamente US$ 70", descreve o estudo.

Como proposta para solucionar o problema, o governo adota soluções parecidas com as atuais, como a criação de um "grupo de planejamento e execução, de alto escalão, subordinado à Presidência da República". Para frear a corrupção de seus agentes na região, o governo propõe também melhorar suas condições de vida.

Assim, oferece a "criação de condições compensadoras - habitação, saúde, higiene, conforto, e justas gratificações - aos agentes de repressão ao contrabando. Tal medida tem o objetivo de facilitar a seleção dos homens e tornar mais difícil (além de injustificável) qualquer tipo de suborno".

(Por Marcelo de Moraes, Estadão Online, 01/06/2008)


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