A Convenção sobre Diversidade Biológica das Nações Unidas (CDB) encerrou a sexta-feira (30) em Bonn duas semanas de negociações sobre um projeto que servirá de base para alcançar um acordo legal sobre biopirataria no Japão em 2010. A questão polêmica é debatida desde a Cúpula da Terra do Rio de Janeiro em 1992. O ministro do Meio Ambiente alemão, Sigmar Gabriel, classificou o resultado de "sucesso" e afirmou que o mandato alcançado em Bonn permite dar nova energia à CDB e sair "do ponto morto" em que estava.
Gabriel destacou que de Bonn saiu o primeiro projeto internacional sobre a Repartição de Acesso e Lucro entre os que comercializam os recursos genéticos e os países de origem destes, um dos assuntos mais polêmicos do congresso. "O mandato de Bonn não é a conclusão de nosso trabalho. Este começará na próxima segunda-feira", afirmou Gabriel, que acredita que até 2010 serão resolvidas as questões ainda em aberto a fim de obter acordos vinculativos.
O ministro anunciou que alguns dos mais de 190 membros da conferência - entre eles México, Guatemala e Indonésia - propuseram a conversão de 65 milhões de hectares em novas áreas protegidas, dentro da iniciativa voluntária LifeWeb apresentada pela Presidência alemã em Bonn para obter fundos extras de financiamento. Segundo ele, vários países se comprometeram a fazer contribuições para este fundo. Alemanha e Noruega contribuirão com 500 milhões de euros cada, e Finlândia já ofereceu 500 mil euros, ressaltou Gabriel.
Também foram decididos na conferência os critérios que deverão ser aplicados para determinar a rede de áreas marinhas protegidas que devem ser estabelecidas até 2012, disse o ministro. Gabriel admitiu que gostaria de poder "avançar mais rápido" quanto ao alcance das decisões adotadas, mas disse que desse modo "alguns dos temas da conferência teriam ficado pelo caminho".
O cultivo de matérias-primas para a produção de biocombustíveis e os organismos geneticamente modificados serão objeto de estudo de dois novos grupos de trabalho, que apresentarão seus resultados na próxima Conferência das Partes, que será realizada no Japão em 2010. "Inclusive os países mais reticentes a falar sobre biocombustíveis participaram dos debates científicos sobre o impacto que o cultivo de matérias-primas para sua produção tem sobre a biodiversidade", comemorou Gabriel.
O ministro pediu à comunidade internacional a lutar com mais afinco contra a poda ilegal de árvores e disse que tanto a Comissão Européia (CE) quanto a Alemanha preparam pacotes legais contra estas práticas. O diretor-executivo do programa ambiental da ONU, Achim Steiner, disse que a humanidade não pode se permitir destruir as funções e serviços que a natureza fornece gratuitamente, e comemorou que a conferência tenha conseguido vincular economia e ecologia através de seu debate sobre biopirataria.
O secretário-executivo da Convenção de Biodiversidade da ONU, Ahmed Djoghlaf, afirmou que a reunião de Bonn "entrará para a história e marcará um antes e um depois na forma de alcançar acordos internacionais pelo tratamento respeitoso" promovido pela Presidência alemã. Elogiou as "fortes decisões" adotadas durante a conferência, mas alertou que o caminho mais difícil começa agora, já que os princípios de acordos alcançados em Bonn deverão se transformar em textos legais em 2010.
As ONGs receberam os resultados com menor entusiasmo e criticaram a "lentidão" de todo o processo. No entanto, elogiaram o "grande compromisso" mostrado pela Presidência alemã, que teve o gesto "exemplar" de liderar a campanha de doações, apesar da pouca capacidade de convencimento entre seus parceiros do Grupo dos Oito (G8, os sete países mais industrializados e a Rússia). Devido a isso, as ONG concederam o Prêmio Serra Elétrica de Ouro ao Japão, presidente rotativo do G8 e considerado um dos principais bloqueadores das negociações de Bonn.
(Estadão Online, Ambiente Brasil, 31/05/2008)