Resumindo, um alto nível de habilidade diplomática será necessário em Bonn para promover o avanço de uma questão básica: quem pagará quanto e pelo quê? O custo anual de reduzir a extinção de espécies até 2010 é estimado em US$ 46,5 bilhões. Os chefes de Estado da UE são ainda mais ambiciosos e querem impedir totalmente a perda de biodiversidade na Europa até 2010. Mas o WWF acredita que esta meta só será atingida "a um custo adicional significativo".
Vencer a crise provavelmente exigirá uma grande variedade de modelos de financiamento. Se concentrar na biodiversidade como fonte de novas drogas e cosméticos é uma possibilidade, o comércio de certificados de CO2 é outra. Patrocinadores privados também podem ter um impacto importante. O grupo de conservação TNC, por exemplo, administra uma fortuna de US$ 5,4 bilhões, parte dela doada por patronos ricos. Apenas em 2007, a TNC gastou US$ 566 milhões na compra de terras e na proteção delas para futuras gerações.
Outros escolheram realizar algo semelhante a megalomania colonial e controlar pessoalmente o destino da natureza. A Patagônia, por exemplo, parece estar firmemente nas mãos de bilionários. Por anos, Douglas e Kris Tompkins, os co-fundadores das empresas de moda North Face e Patagonia, se tornaram proprietários de milhares de quilômetros quadrados de território virgem na região. Alguns de seus vizinhos são o especulador George Soros, os magnatas da moda Luciano e Carlo Benetton, os atores Christopher Lambert e Sharon Stone, e o fundador da CNN, Ted Turner.
Os não tão fabulosamente ricos podem adquirir ilhas tropicais ou pedaços do tamanho de um hectare de corredores de animais selvagens por meio de organizações como TNC ou o World Land Trust.
O economista Pavan Sukhdev também recomenda a adoção, fora um imposto de valor agregado, de um tipo de imposto de redução de valor nos países ricos -uma forma de compensar os danos ambientais associados à produção de um carro ou de um refrigerador. As receitas desses impostos poderiam fluir diretamente para projetos de conservação de grande escala.
Sukhdev também quer forçar as empresas e consumidores a assumirem uma maior responsabilidade. "Uma empresa de café poderia cobrar uma pequena sobretaxa e investir dinheiro na floresta tropical vizinha à suas plantações", ele disse. Quando se trata de alimentos orgânicos, os consumidores já estão preparados para pagar um preço mais caro. "Então por que não criar um rótulo 'Eco-Plus' para testar se estão dispostos a pagar um valor adicional para financiar projetos de conservação?"
Atualmente, as pessoas já podem tornar suas viagens climaticamente neutras ao compensarem as emissões de aviões e carros alugados por meio de empresas como a firma alemã Global-Woods. A empresa usa a receita para financiar programas de reflorestamento na Argentina, Paraguai e Uganda. Outro exemplo é a rede de hotéis Marriott. A empresa pagou US$ 2 milhões para o Estado brasileiro do Amazonas para proteger de madeireiros os 589 mil hectares da reserva do Juma. Em troca, a Marriott recebe créditos de CO2, que então são oferecidos para venda aos hóspedes do hotel para que possam continuar relaxando nas saunas de seu hotel sem terem dor na consciência.
Especialistas em pesca, por outro lado, recomendam a compra apenas de peixe com eco-rótulo do Marine Stewardship Council (conselho de manejo marinho). Qualquer um que quiser comer criaturas marinhas de forma ambientalmente responsável no futuro terá que se virar sem espécies como linguado-gigante (alabote) ou solha. Quando se trata de madeira, a maioria dos conservacionistas reconhece a certificação concedida pelo Forest Stewardship Council (conselho de manejo florestal).
Segundo estimativas, dentro de apenas dois anos os consumidores de todo o mundo poderiam gastar US$ 75 bilhões em peixe, madeira, ervas medicinais e alimentos produzidos de forma boa para o meio ambiente. Segundo o BfN, cada lar na Alemanha pagaria em média 100 euros por ano para preservar a biodiversidade. Isto representaria um total de 3,5 bilhões de euros. "Isto representa três vezes mais dinheiro do que temos ao nosso dispor até o momento para proteção de espécies e habitats", disse Burkhard Schweppe-Kraft, um economista da BfN.
Se cada vez mais é atribuído valor às paisagens naturais, elas poderiam perder seu papel como "os depósitos de lixo gratuitos do mundo", como colocou Gordon Shepherd da WWF. Mas Shepherd também alerta que adicionar valor à natureza "não é uma panacéia". Na verdade, isso gera muitas questões. Por exemplo, os países em desenvolvimento teriam que provar que sua meta não é simplesmente conseguir dinheiro adicional, mas que existe seriedade na proteção da diversidade.
Os países industrializados, por sua vez, provavelmente serão acusados de meramente orquestrar uma enorme fachada verde para uma política industrial fracassada, que por décadas tratou a natureza como uma loja self-service barata. Os mecanismos da economia global são realmente adequados para assegurar a diversidade?
"A conservação baseada puramente no lucro poderia fracassar em locais onde, por exemplo, ela buscar proteger animais que entram em choque com nossos interesses", escreveu Douglas McCauley, da Universidade de Stanford, na revista "Nature". Segundo McCauley, a natureza que não causa mal, mas também não propicia nenhum benefício ao homem, também fracassaria no teste econômico.
Quando lobos matam ovelhas ou quando cormorões provocam caos em lagos de peixe comerciais, é apenas a natureza em ação. Por outro lado, as pessoas dificilmente pagarão por conservação baseada apenas em seu benefício ao homem.
A economia e a preservação da diversidade freqüentemente se encontram diametralmente opostas. Há cerca de 50 anos, por exemplo, a perca do Nilo foi introduzida deliberadamente no Lago Vitória, no Leste da África. Pescadores dos países adjacentes ao lago, Uganda, Tanzânia e Quênia permanecem entusiásticos com a chegada do peixe comestível até hoje, porque ajudou a alimentar um grande crescimento econômico. Mas os recém-chegados representaram um desastre ecológico para a população diversa e única do lago de haplochromine cichlids, levando ao que o biólogo social Edward Wilson já chamou de "a onda de extinções mais catastrófica na história recente".
Tornar o valor econômico dos ecossistemas a única base para conservação significaria que "a natureza só vale a pena ser protegida se também for lucrativa", alertou o biólogo McCauley, se referindo ao risco de um declínio repentino de valor.
O que acontecerá às florestas tropicais, que agora são vistas como um sistema de armazenamento de CO2, se uma solução técnica mais barata for encontrada para eliminação dos gases do efeito estufa? As florestas então seriam liquidadas, para empregar um termo econômico? O valor da natureza -sua beleza, sua importância cultural e evolucionária- não pode ser estimado, disse McCauley. "A longo prazo, nós obteremos mais progresso se apelarmos aos corações humanos e não aos seus bolsos."
Em outras palavras, cabe ao homem decidir em que tipo de mundo ele deseja habitar. Qualquer um familiarizado com a natureza selvagem sabe o que será perdido caso a destruição prossiga não contida. Quando a comunidade internacional conseguir concordar em um modelo de negócios para salvar a biodiversidade, poderá ser tarde demais.
Nós também devemos considerar a necessidade de preservar "refúgios para a alma", disse Beate Jessel, a presidente da BfN. Os parceiros da CDB devem também levar isto em consideração caso desejem evitar de se perderem na selva de acordos internacionais e sensibilidades bilaterais em Bonn.
Será que negociaremos até a morte? As palavras devem rapidamente ser seguidas por ações. O economista indiano Pavan Sukhdev vê a situação como muito séria. Nós enfrentamos uma decisão, segundo Sukhdev, sobre se nossa civilização sobreviverá ou não.
Sukhdev esteve recentemente em Berlim para um encontro com Gabriel, o ministro alemão do meio ambiente, para discutir a crise. O ministro se encontra do outro lado da desolada praça Alexanderplatz, cruzando um deserto cinza de concreto. "É o lugar ideal para um ministério do meio ambiente", disse Sukhdev. "Você vê todo dia as coisas que deseja prevenir."
(Por Philip Bethge, Rafaela von Bredow e Christian Schwägerl, Deutsche Welle, tradução de George El Khouri Andolfato, UOL, 29/05/2008)