Para piorar as coisas, a taxa de declínio é formidável. Uma estimativa atual do Pnuma concluiu que as espécies estão se tornando extintas 100 vezes mais depressa atualmente do que normalmente ocorreria em conseqüência da evolução.
"Uma sexta extinção em massa global teve início", disse Steiner, o diretor executivo do Pnuma. A diversidade das espécies já foi seriamente comprometida cinco vezes no passado, após colisões de meteoritos, erupções vulcânicas e elevação do nível dos mares. Mas atualmente são as mais de 6,6 bilhões de pessoas que estão destruindo a natureza em uma taxa sem precedente. Elas caçam e pescam em taxas descontroladas. Elas transformam mais e mais terra em campos agrícolas para encher seus estômagos. Elas derrubam as últimas florestas virgens para produzir biocombustíveis para seus automóveis. Elas poluem a água, o solo e o ar com substâncias tóxicas. E arrastam espécies de uma parte do planeta para outra -às vezes com conseqüências devastadoras.
Atribuindo um valor monetário à natureza
A pegada do homem no planeta está crescendo de forma inexorável. E o Homo sapiens, a supostamente perceptiva raça humana, fracassou miseravelmente em proteger a diversidade biológica da Terra. Mas agora uma revolução está transcorrendo na forma como pensamos, à medida que os ambientalistas e economistas descobrem o valor de mercado da natureza. Eles estão se unindo para traduzir os benefícios de mangues, baleias e florestas tropicais em valor monetário. Segundo esta nova mentalidade, a destruição da natureza não será mais lucrativa, enquanto a proteção será. Pavan Sukhdev, o diretor do estudo conjunto da Alemanha-UE sobre biodiversidade, considera esta a solução óbvia. É agora ou nunca, disse Sukhdev, "que a arma econômica deve atirar na direção certa".
Em uma recente manhã, o indiano de 48 anos apontou para o deserto de concreto da praça Alexanderplatz, em Berlim. "Todo o planeta ficará assim desolado se não tivermos sucesso", disse Sukhdev, que também chefia a divisão de mercados globais do escritório indiano do Deutsche Bank, em Mumbai. Há dez anos, ele disse, uma amiga lhe fez a seguinte pergunta: "Você é um banqueiro. Então me diga, por que algumas coisas valem algo enquanto outras não?" Enquanto procurava por uma resposta para a pergunta dela, ele teve a idéia de calcular os preços de florestas, mangues e rios.
Os cálculos de Sukhdev, a princípio ridicularizados, de lá para cá se tornaram a força motriz por trás da revolução da conservação. Os economistas agora realizam cálculos detalhados para refletir o que a diversidade faz pelas pessoas. As abelhas, por exemplo, valem entre US$ 2 bilhões e US$ 8 bilhões por ano, porque polinizam plantas agrícolas importantes em todo o mundo. Junco que cresce às margens dos rios também é considerado valioso. Ao longo da parte central do Rio Elba na Alemanha, por exemplo, eles são responsáveis por 7,7 milhões de euros de economia anual, porque filtram a água, eliminando assim a necessidade de construção de usinas de tratamento de esgoto adicionais.
Na costa da província do Beluquistão, no Paquistão, um hectare de floresta de mangue intacto produz o equivalente a cerca de US$ 2.200 em renda anual. O ecossistema é área de reprodução de espécies de peixes economicamente atraentes, assim como atua como uma barreira protetora contra enchentes. Os pântanos salinos na Escócia valem cerca de 1.000 euros por hectare para a indústria de mexilhão da região.
Os turistas que visitam o Parque Nacional Müritz na Alemanha, e que se maravilham como as águias, grous e cervos-vermelhos, contribuem com 13 milhões de euros de receita anual. No Reino Unido, uma equipe de pesquisadores que trabalha com o biólogo de conservação Andrew Balmford calculou que a rede global de áreas protegidas produz cerca de US$ 5 bilhões em receita anual. Os cálculos do grupo refletem os benefícios econômicos das reservas para o turismo, proteção do clima, ciclos de nutrientes e suprimento de água.
Se a destruição dos habitats continuar sem pausa, até mesmo a chave para o futuro suprimento de energia do planeta poderá não ser descoberta. O geneticista americano, Craig Venter, coletou milhares de amostras de microorganismos que vivem na água do mar durante viagens em seu iate, o Sorcerer II. Venter espera que as amostras contenham seqüências genéticas que possam ser usadas para produção de combustíveis para carros e aviões no futuro.
Em 1997, o economista ecológico americano Robert Costanza estimou o valor anual dos serviços que a natureza fornece para a humanidade em US$ 33 trilhões, um número que representava 1,8 vez o produto mundial bruto da época.
Uma mudança de pensamento
Apesar de sua enormidade, estes números foram de pouca utilidade para as espécies e ecossistemas no passado, porque poucos estavam dispostos a pagar pelos ativos da natureza. De fato, as corporações mais poderosas do mundo continuam tratando animais, plantas, florestas, rios e áreas alagadiças como recurso gratuito. Mas pelo menos alguns setores parecem estar se aproximando de um divisor de águas importante no momento.
Por exemplo, as empresas já ganham US$ 43 bilhões em receita anual com medicamentos naturais baseados em plantas. Os agentes ativos em 10 das 25 drogas de maior sucesso do mundo foram obtidos a partir de fungos, bactérias, plantas e animais que vivem na natureza. Os precursores da aspirina vieram da casca do salgueiro e ulmaria. A planta dedaleira é fonte do agente na droga digitoxina para o coração.
As empresas gastam bilhões pesquisando pelas próximas megadrogas derivadas de fontes diversas na natureza. Mas a natureza recebe algo em troca? Os modelos iniciais mostram que ela pode. Na Costa Rica, por exemplo, já há uma tradição de procurar por drogas milagrosas na floresta. O Instituto Nacional de Biodiversidade (INBio) foi fundado na capital, San José, em 1989. Nos anos 90, a empresa farmacêutica Merck investiu US$ 4 milhões no instituto de pesquisa, que já adquiriu reputação mundial. Os executivos da Merck prometeram doar 10% dos lucros de descobertas potenciais para o país, com parte do lucro destinado à conservação.
As borboletas, plantas e fungos da Costa Rica detêm a chave para novas drogas para combate da malária e câncer, ou ao menos fornecer ingredientes para novos cremes para pele e xampus anticaspa? Os renomados pesquisadores do INBio continuam à procura de respostas para estas perguntas, buscando constantemente substâncias naturais úteis.
Em uma manhã recente, por exemplo, Jorge Blanco, um especialista em fungos, estava analisando cuidadosamente as folhas da Monimiaceae siparuna, uma planta que lembra a família do loureiro. Usando um escalpelo, ele cortou as preciosas folhas verdes e colocou os pedaços em pratos de cultura. Logo brotariam fungos que antes cresciam apenas dentro das folhas. Para obter a planta, Diego Vargas, um biólogo que trabalha no INBio, passou duas horas do dia anterior em um utilitário esportivo, dirigindo por estradas sinuosas no Parque Nacional Braulio Carrillo, ao longo das encostas do vulcão Barva.
Vargas, vestindo um boné, camiseta branca e luvas azuis de borracha, fotografa as plantas na mata virgem, então usou tesouras de jardim para retirar as infrutescências de várias plantas e as coloca cuidadosamente em sacos. Espiando nos pequenos arbustos, ele encontrou a Monimiaceae siparuna, uma planta com minúsculas flores amareladas. Ele girou suas tesouras de jardim como um caubói com seus revólveres, então cortou habilmente as infrutescências: um pequeno corte para Vargas, mas um corte gigante para a humanidade?
"Muitos dos fungos que vivem nas folhas desta planta nunca foram estudados, porque são muito difíceis de isolar", disse Vargas. "Eles podem muito bem produzir muitas substâncias interessantes que ainda desconhecemos."
Desde que o INBio foi fundado no final dos anos 80, seus cientistas já examinaram milhares de insetos em sua busca por substâncias naturais úteis. Atualmente, equipamento de alta tecnologia no laboratório especial do instituto, em Herédia, um subúrbio de San José, é usado principalmente para analisar extratos de plantas, micróbios e fungos.
O grande bio-boom ainda não se materializou, levando a Merck e alguns outros grandes investidores a retirarem seu financiamento. "As companhias farmacêuticas não querem mais pagar pelo longo processo necessário para encontrar substâncias promissoras na natureza", disse Giselle Tamayo, a coordenadora técnica da divisão de prospecção da biodiversidade do INBio.
(Por Philip Bethge, Rafaela von Bredow e Christian Schwägerl, Deutsche Welle, tradução de George El Khouri Andolfato, UOL, 29/05/2008)