O emissário da Europa mal podia acreditar em seus olhos. Borboletas do tamanho de pratos de sobremesa voavam ao redor de seu nariz. Orquídeas pendiam em cascata de árvores imensas. Calaus voavam sobre a copa das árvores. O ar tropical estava repleto do cheiro saturado de crescimento e proliferação.
Os biólogos já registraram mais de 10 mil plantas e 400 espécies de mamíferos na Bacia do Congo. Estas plantas e animais fazem parte da segunda maior floresta tropical contínua do mundo, um dos sistemas mais potentes de armazenamento de carbono do planeta. De fato, é precisamente por este motivo que Hans Schipulle, 63 anos, está vagando pela floresta próxima do Rio Sangha, em uma manhã úmida na República Centro-Africana.
"Esta floresta armazena dióxido de carbono e, portanto, ajuda a desacelerar o aquecimento global. Ela regula o suprimento de água global e contêm produtos farmacêuticos valiosos", disse Schipulle, um ambientalista veterano que trabalha para o governo alemão. "Nós temos que nos conscientizar de que estes são serviços que valem algo para nós".
Schipulle está na região em uma missão sensível. Desde dezembro, ele chefia a Parceria da Floresta da Bacia do Congo (CBFP, na sigla em inglês), um grupo fundado por americanos, europeus e os países ao longo do Rio Congo. A aliança visa proteger a Bacia do Congo de ser saqueada e transformada em plantações de café e óleo de palma até a metade do século. A floresta tropical do Congo está em grande parte intacta, mas investidores de todas as partes do mundo já descobriram o potencial da região para grandes negócios -minérios, diamantes, plantações e madeira. Mas Schipulle e seus parceiros têm outros planos para a Bacia do Congo. Eles querem que as instituições financeiras internacionais ou a comunidade internacional paguem pela preservação da floresta como está hoje. A ameaça de desmatamento traz um duplo risco para o mundo. Primeiro, a destruição da floresta tropical do Congo eliminaria um dos sistemas de resfriamento mais importantes do planeta. Segundo, o dióxido de carbono (CO2) emitido em conseqüência de uma agricultura de corte e queima aceleraria ainda mais o aquecimento global.
Bayanga, uma aldeia próxima, é a prova viva do conflito tradicional entre a proteção do meio ambiente e o combate à pobreza. Até recentemente, seus moradores se beneficiavam da destruição da floresta tropical. Uma serraria em Bayanga empregava 370 pessoas, mas ela foi fechada depois que Schipulle e sua aliança fizeram um apelo urgente ao governo na capital, Bangui, para impedir a madeireira duvidosa de ser autorizada a explorar os 4.520 quilômetros quadrados de floresta.
Foi uma pequena vitória da natureza, mas os moradores da aldeia ainda precisam de trabalho e de renda. Um projeto de ecoturismo patrocinado pelo Fundo Mundial para a Natureza (WWF) e pela Sociedade Alemã para Cooperação Técnica (GTZ) criou empregos para apenas 94 pessoas até o momento, fornecendo para a comunidade cerca de US$ 15.500 em renda anual -algo insuficiente para reduzir a pobreza.
CONSERVAÇÃO DA NATUREZA
Como Schipulle pode explicar para as pessoas de Bayanga o que sua floresta representa para o restante do mundo? É realmente possível que o ecoturismo, uma silvicultura ambientalmente responsável e plantações de café às margens das regiões florestais futuramente protegidas serão capazes de alimentar os homens, mulheres e crianças da aldeia?
Um mercado de emissões para a floresta tropical do Congo
Schipulle acredita firmemente nesta visão. O Banco Mundial já planeja incorporar toda a Bacia do Congo em seu programa Parceria de Carbono Florestal. A organização com sede em Washington deseja entrar no mercado de emissões com o CO2 armazenado pela floresta tropical do Congo. Como o desmatamento nas regiões tropicais é responsável por cerca de 20% da mudança climática, proteger a floresta significa proteger o clima -e a comunidade mundial está cada vez mais disposta a pagar muito para que isso aconteça.
O possível resgate da floresta tropical do Congo é apenas um de muitos exemplos. Uma nova era de conservação está amanhecendo. Pela primeira vez, um valor está sendo atribuído às florestas, plantas e recifes de coral, um valor que torna sua proteção valiosa. É uma verdadeira mudança de paradigma no movimento ambiental.
Noções românticas sobre natureza e meio ambiente de lado, governos, conservacionistas e cientistas estão apresentando novas questões, cujas respostas moldarão o futuro da humanidade: Quanto vale a Terra? O valor de sua diversidade pode ser calculado? Quanto a realização de um inventário do planeta valeria para nós? E finalmente, quem deve pagar a conta de décadas de má administração às custas da natureza?
Autoridades de todas as partes do mundo estão atualmente tratando destas preocupações cruciais em uma conferência da ONU sobre biodiversidade em Bonn, Alemanha. Representantes de 191 países e cerca de 250 organizações ambientais, de conservação e de ajuda para desenvolvimento estão se concentrando em formas de deter a perda de espécies e habitats. Dezenas de resoluções esboçadas, muitas delas controversas apesar de terem sido formuladas na linguagem seca da diplomacia internacional, estão sendo analisadas. Até mesmo o nome do encontro não condiz com sua importância: 9ª Conferência das Partes da Convenção sobre Diversidade Biológica da ONU.
Em questão em Bonn está nada menos que o futuro do planeta e o fracasso dramático da humanidade em deixar um planeta habitável para seus filhos. Florestas, espécies, habitats e ecossistemas estão desaparecendo em taxas sem precedentes. A cada dia, os seres humanos extinguem entre três e 130 espécies, dependendo da estimativa adotada. A cada ano, florestas virgens com uma vez e meia o tamanho da Suíça são desmatadas para extração de madeira. Mangues estão desaparecendo, rios estão sendo forçados a correr em canais de concreto e a erosão está transformando encostas de montanhas em desertos. Continua - leia a parte 2
(Por Philip Bethge, Rafaela von Bredow e Christian Schwägerl, Deutsche Welle, 29/05/2008)