Deputados da Amazônia rebateram nesta quarta-feira (28/05) o argumento do governador de Roraima, José de Anchieta Júnior, de que a demarcação da reserva indígena Raposa Serra do Sol ameaça a segurança do Brasil nas fronteiras e compromete a soberania nacional. "É inadmissível o argumento de que as fronteiras ficarão desprotegidas pela ausência de cidadãos brasileiros, como se os povos indígenas não fizessem parte da nação brasileira", criticou a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC). As críticas foram reforçadas pelos deputados Nilson Mourão (PT-AC) e Dalva Figueiredo (PT-AP).
Segundo Anchieta, se for mantida a situação atual, "as fronteiras brasileiras com a Venezuela e a Guiana ficarão desprotegidas, pois a reserva em terras contínuas impede a presença de não-índios no local". O governador, que já discutiu o assunto com os deputados há duas semanas, voltou a defender a demarcação em áreas descontínuas (ilhas) para permitir que brasileiros não-índios possam viver e trabalhar na faixa de fronteira. "Isso é fundamental para garantir a vigilância", enfatizou.
O deputado Neudo Campos (PP-RR) concordou com Anchieta, ao questionar a capacidade dos povos indígenas para defender as fronteiras. "Não é responsabilidade legal dessas tribos defender a soberania nacional. É um equívoco pensar dessa forma", contestou.
O debate ocorreu durante audiência pública conjunta promovida pelas comissões de Relações Exteriores e de Defesa Nacional; e da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional. O objetivo foi discutir as conseqüências da demarcação da reserva.
Problemas fundiários
Para o ministro de Assuntos Estratégicos, Mangabeira Unger, que também participou da audiência, a demarcação de terras indígenas não deve ser vista como problema para a segurança da Amazônia. "Ao contrário, as reservas ajudam a preservar a floresta, pois os povos indígenas não desmatam", afirmou.
Em sua opinião, o que deve ser motivo de preocupação dos parlamentares, do governo e da sociedade são os conflitos fundiários, os desmatamentos e o comércio ilegal de madeira na região.
Segundo Mangabeira Unger, a demarcação da reserva não compromete a soberania nacional, pois "uma reserva não é uma cidadela independente, nem território autônomo", afirmou. Para o ministro, uma reserva indígena é terra da União e não há impedimento para a presença das Forças Armadas responsáveis pela segurança das fronteiras e a defesa da soberania nacional. "Não só os militares, mas todos os cidadãos brasileiros poderão ter acesso às áreas demarcadas, pois o direito de ir e vir é assegurado a todo cidadão brasileiro pela Constituição", reforçou.
Solução alternativa
Na avaliação de José de Anchieta Júnior, a demarcação contínua das áreas indígenas, que já ocupam 46% do território do Estado, pode gerar obstáculos ao desenvolvimento de Roraima. O governador considera que a demarcação em ilhas "seria uma solução alternativa, capaz de atender às necessidades dos povos indígenas, mas sem prejudicar os demais brasileiros que vivem e trabalham no local".
A reserva, homologada por decreto presidencial em 2005, é contestada em ação civil pública no Supremo Tribunal Federal (STF). Vivem na área da reserva 18 mil indígenas, 50 famílias de agricultores brancos e 8 grandes produtores de arroz. A plantação de arroz é um dos setores mais importantes da economia de Roraima.
A audiência foi requerida pelos deputados Marcelo Itagiba (PMDB-RJ), Antonio Carlos Pannunzio (PSDB-SP), Francisco Rodrigues (DEM-RR) e Marcio Junqueira (DEM-RR). O assunto já havia sido discutido pelas duas comissões no último dia 14, com a presença do ministro da Justiça, Tarso Genro; e do governador José de Anchieta Júnior.
(Por Antonio Barros, Agência Câmara, 28/05/2008)