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emissões de co2 arborização urbana captura de carbono
2008-05-28
Duas letras e um número: CO2. Nunca na História uma sigla tão pequena significou tanto para o futuro do planeta. (A fórmula que deu origem à bomba atômica, E = MC2, perde em concisão por ter uma letra a mais). A molécula CO2, também conhecida como gás carbônico, é a principal responsável pelo aquecimento global, uma questão que entrou para a agenda política do planeta nos últimos anos.

O excesso de CO2 na atmosfera potencializa o efeito estufa, um mecanismo que retém o calor na superfície da Terra. Ao contrário do que se imagina, o efeito estufa é benéfico à vida em nosso planeta. Sem ele, a temperatura média seria de gélidos 18º negativos.

O equilíbrio do efeito estufa, entretanto, é delicado - quanto mais gás carbônico, mais radiação solar fica retida na atmosfera terrestre, o que aumenta a temperatura do planeta e leva a desastres ambientais. A questão é grave e rendeu um Prêmio Nobel da Paz em 2007 a Al Gore, exvice- presidente dos Estados Unidos e principal figura pública no combate ao aquecimento global.

A preocupação com o futuro do planeta levou a Organização das Nações Unidas a criar um painel permanente para discutir as mudanças climáticas. O IPCC, que dividiu o Prêmio Nobel com Al Gore, ajudou a redigir o Protocolo de Kyoto, em 1997.

Nesse documento, países do mundo inteiro se comprometeram a diminuir ou compensar a emissão de CO2. Sem muita surpresa, os engenheiros responsáveis por identificar os maiores poluidores descobriram que o setor de transportes é o segundo maior poluidor do mundo, só perdendo para a geração de energia.

Um recente estudo da Universidade de Oslo, na Noruega, afirma que o setor de logística foi o responsável por algo entre 15% e 30% de todo o dióxido de carbono despejado na atmosfera nos últimos 100 anos. Segundo um estudo realizado em 2000 pelo Programa de Engenharia de Transportes da Coppe/ UFRJ, 28% das emissões de carbono na cidade do Rio de Janeiro provém de caminhões e ônibus.

"É preciso acordar agora", diz Francisco Maciel, um dos diretores da ONG Iniciativa Verde. A ONG de Maciel emite um selo chamado Carbon Free. Funciona assim: a Iniciativa Verde calcula quanto carbono uma empresa despeja no ar anualmente em suas atividades normais e estuda formas de neutralizar esse impacto.

O plantio de árvores é uma das formas de neutralização utilizadas, já que a árvore absorve e estoca o gás carbônico emitido pela queima do combustível. A Iniciativa Verde foi responsável pelo programas de seqüestro de carbono da São Paulo Fashion Week e do Tim Festival, entre outros.

Em 2005, Maciel foi procurado pela Utilíssimo Transportes, com sede no Rio de Janeiro. A empresa, que tem uma frota de 80 veículos (entre pequenos, médios e grandes), faz em média 1 500 entregas por dia. "Eu vinha acompanhando na mídia essa questão do aquecimento", diz Baldomero Neto, diretor da Utilíssimo. "Descobri que nenhuma empresa de logística neutralizava completamente as emissões."

A Utilíssimo distribui cosméticos da Natura e produtos eletrônicos da Semp Toshiba. Segundo Neto, essas empresas procuram diferenciais na hora de renovar os contratos.

Em 2005, ele decidiu investir num projeto de renovação da frota - comprou caminhões eletrônicos, que poluem menos, e converteu seus veículos pequenos para gás natural veicular.

O passo seguinte foi plantar árvores. Existe um cálculo-padrão: para cada 190 quilos de gás carbônico é necessário plantar uma árvore. Essa estimativa é uma média feita a partir de 70 espécies diferentes da Mata Atlântica, como ipê, acácia e araucária. Cada uma dessas árvores vai levar cerca de 40 anos para consertar o estrago, porque, enquanto cresce, a  árvore captura carbono.

Se um caminhão de grande porte percorre 2 000 quilômetros por semana, terá jogado na atmosfera, ao fim de um ano, 94 toneladas de CO2. Esse caminhão deve ao planeta, portanto, 492 árvores por ano. "Até agora só fiz investimentos. Mas o diferencial está dando resultados na imagem. Meus clientes vêem meu selo de carbono zero e ficam curiosos", diz Neto. Ele afirma ter plantado 5 562 árvores nativas na Mata Atlântica no ano passado.

A pedido do cliente
Em 2007, o Grupo Martins, um dos maiores distribuidores atacadistas do país, encomendou caminhões Volkswagen e Iveco e exigiu que as montadoras plantassem árvores para compensar as futuras emissões de carbono daqueles veículos. Da Volkswagen, a Martins comprou 160 caminhões; da Iveco, 183. A Volks plantou 1 900 árvores, enquanto a Iveco plantou 9 000. "Apoiamos a iniciativa do Grupo Martins e imediatamente começamos a desenhar nosso programa de sustentabilidade", disse Marco Mazzu, presidente da Iveco Latin America.

Dessas árvores, 40% foram plantadas próximas à fábrica da Iveco, em Sete Lagoas (MG). A montadora ainda aposta em novas tecnologias, como o desenvolvimento de motores de alto desempenho e de um motor híbrido diesel-elétrico. Já a Volkswagen Caminhões e Ônibus, em parceria com a Fundação SOS Mata Atlântica, plantou 160 000 árvores entre 2005 e 2007 na cidade de Resende (RJ), onde fica a fábrica da montadora. Esses são exemplos válidos de empresas envolvidas com distribuição de carga que se mexerem. Mas o lado das que ainda não fizeram nada é muito maior.

"É um mercado que briga por centavos. Por isso acho que poucas empresas de logística se interessaram até agora pelo assunto do aquecimento global", diz Maciel, da ONG Iniciativa Verde. Quem previu a importância do assunto e saiu na frente parece muito feliz com os resultados.

O alvo das empresas que estampam selos como o carbon free, além de uma óbvia preocupação com o futuro do planeta, é atingir mercados diferenciados. "Eu me preocupo com o planeta", diz José Arnaldo Suaid, publicitário que trabalha em São Paulo. "Sei que as coisas que eu compro no supermercado foram trazidas por caminhões que poluíram o meio ambiente. Se eu sei que uma maçã foi trazida por uma empresa carbon-free, eu vou preferi-la."

Para restaurar as matas ciliares do estado de São Paulo, segundo dados da Iniciativa Verde, seria necessário plantar 1,6 bilhão de árvores, ou seja, um investimento de 20 bilhões de reais. Isso só para replantar o que foi devastado nas margens de rios e nascentes. Menos árvores e mais carbono é uma equação perigosa.

No documentário ganhador do Oscar Uma Verdade Inconveniente, de 2006, o ex-presidente Al Gore afirma que os recordes de temperatura no planeta, uma medição feita desde 1880, aconteceram nos últimos 14 anos.

Reduzir o impacto
Apesar da boa repercussão, a prática de neutralizar o carbono plantando árvores tem seus detratores. Para alguns especialistas, melhor do que neutralizar as emissões é trabalhar para sua redução. "A prioridade ética é a redução das emissões", diz Giovanni Barontini, sócio da Fábrica Éthica Brasil, uma consultoria em sustentabilidade. "Precisamos repensar o consumo para reduzir o impacto."

Para um dos mais ativos ambientalistas ingleses, o comércio de árvores lembra um pouco a venda de indulgências, uma prática da Igreja Católica durante a Idade Média. "Você dá seu dinheiro e seus pecados são cancelados. Isso não funciona assim. Temos de ver cortes na emissão em casa e nas empresas."

Segundo Barontini, os selos de carbono zero não têm valor. "Não existe entidade oficial no mundo que dê selo neutralização de carbono. Quem dá selo são ONGs." Ele critica a falta de vistoria nesses processos. "Os selos são atestados de verdade auto-outorgados e não legitimados pela vistoria de um terceiro independente", afirma.

De qualquer forma, o problema está mais presente do que nunca. Um estudo da ONU sobre as mudanças climáticas revelou que o consumo global de transportes deve aumentar 1,7% ao ano (de acordo com o documento, as emissões do setor de transportes aumentaram 120% desde 1970).

O documento prevê que, se as medidas de controle de emissões não forem colocadas em prática logo, os efeitos mais nefastos do aquecimento global poderão ser sentidos em poucas décadas.

Algumas previsões: o derretimento das calotas polares e a conseqüente elevação do nível dos oceanos; mudanças radicais na agricultura; aumento de furacões e tempestades; o surgimento de novas doenças tropicais; a extinção de espécies de animais e plantas. "O planeta não vai agüentar", diz Barontini. "É preciso agir logo."


PAGANDO OS PECADOS
Quanto de gás carbônico por ano emitem os caminhões - e quantas árvores é preciso plantar para neutralizar as emissões

Pequenos (motores que fazem 4,5 km por litro de diesel)
500 km/semana: 16 toneladas - 84 árvores
1 000 km/semana: 32 toneladas - 168 árvores

Médios (motores que fazem 4 km por litro de diesel)
500 km/semana: 18 toneladas - 94 árvores
1 000 km/semana: 36 toneladas - 189 árvores

Grandes (motores que fazem 3 km por litro de diesel)
500 km/semana: 23,5 toneladas - 123 árvores
1 000 km/semana: 47 toneladas - 246 árvores

Extragrandes (motores que fazem 2,5 km por litro de diesel)
500 km/semana: 29,7 toneladas - 156 árvores
1 000 km/semana: 59,4 toneladas - 312 árvores

Fonte : ONG Iniciativa Verde

(Planeta sustentável, 27/05/2008)



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