O primeiro leilão de madeira ilegal do Brasil foi realizado no dia 15, em Santarém, pelo governo do Pará, através da sua Secretaria de Meio Ambiente. Dois dos três lotes oferecidos, contendo pouco mais de 3,6 mil metros cúbicos de madeira, foram arrematados por duas empresas por 1,3 milhão de reais. A madeira leiloada foi apreendida em ações de fiscalização do Instituto Brasileiro dos Recursos Naturais e Renováveis (Ibama). Dentre várias espécies havia ipê, maçaranduba, tauari, angelim, jatobá e jatuarana.
Os lances superaram em 15 a 20% o preço mínimo definido para o leilão. Foi bom negócio para quem comprou e atendeu a exigência legal feita ao governo pela justiça para autorizar o leilão, seguindo a pauta de valores estabelecida pela Secretaria da Fazenda. Aparentemente, não houve um cartel entre os pretendentes, embora poucos se apresentassem e a disputa tenha sido pequena. Uma das madeireiras vencedoras, a do lote maior, com 3.585 metros cúbicos, era do Rio de Janeiro. Espera ter bom lucro na comercialização em Macaé, onde o preço é bem mais alto do que o que ela pagou. O outro arrematante é de Itaituba, que levou apenas 63 m3. Um terceiro lote, ainda menor, não teve interessado. Vai ser usado em um novo leilão, já marcado para o dia 10 em Anapu, no Xingu.
Foi então uma boa experiência? Diante da alternativa de deixar a madeira apodrecer nos depósitos do Ibama ou ser doada, segundo critérios e formas nunca completamente conhecidos, como vinha acontecendo, não há dúvida que foi melhor. Mas não é solução para o problema da exploração ilegal de madeira na Amazônia. Sempre pode se repetir em relação à madeira procedimento adotado correntemente no Pará décadas atrás para fazer introduzir no Estado carros, perfumes, uísques, sandálias e outros produtos. O próprio contrabandista denunciava a sua carga para que a alfândega a apreendesse e depois a arrematava no leilão, legalizando-a. Claro que esse processo só era adotado no caso de produtos de maior valor e que possibilitassem ao contrabandista ser o único ou o mais poderoso pretendente à arrematação, como os automóveis (ou "cutias", na linguagem da época). Ele tirava uma peça vital do carro, afastando os possíveis concorrentes.
Seria possível reeditar esse método nos leilões de madeira? No primeiro, não houve esse expediente. Mas se as vendas de avolumarem e se amiudarem, a possibilidade poderá começar a se tornar factível. Determinadas empresas ou madeireiros individuais podem se interessar por atrair a apreensão, principalmente se puderem também armar licitações combinadas. Mesmo que o processo for limpo e seguro, a rotina dos leilões provocará o aparecimento de predadores, que se apresentarão nessas vendas. O melhor mesmo é promover o fomento florestal.
O dinheiro arrecadado com o leilão será usado no aparelhamento e na infra-estrutura da secretaria estadual e do Ibama, para fortalecer a recomposição florestal e o combate ao desmatamento no Pará. A questão é a criação de uma dependência desses recursos, que pode ser acentuada pela pouca prioridade de fato que o governo dá à floresta amazônica, colocada de lado a decoração retórica. O governo pode achar que agora não precisa mais destinar ao setor as verbas que são necessárias para montar um serviço florestal à altura da tarefa, com uma guarda florestal de respeito (e que hoje inexiste) e um corpo técnico competente, além de meios materiais para que o Estado realmente assuma o controle da atividade florestal na Amazônia.
Sonho de uma noite de verão? Por enquanto, sim. E os leilões não vão ajudar a tornar esse sonho em realidade.
(Por Lúcio Flávio Pinto *, Adital, 26/05/2008)
* Jornalista