Na semana passada, o senador Mozarildo Cavalcanti (PTB-RR) foi à tribuna do Senado reclamar, pela enésima vez, da demarcação contínua da terra indígena Raposa Serra do Sol. O parlamentar defende a divisão da reserva em "ilhas" e a permanência dos arrozeiros dentro da área. Nessa entrevista ao jornal A Crítica, Mozarildo explica por que é contra a demarcação da reserva de forma contínua; discorre sobre o conflito entre índios e não-índios e faz uma análise nada amigável da atuação da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva.
A Crítica - Há alguma etnia contrária à demarcação contínua da Raposa Serra do Sol?
Mozarildo - Das quatro instituições indígenas lá existentes, somente o Conselho Indigenista de Roraima (CIR), o filhote do Cimi, ligado à Igreja Católica, é favorável à demarcação contínua e as outras três, Sodiur, Alidicir e Arecom, são contrárias.
A Crítica - Por que o senhor é contrário à demarcação das terras indígenas de forma contínua?
Mozarildo - Eu fui presidente da Comissão Temporária Externa do Senado, cujo relator foi o senador Delcídio Amaral. Nós propusemos uma demarcação contínua no que tange os limites externos. Os contornos externos da reserva Raposa Serra do Sol permanecem os mesmos, mas a gente exclui do miolo da reserva as vilas e as pequenas propriedades. Ao invés de demarcar a área indígena em ilhas, está-se demarcando de forma contínua e criando ilhas de não-índios.
A Crítica - Esse tipo de demarcação não acirraria mais os conflitos entre índios e não-índios?
Mozarildo - Pelo contrário. Os conflitos deixariam de existir porque estaria definido que a área "x" seria do pessoal do CIR; as estradas federais, estaduais estariam garantidas e haveria o domínio de uma instituição sobre a área. Os índios da Sodiur teriam sua liberdade como querem.
A Crítica - Qual a sua expectativa em relação à decisão do SFT sobre o tipo de demarcação da Raposa Serra do Sol?
Mozarildo - Qualquer que seja a decisão do STF, a Polícia Federal vai ter que ficar lá permanentemente porque o conflito não é só inter-étnico, mas intra-étnico também. Os índios não aceitam um posicionamento uniforme, muito menos aceitam o comando do Conselho Indigenista de Roraima. O laudo que demarcou a reserva é totalmente falso e quem comprovou isso foi a Justiça Federal de Roraima no inquérito oriundo de uma ação movida pelas pessoas que contestaram a primeira demarcação. Nenhum documento falso pode gerar direitos. Eu não tenho dúvidas que o Supremo vai lidar no nascedouro essa demarcação.
A Crítica - Por que a Assembléia Legislativa de Roraima aprovou uma moção de repúdio contra o ministro da Justiça Tarso Genro e que pode vir a ser persona non grata no Estado?
Mozarildo - Da minha parte já o é. Ele nunca foi a Roraima depois que assumiu para discutir com as partes envolvidas tanto índios quanto não-índios que pensam de maneira diversa; não foi encontrar uma forma que pudesse resolver consensualmente o problema. Agora, no dia em que os índios do CIR invadiram indevidamente uma fazenda (a do prefeito de Pacaraima e um dos principais arrozeiros interessados na demarcação em ilhas) que está sub-judice e foram também indevidamente recebidos da forma que foram, aí ele (Tarso Genro) foi para demonstrar autoridade e prender o prefeito proprietário da fazenda. Ele afronta o Estado de Roraima. Foi lá sem avisar o governador, sem dar satisfação a ninguém, como, se realmente, Roraima não tivesse dono.
A Crítica - O senhor pediu que a moção de repúdio e o título de persona non grata sejam estendidos ao presidente Lula. Por quê?
Mozarildo - Porque você ficar combatendo os empregados e deixando patrão isento da responsabilidade de nada adianta. Quem está fazendo tudo isso é o presidente Lula.
A Crítica - Qual sua opinião sobre a saída da senadora Marina Silva do do Meio Ambiente?
Mozarildo - A ex-ministra Marina Silva pode ter um monte de boas intenções, mas ela tem uma visão acreana da Amazônia. Ela pensa que a Amazônia é igual ao Acre e não é. Tem uma visão de Chico Mendes, de seringueiro. Ela tem uma visão miúda e talibânica da Amazônia porque ela acha que é aquilo e tem que ser, tudo pra fazer média com o esquema internacional.
(Por Antônio Paulo, A Crítica, Amazonia.org.br, 26/05/2008)