Testas franzidas de preocupação com o aquecimento global, mais páginas da Constituição voltadas à defesa do ambiente, mais palavrinhas mágicas como responsabilidade social. A soma resulta na necessidade cada vez maior de profissionais cujo trabalho tenha relação direta com a preservação do solo, do ar e da água, como geólogos, engenheiros e gestores ambientais.
A Petrobras ilustra bem essa tendência. A estatal emprega hoje 1.071 pessoas ligadas à área ambiental, contra apenas 89 em 2003. "Procuramos trabalhar com uma equipe multidisciplinar, pois, desta forma, conseguimos contemplar os múltiplos aspectos ambientais de cada projeto", diz Mônica Linhares, gerente de meio ambiente.
Em seu plano de crescimento, a Vale do Rio Doce coloca a questão ambiental como a mais importante -seja na prevenção seja na redução dos impactos ambientais das operações. "As oportunidades na área serão crescentes na Vale", aposta Luiz Claudio Castro, gerente-geral de licenciamento e tecnologia ambiental.
A crença no aumento da demanda de profissionais do ambiente é compartilhada pelo consultor de recrutamento da Case Consulting, Rodrigo Portela. "O crescimento será impulsionado pela necessidade de as empresas terem uma conduta ambientalmente responsável para a obtenção de investimentos ou empréstimos de outras instituições."
Antes de emprestar dinheiro para uma empresa, o Banco Real checa se as suas práticas são sustentáveis. "Treinamos nossos funcionários para que eles tomem decisões com base na sustentabilidade ambiental, social e econômica", diz Linda Murasawa, superintendente de sustentabilidade da diretoria de comercial e varejo do Real.
Em casos de análises ambientais muito específicas, o banco trabalha com consultorias especializadas.
A consultoria ATA (Ativos Técnicos e Ambientais), por exemplo, é contratada por empresas para cuidar da redução de suas emissões de carbono. "As possibilidades de redução são estudadas considerando aprimoramentos tecnológicos, investimentos, custos operacionais, riscos e receitas", diz Jaime Bunge, sócio da ATA.
Para Fernando Penteado de Castro, sócio da área ambiental do Pinheiro Neto Advogados, o ramo é a vanguarda do direito. "As normas foram ditadas de 30 anos para cá, e as empresas têm dado muita atenção ao tema." Tatiana Dratovsky, também do Pinheiro Neto, completa: "Passamos a prestar assessoria preventiva a muitas empresas no processo de licenciamento necessário à implantação adequada de atividades potencialmente poluidoras".
O advogado ambiental Gabriel Sister, do Tozzini Freire Advogados, se envolveu na área por acaso. Queria desenvolver um estudo ligado ao mercado de capitais para o seu mestrado, em 2005, e descobriu o mercado de créditos de carbono, algo totalmente novo na época. Hoje tem um livro publicado sobre o assunto.
GLOSSÁRIOVeja o que fazem alguns profissionais ligados à proteção do ambienteProfissões novas Engenheiro ambiental: atua na preservação da qualidade da água, do ar e do solo a partir do diagnóstico, manejo, controle e recuperação de ambientes urbanos e rurais
Gestor ambiental: supervisiona setores ligados ao ambiente de empresas, cooperativas e ONGs. Na maioria dos casos, trabalha dentro da empresa
Consultor ambiental: procura soluções ambientalmente corretas e economicamente viáveis para empresas, em um serviço que costuma ser terceirizado
Advogado ambiental: fornece assessoria para o enquadramento e o cumprimento das normas e restrições ambientais e defende empresas de condenações relacionadas ao tema Profissões tradicionais
Ecólogo: avalia impactos da ação humana na natureza e dá orientação para a conservação da biodiversidade
Engenheiro florestal: recupera áreas degradadas com a implantação de florestas e melhora a produção de matéria-prima das florestas nativas e plantadas com técnicas de impacto mínimo no ambiente
Engenheiro químico: trabalha com os processos industriais para checar emissão de poluição e estuda fontes alternativas de energia
Cursos aderem à preservação ambientalPreocupação com o desenvolvimento sustentável leva à criação e à mudança de carreiras Quase duas décadas após a Eco-92, a Conferência das Nações Unidas para o Meio Ambiente e o Desenvolvimento, no Rio, o mercado de trabalho tem dado importância como nunca à preservação. Por isso, agora pode ser a hora certa de prestar vestibular para as chamadas profissões verdes.
Cursos inexistentes há dez anos estão entre os mais procurados. E os que já existiam aumentaram a oferta de vagas. No espírito da Eco-92, foram abertos naquele ano os primeiros cursos de engenharia ambiental do país. Hoje, são 120, em todo o Brasil.
Atuando na prevenção, monitoramento e fiscalização da qualidade do ambiente para empresas e instituições públicas, os engenheiros ambientais se tornaram escassos num mercado que cresceu muito rápido, de acordo com Janete Feijó, coordenadora do curso na Univali, de Santa Catarina.
Outro curso que cresceu é o de engenharia florestal da Unesp. Inaugurado em 1989 com 20 vagas, hoje possui 40. "O curso teve uma melhora qualitativa, com simpósios sobre seqüestro de carbono e sustentabilidade das florestas", conta o seu coordenador, Elias Taylor Durgant Severo.
Segundo dados da Sociedade Brasileira de Engenheiros Florestais, os 13 mil formados na área em todo o país deveriam ser pelos menos o triplo para dar conta da demanda atual.
Praticamente desconhecido em 1998, o curso de gestão ambiental é hoje oferecido em 177 instituições no país -segundo o cadastro das instituições de educação superior do MEC (Ministério da Educação). Na maioria das instituições, ele é oferecido como uma graduação tecnológica, de dois anos. Na USP, dentre outras faculdades, dura quatro anos.
Segundo Arthur Marcien de Souza, diretor do curso na Unisa (Universidade Santo Amaro), esse profissional leva a consciência ambiental para as empresas e diminui o risco e o passivo ambiental delas.
Novo aluno do curso, Rafael Fabre Santos, 23, já é formado em letras e tinha pensado em buscar essa profissão antes mesmo da sua primeira graduação. "O mercado agora está recebendo esse profissional bem melhor. Acho que não será difícil conseguir estágio na área", afirma ele.
Outro curso recente é o de química ambiental, na Unesp. Seu objetivo é formar profissionais para trabalhar no tratamento e na diminuição de resíduos químicos. Entre as novidades, existem ainda os cursos de especialização para monitor de ecoturismo e educador ambiental.
O crescente interesse pelas profissões verdes foi notado até por órgãos voltados à orientação profissional. O Ciee (Centro de Integração Empresa-Escola) passou a organizar, em maio de 2007, uma palestra sobre o tema, apresentada para vestibulandos em sua sede ou nas escolas de ensino médio.
Anna Molinari Portocarrero, 24, é um exemplo de estudante que se interessou pela área ambiental. Depois de ter cursado turismo e fisioterapia, decidiu prestar biologia. "No curso de biologia, vou estudar o que gosto em prol da preservação dos animais e das áreas verdes."
Frase"O curso teve uma melhora qualitativa, com simpósios sobre seqüestro de carbono e sustentabilidade das florestas"
ELIAS TAYLOR DURGANT SEVERO coordenador do curso de engenharia florestal da Unesp
Cursos: os tradicionais também mudaram para atender à demandaCursos já tradicionais também se adaptam para atender à nova demanda. É o caso da engenharia química da Faap, reformulada para dar ênfase à sustentabilidade. Segundo o diretor da faculdade de engenharia, Francisco Paletta, o aquecimento global exige uma mudança na forma como são projetados os equipamentos, para economizar energia. O curso de biologia também mudou. "Antes discutia-se tudo menos a inserção do homem no meio", diz Marcelo Pompêo, professor do departamento de ecologia da USP.
(Folha de S.Paulo,
FGV, 26/05/2008)