O Brasil tem em média uma descoberta de planta angiosperma --que produz flores-- a cada dois dias. E a mata atlântica, apesar de quase extinta, ainda é o lugar onde mais se encontram novas espécies. Na seqüência, está o cerrado e, depois, a floresta amazônica.
Uma tese de doutorado defendida na UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais) mostra que, entre o início de 1990 e o final de 2006, foram registradas 2.875 novas espécies de angiospermas, desde ervas até árvores --o que dá cerca de 170 descrições por ano.
Foram 1.194 na mata atlântica, 966 no cerrado e 582 na Amazônia. A estimativa é que existam entre 40 mil e 60 mil espécies de angiospermas no país. O grupo representa a maioria da espécies vegetais.
Apesar de toda a destruição da mata atlântica --da qual restam apenas 7% de área original preservada-- essa floresta ainda é uma das mais ricas em biodiversidade no mundo. Segundo a Fundação SOS Mata Atlântica, ela detém o recorde de plantas lenhosas por hectare (450 espécies no sul da Bahia), por exemplo.
De acordo com o autor da pesquisa, Marcos Sobral, os dados demonstram principalmente a falta de investimento em pesquisas na Amazônia. "A região amazônica tem uma quantidade muito pequena de descobertas, proporcionalmente, se considerarmos que o bioma ocupa 49% do território. Há um lapso de coleta."
Para seu orientador, João Renato Stehmann, do Departamento de Botânica da UFMG, a "urgência de se descrever" as novas espécies dos nossos biomas "reside no risco de extinção que muitas delas correm", já que várias possuem distribuição geográfica restrita.
Segundo ele, nas regiões Sul e Sudeste já existe uma massa crítica de conhecimento que permite encontrar espécies novas. "Em outras regiões do país há um vazio de taxonomistas [especialistas em classificação de organismos]", diz. "A maioria dos taxonomistas que havia nessas instituições se aposentou e não houve reposição."
Segundo Stehmann, só há dois programas de pós-graduação em botânica na Amazônia.
Taxomomistas em falta
O chefe do Departamento de Botânica da USP (Universidade de São Paulo), José Rubens Pirani, diz que o país não encerrou as etapas de exploração e descobrimento de plantas há muito superadas em países onde os estudos iniciaram há mais tempo e que têm menor diversidade, como os da Europa.
"É verdade que a mata atlântica sofreu extensa devastação, mas nas áreas remanescentes continuam a ser descobertos táxons [categorias] novos regularmente", afirma.
Pirani atualmente descreve três espécies de arvoretas da família da laranja. Uma é do interior da Bahia, e as outras, do Espírito Santo --uma delas é o primeiro registro do gênero Spiranthera na mata atlântica.
"Aparentemente, temos no Brasil muito mais gente trabalhando em sistemática vegetal fora da Amazônia, daí uma razão incontestável para a taxa de descobertas mais baixa naquela vastidão com tanto a explorar", afirma Pirani. Tanto para Sobral quanto para Stehmann, embora a taxonomia no Brasil tenha iniciado no século 19, ainda estamos longe de ter um corpo de pesquisa desejável.
(Por Afra Balazina, Agência Folha, 24/05/2008)