Cientistas chilenos e norte-americanos, trabalhando conjuntamente, desvendaram o comportamento de um líquido essencial para o funcionamento de nossos pulmões. Além das naturais aplicações biomédicas, a descoberta poderá dar novo significado ao nascente campo dos papéis eletrônicos.
Surfatante pulmonar
O surfatante pulmonar é um composto que reduz a tensão superficial dos líquidos nos pulmões, dando-lhes elasticidade, característica essencial ao seu funcionamento. Ele forma uma membrana finíssima, que se encolhe ao extremo e logo depois se expande, seguidamente, seguindo o ritmo da respiração.
Nesse processo, o surfatante não está se comportando como um líquido, mas como uma folha muito fina e flexível. "Quando nós respiramos, o surfatante pulmonar é comprimido nos sacos de ar durante a expiração," explica o pesquisador Luka Pocivavsek. "Ele é comprimido a tal nível que eventualmente ele tem que sofrer uma transição, passando de uma superfície plana para algo que agora é embolado."
Foi esta transição que Luka e a equipe do Dr. Enrique Cerda, da Universidade de Santiago, no Chile, conseguiram compreender com precisão, tanto do ponto de vista teórico, quanto prático.
Bebês prematuros e papel eletrônico
A descoberta terá impacto imediato na fabricação de surfatantes sintéticos para tratamento de deficiências respiratórias, que ocorrem principalmente em bebês prematuros, que não conseguem produzir naturalmente o surfatante pulmonar.
Mas os resultados também poderão ser utilizados na produção de dispositivos eletrônicos totalmente dobráveis, incluindo papéis eletrônicos que, no limite, poderão ser embolados como folha de papel, sem deixarem de funcionar.
Marcas no papel
Quando embolado, um pedaço de papel fica cheio de marcas, mesmo depois que se tenta fazê-lo voltar ao seu formato original de folha. Isso acontece porque não há caminho para que a energia acumulada nessas dobras possa se dissipar. Isso não acontece com uma membrana esticada em um reservatório, onde o fluido irá absorver a energia, evitando a formação das dobras.
Quando um material elástico é comprimido, ele também começa a se enrugar. O estresse se concentra em um determinado ponto, fazendo surgir um sulco ou uma crista. O surfatante pulmonar consegue reverter esse estresse, permitindo que as dobras formadas durante a expiração desapareçam completamente durante a inspiração.
Desamassar sem deixar marcas
Ao compreender os elementos que determinam essa capacidade de desamassar sem deixar marcas, os pesquisadores conseguiram elaborar um material sintético que apresenta as mesmas características. A base do novo material é um composto-chave do próprio surfatante pulmonar, chamado DPPC (dipalmitoilfosfatidilcolina), acrescido de um lipídio iônico.
Mas o caminho agora está aberto para a elaboração de materiais que não precisam ter a mesma composição química, bastando apresentar as mesmas características físicas. "O que fazer se quisermos um papel eletrônico? Construa um polímero compósito que nunca enrugue," diz o pesquisador.
Bibliografia
Stress and Fold Localization in Thin Elastic Membranes
Luka Pocivavsek, Robert Dellsy, Andrew Kern, Sebastián Johnson, Binhua Lin, Ka Yee C. Lee, Enrique Cerda
Science
16 May 2008
Vol.: 320: 912-916
DOI: 10.1126/science.1154069
(Inovação Tecnológica, 20/05/2008)