Consórcio perdedor contesta mudanças feitas em projeto de hidrelétrica no Madeira
Modificações teriam permitido redução de R$ 1 bi no custo da obra e poderiam afetar reservatório de Santo Antônio, da Odebrecht
O leilão da usina de Jirau, vencido anteontem pelo consórcio liderado pela multinacional Suez Energy, deverá ter o resultado contestado. A possibilidade de recurso é analisada pelo consórcio perdedor, liderado pela empreiteira Norberto Odebrecht.
O motivo da contestação são mudanças feitas no projeto da hidrelétrica, no rio Madeira, em Rondônia. A diferença de preço que garantiu a vitória ao consórcio Energia Sustentável do Brasil -liderado pela Suez e que conta com Camargo Corrêa, Eletrosul e Chesf- foi obtida por meio de alterações no projeto, não contempladas na licença prévia concedida pelo Ibama (Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis). As modificações teriam permitido redução de cerca de R$ 1 bilhão nos custos da obra. A construção da hidrelétrica deverá custar cerca de R$ 8,7 bilhões.
As mudanças foram detalhadas pelo consórcio vencedor, a começar pelo deslocamento em 9 km do local da usina hidrelétrica. Em vez da previsão inicial, que localizava o empreendimento na corredeira de Jirau (que dava nome à usina), o consórcio vencedor prevê a construção numa região chamada "Caldeirão do Inferno". Outra mudança prevê uma área de alagamento maior no rio.
Segundo análise preliminar do consórcio Jirau Energia, liderado pela Odebrecht, as mudanças poderão afetar o reservatório da usina de Santo Antônio, a primeira do complexo do rio Madeira, leiloado em dezembro do ano passado. Ganhador do primeiro leilão do Madeira, o consórcio derrotado anteontem apresentou preço mais elevado para a venda da energia a ser produzida em Jirau a partir de 2013. Foram R$ 85,02 por MWh (megawatt-hora) contra os R$ 71,40 por MWh oferecidos pelo grupo Suez para a energia.
Ainda segundo o consórcio derrotado, as mudanças no projeto da usina contrariam o edital do leilão e não contaram com aval oficial da Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica), que conduziu o negócio. A exigência de novo estudo de impacto ambiental poderá comprometer o cronograma do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento).
Procurada ontem, a Aneel informou que o consórcio Energia Sustentável do Brasil não pediu autorização para qualquer tipo de modificação no projeto da usina. Segundo a agência, o consórcio poderá pedir autorização para mudanças. Se isso ocorrer, caberá à Aneel analisar se as modificações feitas afetam a quantidade de energia que a usina poderá gerar e o nível dos reservatórios. O impacto ambiental das mudanças, segundo a Aneel, terá que ser analisado pelo Ibama.
Licença prévia
A licença prévia foi concedida pelo Ibama levando em conta a localização que constava no projeto original. Agora, o Ibama terá que avaliar se a nova localização tem impactos ambientais. Se os impactos forem positivos, a licença está mantida. Se forem negativos, a procuradoria do órgão terá que analisar o que será feito da licença prévia. Ou seja, se ela está válida ou não. Até ontem, o Ibama também não havia sido comunicado oficialmente das mudanças no projeto. O processo de licenciamento das usinas do rio Madeira representou uma das maiores crises na gestão da ex-ministra do Meio Ambiente Marina Silva. A licença só foi dada após alterações no projeto original, para reduzir impactos negativos sobre o ambiente.
Ontem, as entidades que compõem o grupo de trabalho sobre energia do Fórum Brasileiro de ONGs e Movimentos Sociais criticaram a mudança no local de construção da usina de Jirau. Segundo elas, a alteração é ilegal, pois exige a abertura de um novo processo de licenciamento ambiental e a realização de novas audiências públicas de consulta à sociedade.
(Por Marta Salomon e Humberto Medina, Folha de São Paulo, 21/05/2008)