Marina imprimiu uma gestão pontuada por uma visão estratégica do meio ambiente, com foco no desenvolvimento sustentável. Sua saída é uma derrota deste governo, que não consegue enfrentar com rigor e coragem os desafios que têm pela frente
As empresas socialmente responsáveis, que buscam o equilíbrio socioambiental e econômico por meio de uma nova maneira de fazer negócios, devem estar bastante desapontadas com a saída de Marina Silva do Ministério do Meio Ambiente. Desapontadas mas não surpreendidas, porque a ex-ministra teve sempre de enfrentar muitas resistências as suas idéias e precisou comprar muitas brigas por elas, logo Marina, pessoa tão afável e muito mais adepta do consenso do que do confronto.
Os meios de comunicação destacam os reveses que ela sofreu como motivos de sua demissão. Eu quero destacar as vitórias de sua gestão, importantes para o (pouco, mas expressivo) avanço que a questão do desenvolvimento sustentável obteve nesses últimos seis anos no âmbito do Executivo federal.
Marina imprimiu uma gestão pontuada que passava por todo um esforço de melhoria dos quadros técnicos, da legislação e da fiscalização, bem como do enfrentamento das forças interessadas na destruição da floresta.
Dessas realizações, não podemos deixar de destacar a verdadeira revolução que Marina promoveu no Ibama, responsabilizando-o como órgão executor da Política Nacional de Meio Ambiente (PNMA), exercendo atividades de controle e fiscalização de recursos naturais, realizando estudos ambientais, liberando licenças ambientais, embargando obras, propondo e editando medidas ambientais. Ao criar o Instituto Chico Mendes em 2007, deu relevância maior às atividades de apoiar o extrativismo e as populações tradicionais, executar políticas relativas ao uso sustentável dos recursos naturais e incentivar programas de pesquisa e de proteção à biodiversidade, antes a cargo do Ibama. Por isso, nunca na história da entidade, este Instituto teve um papel tão ativo na preservação das nossas imensas riquezas naturais, embora esse papel ainda esteja longe do ideal.
Marina Silva também inovou ao criar o conceito de floresta pública para manejo privado, criando o interesse econômico na floresta em pé, fundamental para segurar o desmatamento. O projeto causa polêmicas e até agora não conseguiu sair do papel. Mas é uma prova de que a ex-ministra e agora senadora pode pensar à frente do seu tempo.
Especificamente para nós, empresários comprometidos com a gestão socialmente responsável como ferramenta de transformação social, a passagem de Marina Silva pelo Ministério do Meio Ambiente representou uma oportunidade única de diálogo de alto nível com foco na solução dos problemas e não no proselitismo político. Por isso, os verdadeiros empresários do agronegócio sabem que perderam uma importante aliada que tem voz nos meios externos e, enquanto esteve à frente da pasta do Meio Ambiente, usou-a para defendê-los, separando o joio do trigo.
Finalmente, mas não por último, a maior vitória de Marina é ter posto a visão do desenvolvimento sustentável na pauta de todas as discussões ministeriais. Por isso, ela deve ter perdido apoio de governo, mas não poderá ser esquecida nem longe do Ministério. A saída dela não é derrota da Marina ou de algo que tenha feito. É derrota deste governo que não consegue enfrentar com rigor e coragem os desafios que têm pela frente.
O maior deles é, sem dúvida, a Amazônia. Como ela destacou em sua carta de demissão, “o que se fizer na Amazônia será o padrão de convivência futura da humanidade com os recursos naturais,a diversidade cultural e o desejo de crescimento...(e) revela potencial de gerar alternativas de resposta inovadora ao desafio de integrar o social, o econômico e o ambiental ao desenvolvimento”.
O Instituto Ethos entende que, a partir de agora, a busca pelo desenvolvimento sustentável deixa de se dar no nível institucional e volta para a sociedade. E espera ter na senadora Marina Silva uma trincheira no Legislativo, dando novamente a este Poder a possibilidade de assumir papel mais relevante no debate sobre desenvolvimento sustentável.
(Por Ricardo Young, Carta Capital, 15/05/2008)