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mst
2008-05-19
Cadernos apreendidos pela Brigada Militar em São Gabriel mostram rotina dos acampamentos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) e como agem os militantes em confrontos

Ao alvorecer do último dia 8, cerca de 800 militantes do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) acampados na fazenda São Paulo 2, em São Gabriel, foram surpreendidos pela chegada de igual número de PMs.

Munidos de ordem judicial, os policiais militares realizaram busca de objetos que poderiam ter sido levados pelos sem-terra durante a invasão promovida dias antes numa fazenda próxima, a Estância do Céu, pertencente a Alfredo Southall e cobiçada pelo MST desde 2003.

Durante a vistoria foram apreendidos facões, foices, facas - definidos pelo MST como objetos de trabalho - e escudos improvisados. O que mais chamou a atenção dos policiais (acabaram sendo entregues ao Ministério Público de São Gabriel para investigação), no entanto, foram quatro cadernos. Preenchidos a caneta, eles se dividem entre diários e atas que relatam o cotidiano dos acampados. São um misto de orientação dos líderes aos militantes e resumo das discussões internas.

A leitura dos cadernos, aos quais Zero Hora teve acesso, mostra que o MST utiliza termos militares para gerenciar os acampamentos, como Brigada de Organicidade e Pelotão de Apoio. No 1º Pelotão do Grupo Gestor, por exemplo, quatro pessoas centralizam a distribuição igualitária de víveres.

Os métodos militares estabelecem a organização de rondas de vigilância, distribuídas em turnos, como num quartel. As rondas incluem crianças, o que será motivo de investigação do Ministério Público. Na vistoria do acampamento da fazenda São Paulo 2, os PMs descobriram entre os sem-terra 28 crianças sem registros e 16 adolescentes sem responsáveis. Um trecho aponta que crianças maiores de 14 anos não estão livres de tirar guarda.

Foram encaminhados também à Polícia Civil e aos promotores públicos cadernos que dão noções de como os acampados podem resistir à desocupação das terras (incluindo menção a bombas e orientações sobre o que falar em momentos delicados) e de como podem driblar a fiscalização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) quando se candidatam a ganhar terra.Confira os principais trechos dos cadernos:

Como arregimentar apoio

Após a invasão das fazendas de Alfredo Southall, a direção do acampamento estabeleceu algumas metas:

"Às 9h o oficial de Justiça vem trazer os papéis... A coordenação desce e a senha é A Southall é nossa.

O que dizer para a imprensa? Estamos num latifúndio que não tem apoiadores!

Que venha um representante do Incra para propor a reforma agrária, de preferência já com terras e local.

As Igrejas têm de cobrar do Ministério Público. Exigir apoiadores e mídia na hora do despejo".

Em outro trecho, orientação sobre como proceder nas cidades vizinhas e sobre a função de doações de alimentos nos bairros próximos dos acampamentos:

"Muito importante o trabalho nos bairros, como doar alimentos, panfletear, para cair rápido nos meios de comunicação".

Respostas padrão

Uma das atas estabelece uma orientação aos acampados sobre como responder ao cadastro do Incra, que vai determinar quem está apto ou não a receber cesta básica alimentar:

"É o cadastro da bóia, não precisa se intimidar...

Tem de dizer que não tem bem familiar, não tem renda porque não trabalha.

Quem não tem documento, dizer que a Brigada roubou.

Se tem passagem na Polícia? Não.

Se já era agricultor? Sim.

O que fazia há cinco anos atrás? Nada, por isso estou aqui...

Tempo de acampamento? Dizer que tem mais de um ano... E assim por diante".

Quem tira guarda

O uso de crianças para fazer guarda nos acampamentos não é rotina, mas acontece. Já o de mulheres é cotidiano, como mostram esses trechos do diário:

"Crianças pegando plantão, 10h às 12h, de 1h30min às 6h".

"... guarda: de menor, não tira guarda, por motivo se o Conselho (Tutelar) chega e vê um de menor na guarda, causa problema..."

"Luana, Paula, Denise e Juliana, quatro horas de guarda hoje".

Controle do insólito

O ímpeto de controle chega até mesmo ao que os acampados devem fazer com os seus animais:

"Foi acordado em assembléia que os cachorros têm que ser amarrados".

Pedras, trincheiras e bombas

Pouco antes do despejo de uma das invasões, novas orientações são anotadas num diário:

"Resistência do cenário: mais pedras, ferros nas trincheiras, alguns pontos estratégicos... cavalo apavora...

Zinco como escudo. Bombas... tem um pessoal que é preparado. Manter a linha.

Retorno do Pelotão 13: fazer trincheira lá atrás. Se protejam atrás, porque o pelotão que tome cuidado, atiram foguete..."

Desavenças e punições

Casos de desavenças ou crimes são tratados por uma comissão disciplinar, que determina o destino daquele que não se adapta:

"... tá roubando galinha. Quem rouba é expulso".

"...os rapazes foram expulsos porque roubaram da Vozinha 15 reais, não gostavam de reunião e não faziam tarefa...".

"...proposta da direção de transferir P. para outro acampamento, porque corre risco de vida. Vai ser transferido, queira ou não".

Divisão de classes

As anotações de uma folha transmitem aos militantes uma divisão social bem clara entre os grandes proprietários de terra e os sem-terra e chegam a traduzir uma desesperança quanto ao rumo da reforma agrária e convoca para a luta:

"Ricos... concentram a terra comprada com o dinheiro do povo. Quem sustenta é a Farsul e o Poder Judiciário.

Pobres... lutamos para que a terra seja partilhada. Para lutar, precisamos nos organizar.

Levando em conta tudo que conversamos, vamos esperar sentados, vamos acreditar nas palavras do Incra, das mil famílias, ou vamos lutar, buscar conquistas? Há disposição".

Lucro com bebidas

Trecho faz uma avaliação do resultado de uma das festas do acampamento:

"Avaliação de domingo, teve bastante lucro com a venda de bebidas. Sobre bagunças, sempre envolvido o Peixe".

Uma invasão

Trecho de um caderno faz uma avaliação de uma invasão de propriedade da família Southall no mês de abril, quando o MST promoveu uma série de ações pelo Brasil:

"Nível está bom. Repercussão da ocupação está boa em sete Estados. Em Pernambuco, 23 ocupações. Oposição da PM. Ação rápida. Muita arma no acampamento. Imprensa".

Escolha de alvos

Líderes, ao pregar o que fazer para organizar o movimento em um momento delicado, sugerem a invasão da sede do Incra:

"O que precisamos fazer?

Fazer uma ocupação no Incra para fazer pressão, para que saia terra. Ou ocupar uma área símbolo. Ficar e não arredar pé.

Quando? Se for possível, amanhã, já".

Medo de flagrante

No dia 29 de abril, a recomendação para evitar prisões na hora em que a BM fosse revistar o acampamento em busca de objetos saqueados:

"Se tiver algo que trouxe da Southall, favor consumir. Senão vai preso em flagrante".

Vandalismo na fazenda invadida

Na Estância do Céu, movimento - que reclama de exageros da polícia - deixou um rastro de depredação

A tensão dominava São Gabriel quando, em 18 de abril, PMs cercaram a Estância do Céu, de propriedade de Alfredo Southall. Queriam a retirada dos militantes do MST, que a ocupavam há quatro dias. Preocupado que não houvesse conflito, o ouvidor-agrário do Estado, Adão Paiani, acompanhou passo a passo as negociações. A desocupação da fazenda foi pacífica.

O choque para Paiani veio depois, quando foi inspecionar a fazenda. Fez isso junto a peritos criminais, apenas meia hora depois da retirada dos militantes do MST. O que encontrou, segundo suas próprias palavras, foram "marcas de vandalismo e atrocidades difíceis de esquecer".

Dentro de um poço de água, outrora potável, boiavam animais. Dois eram gatos, "mortos com vestígios de extrema crueldade", conforme o relatório elaborado por Paiani.

Existiam fezes espalhadas por toda a casa, boa parte da residência estava destelhada, vários livros estavam rasgados e espalhados pelo chão. Janelas foram quebradas. Havia garrafas e vidros espatifados, paredes pichadas, banheiros danificados, defensivos agrícolas derramados. O ouvidor também localizou estacas de madeira e bambu cravadas no solo, com arames de cerca espalhados ao seu redor.

- Vimos ainda botijões de gás para serem utilizados de combustível para atear fogo em caso de invasão da força policial - afirma Paiani, que, entre 190 fotos, registrou também uma botija de 20 litros com óleo diesel e pano para servir de estopim, uma versão gigante do "coquetel molotov".


Polícia investiga ação de milícias

Milícia costuma ser o termo utilizado pelo MST para definir jagunços bancados por fazendeiros para hostilizar os sem-terra. A Polícia Civil gaúcha, no entanto, tem recebido denúncias da possível existência de uma milícia ligada ao próprio MST. Tramitam em delegacias do Estado 19 inquéritos e ocorrências policiais relatando invasões de terra que foram antecedidas por um esquadrão precursor armado, que se encarrega de atemorizar os proprietários, antes do ingresso nas fazendas das famílias de sem-terra. Pelo menos 11 desses relatos falam que os invasores portavam armas de fogo: em Tupanciretã, Júlio de Castilhos (duas vezes), Coqueiros do Sul (duas vezes), Cruz Alta, Santana do Livramento, São Borja (duas vezes), Eldorado do Sul e São Jerônimo.

Em 6 de outubro de 2003, um casal de fazendeiros de Júlio de Castilhos disse que toda sua família foi mantida refém durante cinco horas por um grupo que se identificou como sendo do MST. Eles portavam revólveres e espingardas. Horas depois, a propriedade foi invadida por sem-terra.

Em abril de 2002, em São Jerônimo, os caseiros de uma fazenda relataram que integrantes do MST, armados, eram os precursores da invasão realizada por 350 sem-terra naquela manhã. Um ano antes, em Jóia, membros de uma milícia formada por colonos sem-terra foram presos por suposto envolvimento na morte do agricultor Pedro Milton da Luz Pedroso, 49 anos.

Sem-terra dizem que BM agrediu

Por duas ocasiões, o MST e os deputados que os apóiam denunciaram este ano agressões que os sem-terra teriam sofrido por parte da Brigada Militar.

A primeira queixa se refere à desocupação de uma área de plantio de eucaliptos pertencente à empresa Stora Enso, em Rosário do Sul. Em 6 de março ela foi invadida por uma espécie de "ala feminina" do MST, as mulheres ligadas à Via Campesina. Para retirar as 900 mulheres, a BM usou balas de borracha. Conforme relato dos deputados estaduais Dionilso Marcon (PT) e Stela Farias (PT), mais de 50 mulheres ficaram feridas por tiros e golpes de cassetete. Os parlamentares pediram a exoneração do subcomandante da BM, coronel Paulo Roberto Mendes.

O segundo episódio de violência denunciado é a revista feita pela BM no acampamento do MST na fazenda São Paulo 2, em São Gabriel, em 8 de maio. A revista durou sete horas, parte das quais os sem-terra tiveram de permanecer sentados e com as mãos na cabeça. Eles também se queixaram de que seus barracos foram rasgados. O deputado federal Adão Pretto (PT) comparou as cenas a "um campo de concentração" .

(Zero Hora, 18/05/2008)


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