O ministro da Justiça, Tarso Genro, classificou nesta quarta-feira (14/05) como terroristas as ações de resistência à retirada, pela Polícia Federal, de não-indígenas da reserva Raposa do Sol, em Roraima. Ele disse que a localização da reserva em uma área de fronteira não ameaça a soberania nacional, e que o processo de demarcação obedeceu a todos os preceitos constitucionais. As afirmações, feitas em audiência pública das comissões de Relações Exteriores e Defesa Nacional; e da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional, provocaram reações exaltadas de parlamentares.
Tarso Genro disse que a decisão sobre o tamanho da reserva, no entanto, será do Supremo Tribunal Federal (STF), e que a execução vai exigir negociações com ambos os lados. Ele lembrou que o governo defende a demarcação contínua. "Temos que nos preparar, no entanto, pois seja qual for a decisão do Supremo precisaremos de uma estratégia para a sua execução. Seja qual for, vai ser uma execução complexa. Vamos ter de negociar como aplicar a decisão que o STF vai adotar", ponderou.
O ministro lamentou que a negociação conduzida com os arrozeiros há três anos, quando houve a homologação da reserva, tenha sido infrutífera e resultado em formas ilegais de resistência, com "atitudes terroristas", como a destruição de pontes e o ataque a indígenas com armas de fogo e bombas. Por outro lado, ele garantiu que todos os movimentos da Polícia Federal e da Força Nacional de Segurança para a retirada dos produtores estão suspensos até que saia a decisão do STF.
Divergências
A demarcação contínua da área de 1,5 milhão de hectares foi o principal ponto de divergência nos debates. Produtores da região e alguns parlamentares defenderam a demarcação isolada, o que viabilizaria a permanência de agricultores na área. As divergências tornaram a região palco de intensos conflitos entre indígenas e produtores de arroz nas últimas semanas.
O deputado Urzeni Rocha (PSDB-RR) criticou a declaração de Tarso Genro de que os arrozeiros tiveram "atitudes terroristas", e pediu que o ministro aponte os supostos terroristas.
Localizada na fronteira do Brasil com a Venezuela e a Guiana, a reserva indígena Raposa Serra do Sol, de 1,5 milhão de hectares, foi homologada por decreto presidencial em 2005 e é contestada em ação civil pública no STF.
Decisão equivocada
O governador de Roraima, José de Anchieta Júnior, classificou como equivocada a demarcação contínua da reserva e sugeriu que ela seja estabelecida em áreas não contínuas. O governador considera que, dessa forma, não haveria prejuízos nem para os índios nem para os produtores de arroz.
Ele disse esperar que a decisão do STF saia até o início do junho, e afirmou que o julgamento terá reflexos em todo o País: "O caso da Raposa Serra do Sol, especificamente, é um problema do estado. Mas, sem sombra de dúvida, essa discussão vai ancorar a política indigenista. A decisão do STF vai ser um balizador para a revisão das reservas já existentes e das possíveis reservas propostas."
O governador criticou o fato de o Executivo federal demarcar áreas e depois se ausentar, deixando a responsabilidade nas mãos do governo estadual. Segundo ele, quem recupera as estradas e pontes nas áreas indígenas é o governo do estado, não a Funai. Ele também disse que, das 406 escolas estaduais em Roraima, 200 são indígenas.
Comissão de negociação
O deputado Fernando Gabeira (PV-RJ) propôs a criação de uma comissão da Câmara para negociar a pacificação da Raposa Serra do Sol. Ele disse que, independentemente da posição do STF, será necessária uma negociação política para garantir uma solução pacífica.
O debate sobre o tema será retomado pelas Comissões de Relações Exteriores e da Amazônia no próximo dia 28, com as presenças dos ministros da Defesa, Nelson Jobim, e da Secretaria de Ações de Longo Prazo, Mangabeira Unger.
(Por Mônica Montenegro, Agência Câmara, 14/05/2008)