Representantes dos agricultores familiares entregaram na tarde desta quarta-feira (14) o Programa PAC Mais Alimentos ao chefe da Casa Civil, Cézar Busatto, e ao chefe de gabinete da governadora, José Carlos Breda. Eles se comprometeram em agendar um encontro com a governadora Yeda Crusius para tratar especificamente do assunto. O programa envolve 14 propostas para estruturar a produção de alimentos baseada na agricultura familiar. Entre elas estão a implantação de política de renda, política de habitação, seguro agrícola, crédito e abastecimento. Os agricultores familiares também defendem a construção de silos comunitários para ter autonomia na comercialização de seus produtos. Para se ter uma idéia, uma saca de feijão vendida por eles ao preço de R$ 40 no período da safra, chega a ser comercializada por R$ 200 em outras épocas do ano.
Os agricultores familiares chegaram à capital gaúcha na manhã desta quarta-feira. A situação tornou-se urgente porque um decreto da governadora, que entrará em vigor no dia 1º de junho, aumenta em 10% o preço das máquinas e equipamentos, das sementes, das ferramentas, dos insumos e dos fertilizantes, entre outros. Liderados pela Federação dos Trabalhadores na Agricultura Familiar (Fetraf-sul), 600 agricultores familiares vieram das regiões do Alto Uruguai, Altos da Serra, Sarandi, Celeiro Serra e Vale do Rio Pardo. Outros 450 bloquearam a BR 392, nas proximidades de Pelotas, a fim de chamar a atenção das autoridades para o mesmo problema.
Por volta das 7h desta quarta-feira, os manifestantes protestaram em frente à multinacional Yara, antiga Adubos Trevo. Constrangido por policiais, um agricultor passou mal e foi levado ao HPS de Canoas. A situação ficou tensa entre BM e agricultores familiares. De lá, os ativistas rumaram para o Parque da Harmonia, às margens do Rio Guaíba, e depois caminharam até a Praça da Matriz, onde protestaram enquanto aguardavam o retorno da audiência de seus representantes com o governo. “Fortalecer, organizar, viva a agricultura familiar”, repetiam em coro, agitando as bandeiras da Fetraf-sul e da CUT/RS.
No documento, eles oferecem propostas concretas à governadora para sair da crise estrutural do setor em função do aumento dos preços dos insumos. A elevação decorre de um modelo agrícola mundial esgotado, evidenciado na falta de alimentos nos mais diversos rincões do planeta. Cerca de 60% dos alimentos consumidos pela população são produzidos pela agricultura familiar. Sem auxílio e fragilizados, estes agricultores familiares querem que o governo crie um modelo diferenciado para o setor.
Concomitantemente, em Brasília, o deputado Ivar Pavan (PT) apresentou as propostas da audiência pública realizada na terça-feira (13) na Assembléia sobre o tema. As sugestões apontadas são para enfrentar a crise dos altos preços dos alimentos no mundo e no Brasil. Também foi aprovada, nesta audiência, a sugestão para que o governo federal crie um Programa de Produção de Alimentos, um PAC Mais Alimentos, tendo como base produtiva a agricultura familiar. O programa terá como prioridade as culturas de milho, trigo, arroz, feijão, mandioca, tubérculos, hortifrutigranjeiros e leite, destinados prioritariamente ao mercado interno.
"O modelo de agricultura utilizado nas últimas três décadas, baseado na liberdade do mercado, na monocultura, sem a intervenção do Estado, gerou a crise que vivemos neste momento", observa Pavan. Ele disse que a escassez de alimentos e, por decorrência, a disparada dos preços, deve-se também à dependência do petróleo, que é a matéria-prima de boa parte dos fertilizantes, aliada ao monopólio de sementes e dos insumos, que encarece os adubos devido à prática de lucros abusivos. "A crise de insumos é conseqüência do modelo agrícola dependente do petróleo", resume.
Entre as propostas sugeridas no PAC Mais Alimentos estão:
-Ampliação dos recursos para o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), aplicando os valores de R$ 1 bilhão em 2008, R$ 2 bilhões em 2009 e R$ 3 bilhões em 2010 na forma de doação simultânea, formação de estoques, sendo que 50% dos recursos sejam aplicados na merenda escolar.
-Programa federal específico que estimule e compense os agricultores familiares que preservam áreas de proteção ambiental e reservas legais.
-Aumento dos valores do Pronaf para: R$ 13 bilhões em 2008; R$ 14 bilhões em 2009 e R$ 15 bilhões em 2010.
-Financiamento para assistência técnica, aplicando R$ 1 bilhão por ano até 2010.
-Seguro agrícola com cobertura dos custos de custeio e investimento feitos na produção.
-Criação de um programa de infra-estrutura de armazenamento e infra-estrutura produtiva.
-Criação de um programa nacional de habitação rural que leve em consideração as diferentes realidades regionais, viabilizando a construção de 300 mil casas em três anos.
-Reestruturação da grade curricular, especialmente do ensino médio e superior, nas regiões de predominância agrícola para valorizar a atividade rural e preparar os filhos de agricultores familiares a permanecerem na atividade agrícola.
-Implementação de um programa massivo de formação profissional para os agricultores familiares.
-Orientação das organizações de pesquisa na perspectiva da produção de alimentos.
-Mudança imediata dos índices de produtividade para fins de reforma agrária, regulamentação da compra de áreas por empresas estrangeiras no Brasil.
-Enfrentamento imediato aos altos preços dos insumos agrícolas.
-Controle do Estado sobre os preços de comercialização de insumos agrícolas para coibir os abusos cometidos pelas empresas.
-Lutar pelo fim dos subsídios agrícolas dados pelos países ricos aos produtos colocados no mercado internacional.
-Criar política de auto-suficiência da produção de trigo no Brasil, considerando que o país possui terra, clima, tecnologia e estrutura produtiva durante o período de inverno.
-Subsidiar e proteger a produção de alimentos oriundos da agricultura familiar, destinados ao abastecimento do mercado interno.
-Apoiar a iniciativa da Assembléia Legislativa do RS para a criação da CPI dos insumos e fertilizantes.
-Redução da carga tributária sobre os fertilizantes para a agricultura familiar e destinada à produção de alimentos.
-Eliminação da tarifa para a Marinha Mercante nas importações de insumos agrícolas.
-Maior intervenção da Petrobras na produção de fertilizantes para a produção Brasileira, incluindo o xisto agrícola (matéria prima do adubo).
(Por Stella Máris Valenzuela, Agência de Notícias AL-RS, 14/05/2008)