A ministra Marina Silva, à frente do Ministério do Meio Ambiente por cinco anos, enviou sua carta de demissão ontem, 13/5, ao Palácio do Planalto. As razões alegadas por ela foram as dificuldades e resistências encontradas para levar adiante a agenda ambiental federal. O movimento ambientalista lamenta sua saída. Seu substituto será o secretário estadual de Meio Ambiente do Rio e Janeiro, Carlos Minc.
Tensões acumuladas, dificuldades e resistências em relação às obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) foram alguns dos motivos que levaram a ministra a deixar o cargo ao fim de cinco anos. A indicação da acreana Marina Silva para o Ministério do Meio Ambiente, no final de 2002, foi o primeiro anúncio que o Presidente Lula fez na formação do ministério de seu primeiro mandato. A notícia divulgada em Washington, durante viagem de Lula aos Estados Unidos, foi muito bem recebida pelo movimento ambientalista brasileiro, encarada como sinal de novos tempos para o ambientalismo. Afinal, era longa sua trajetória de atuação em defesa da conservação, preservação e da sociodiversidade do país.
Ex-seringueira, companheira de luta de Chico Mendes, assassinado em 1988, Marina Silva, foi e continua a ser uma incansável batalhadora pelo desenvolvimento de modelos de sustentabilidade para o Brasil. Eleita no final de 1994, aos 34 anos, foi a senadora mais jovem da história da República. Foi reeleita em 2002 para mais um mandato. Agora, Marina Silva reassumirá sua cadeira no Senado. Leia abaixo a carta de Marina ao Presidente Lula.
Com sua equipe, elaborou o plano nacional de áreas protegidas que reconhece as Terras Indígenas e as Terras de Quilombo como áreas importantes para a conservação. Recentemente, ela intercedeu em favor da manutenção da demarcação em área contínua da Terra Indígena Raposa-Serra do Sol, palco de recentes embates entre índios e arrozeiros que não querem deixar as terras que ocuparam ilegalmente.
Também em sua gestão foi criado o plano de combate e prevenção ao desmatamento na Amazônia e o monitoramento do desmatamento tornou-se mais ágil, com a entrada em cena do sistema Deter que veio somar esforços com o Prodes. Logo em seguida ao assassinato da missionária Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, por pistoleiros a mando de fazendeiros da região de Anapu, na Terra do Meio (PA), Marina Silva e sua equipe criaram um mosaico de áreas protegidas nesta região amazônica, na tentativa de combater a grilagem e o desmatamento desordenado. Na época, o MMA criou pouco mais de 5 milhões de áreas protegidas, e interditou 8 milhões de hectares para estudos. Durante sua gestão, o governo Lula criou quase 24 milhões de hectares em áreas protegidas.
Surpresa
Ontem muitos se perguntavam porque Marina Silva deixou o governo. A notícia pegou de surpresa até auxiliares da ministra. A carta foi entregue ao Planalto e notícia divulgada, tornando a saída um fato consumado antes mesmo de o Presidente Lula se pronunciar. De acordo com a imprensa, Lula reagiu irritado ao modo como o pedido de demissão foi feito. Entretanto, ele conhece muito bem os fatos e razões que compõem o caldo que entornou na última quinta-feira (8/5) com o lançamento do Plano Amazônia Sustentável (PAS), apresentado na ocasião como uma iniciativa associada ao “PAC da Amazônia”.
Para o lançamento, o Ministério do Meio Ambiente preparou um pacote de medidas positivas para fomentar o manejo e a recuperação de áreas degradadas e desmatadas na Amazônia, mas elas sequer foram apresentadas na solenidade. Lula anunciou o ministro de Ações de Longo Prazo, Roberto Mangabeira Unger, como coordenador do Comitê Gestor do PAS. Especula-se que a escolha representou o atendimento de uma demanda do governador do Mato Grosso, Blairo Maggi.
Também a esperada decretação da Resex Médio Xingu, que estava pronta para ser assinada por Lula, saiu da pauta horas antes do lançamento do PAS. Durante sua gestão, porém, Marina Silva teve de amargar outras derrotas entre as muitas batalhas travadas. Uma delas foi a aprovação do PL da Biossegurança, aprovado pelo Senado em 2005, liberando o plantio dos transgênicos.
Mas sua postura firme e combativa consistia num foco de resistência à leniência com que setores do governo lidam com questões como desmatamento e licenciamento ambiental, mantendo suas preocupações com a questão ambiental apenas no discurso. As manifestações de satisfação com a saída da ministra por parte de alguns representantes do setor rural descompromissados com a sustentabilidade do País, demonstra que as políticas do MMA estavam acertando o alvo.
A justificativa dada por Marina Silva em sua carta de demissão torna o desafio de seu sucessor ainda maior. Ela construiu uma forte legitimidade como interlocutora em instâncias decisórias antes inalcançáveis para a pasta do Meio Ambiente. Apesar das derrotas sofridas, colocou a discussão sobre a questão ambiental em outro patamar no âmbito governamental.
O governo perde com a saída de Marina Silva. Por outro lado, ganha o Senado Federal, onde ela poderá assumir uma nova missão: inserir de modo irreversível a questão da sustentabilidade nas decisões da Casa e pressionar o governo, agora do lado de fora e com a sociedade civil, para manter a pauta positiva que conseguiu implantar em sua gestão à frente do MMA. Por tudo isso, muitos lhe são gratos e dizem que devem a ela a sua vida, como o sr. Herculano Porto, morador da Resex Riozinho do Anfrísio, na Terra do Meio, no Pará.(veja seu breve depoimento abaixo).
Um abraço para a ministra
O sr. Herculano Porto, ex-presidente da Resex do Riozinho do Anfrísio, chegou em Altamira hoje, 14/5, pela manhã, para falar com Marcelo Salazar, assessor do Programa Xingu do ISA. Com os olhos marejados ele comentou a saída da ministra. Como bom contador de histórias que é, lembrou de conversas que teve com ela durante o processo de criação da Resex Riozinho do Anfrísio em Brasília, depois falou da morte de irmã Dorothy e da cerimônia de entrega do prêmio Chico Mendes.
"Na minha opinião ela não saía nunca. Ela conhecia nossa realidade do trabalho de seringa. Fiquei muito sentido com a notícia. Na minha opinião ela tinha um grande carinho com todas as pessoa, não só comigo, com toda a população ribeirinha". Eu mesmo, Herculano, devo minha vida a ela pela segurança que ela nos deu, colocando o exercito lá durante 10 meses e agora os grileiros foram embora e nós podemos trabalhar tranquilos, como nós vivia antes. Tenho um grande carinho por ela, mando um abraço e desejo o melhor para ela. E espero a visita dela na reserva mesmo ela não sendo mais ministra”.
(ISA, 14/05/2008)