"Agora o rei está nu", diz diretor do Greenpeace; "área ambiental não tem espaço no atual governo", afirma secretária-geral do WWFPara Roberto Smeraldi, a demissão da ministra põe fim à "ambigüidade" entre o discurso ambiental e a prática real do governo Lula
Ambientalistas receberam com preocupação a notícia da demissão de Marina Silva e apontaram que o governo Lula fica com sua imagem doméstica e internacional arranhada. "Agora o rei está nu, a roupa verde do presidente foi levada", diz Frank Guggenheim, diretor do Greenpeace. "Trata-se de uma clara demonstração de que a área ambiental não tem espaço no atual governo", afirma Denise Hamú, secretária-geral do WWF. "Não bastassem as implicações dessa decisão, o pedido de demissão de Marina Silva terá uma repercussão muito negativa para o Brasil no exterior", afirmou.
O primeiro mal-estar internacional tem data para acontecer: na próxima segunda-feira começa na Alemanha a reunião da Conferência da Diversidade Biológica das Nações Unidas, na qual o Brasil apresentaria resultados de suas políticas contra o desmatamento. A presidente do evento é Marina.
As ONGs, que tinham em Marina sua maior interlocutora, são unânimes em apontar o desgaste progressivo entre a ministra e outros setores do governo como razão para a saída. Segundo Guggenheim, Marina "nunca conseguiu implementar a sua visão de que o ambiente era uma questão de todos os ministérios". "Fato é que o ambiente na visão deste governo é um entrave ao progresso, uma pedra no caminho." "A ministra tentou mostrar para os seus colegas de ministério que, para o Brasil ser moderno, ele precisava integrar a dimensão ambiental ao seu desenvolvimento. Mas os seus colegas, que pensam o desenvolvimento somente em uma dimensão (econômica), não foram capazes de aproveitar os conselhos dela", disse José Maria Cardoso da Silva, da Conservação Internacional. "Perdem o governo Lula e o Brasil."
Fim da ambigüidadePara Roberto Smeraldi, diretor da Amigos da Terra - Amazônia Brasileira, a saída de Marina põe fim à "ambigüidade" entre o discurso do governo Lula, preocupado com a questão ambiental, e suas práticas.
"Não é que ela fosse um obstáculo a nada", disse Smeraldi à Folha. "A rigor, Marina fez tudo que lhe foi solicitado. Foi de lealdade incondicional ao governo, inclusive para passar por cima da lei quando necessário. E tinha uma credibilidade ambiental inigualável", afirmou. Smeraldi atribui a saída da ministra ao "acúmulo progressivo de passivos em seu currículo", mas principalmente à frustração com a falta de ressonância que a política de "transversalidade" da ministra encontrou no resto da Esplanada.
O próprio PAS (Plano Amazônia Sustentável) tem exemplos disso: primeiro, dá ênfase quase exclusiva a obras do PAC. "As únicas unidades de conservação que foram anunciadas foram justamente três que permitiriam [asfaltar] a BR-319, uma típica decisão de PAC", diz Smeraldi. "O Meio Ambiente tinha preparada a criação de unidades de conservação no Pará que poderiam atrapalhar a construção de mais reservatórios para [a hidrelétrica de] Belo Monte", e elas não saíram.
A antropóloga Mary Allegretti, que foi secretária de Coordenação da Amazônia do Ministério do Meio Ambiente durante parte do governo FHC e deixou o posto em 2003, avalia que Marina deveria ter saído antes do ministério, quando seu desgaste era menor. Segundo Allegretti, todas as vezes que Lula se manifestou sobre Amazônia foi para desqualificar o que Marina estava fazendo. "Na minha visão, o erro da gestão da Marina foi dar peso excessivo à fiscalização e dar pouco incentivo ao desenvolvimento sustentável. Isso coloca os segmentos produtivos da Amazônia contra o Meio Ambiente."
(Folha de S.Paulo,
Amazonia.org.br, 15/05/2008)