Depois de duas longas reuniões com lideranças das comunidades Jawari e São Francisco, agentes da Polícia Federal e da Funai (Fundação Nacional do Índio) deixaram a reserva indígena Raposa/Serra do Sol, em Roraima. A decisão faz parte de um acordo selado com os índios, que prometem retirar os bloqueios montados na RR-319.
O acordo atende a um pedido do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Carlos Ayres Britto, relator das ações que contestam a demarcação da área.
"O ministro pediu ao meu diretor-geral que viéssemos providenciar o desbloqueio da estrada até que o STF possa decidir sobre a questão. Expliquei a eles [índios] que, até que se decida, o direito constitucional de ir e vir tem que ser respeitado. O trânsito será restabelecido", afirmou o superintendente da PF em Roraima, José Maria Fonseca.
O delegado foi de helicóptero à reserva, conduziu pessoalmente as negociações e informou aos índios que poderia haver uma decisão judicial determinando a liberação da estrada com uso de força.
O bloqueio teve início na última segunda-feira (5) e, durante semana, a PF chegou fazer um primeiro acordo, pelo qual a estrada ficou liberada por apenas 24 horas.
O motivo alegado pelos índios para a obstrução, conforme o delegado, era o temor de que arrozeiros estivessem levando para a reserva armas e pessoas para agredi-los. " Dissemos aos índios que temos equipes avançadas para fazer esse monitoramento e pedimos que nos avisem em caso de qualquer suspeita'', disse Fonseca.
A Funai ficou encarregada de providenciar equipamentos de comunicação para que os índios informem as autoridades sobre problemas que possam ocorrer na reserva. Os tuxauas das duas comunidades visitadas pela PF não permitiram que a equipe da Agência Brasil acompanhasse de perto as reuniões. Mas, na Comunidade São Francisco, foi possível ouvir, mesmo à distância, trechos da negociação.
"Fizemos o bloqueio para chamar atenção e conversar olho no olho. Temos preocupação de não saber a decisão do STF", disse um dos líderes, que em seguida fez acusações contra os arrozeiros: "É um povo que não tem respeito com a natureza e com os nossos próprios animais. Sabemos que o bloqueio é contra a lei, mas precisamos fazer".
O superintendente argumentou com os índios que a tensão provocada pelo bloqueio seria prejudicial à própria imagem deles e ressaltou que os arrozeiros estariam dispostos a deixar a reserva pacificamente se o STF assim decidir. "Mas eles [arrozeiros] devem ter condições para retirar as coisas deles", ressalvou.
Fonseca também reiterou em diversos momentos que a função da PF na região é cumprir a lei e zelar pela manutenção da paz. "Nós não estamos favorecendo lado nenhum e vamos fazer cumprir a decisão judicial", afirmou o superintendente.
O coordenador do CIR (Conselho Indígena de Roraima), Jaci José de Souza, explicou o porquê de as comunidades terem aceitado acabar com o bloqueio e esperar a decisão do STF: "A terra já está homologada, registrada em área contínua. A comunidade grita para que não afrouxe e esperamos uma decisão do Supremo nesse sentido. Vamos esperar, mas se demorar muito tempo também não dá."
As ações que contestam a demarcação da reserva em área contínua podem ser julgadas ainda este mês no STF.
No fim da tarde de domingo (11), funcionários de arrozeiros já preparavam suas carretas, paradas na RR-319, para buscar nas fazendas milhares de sacas do produto e levar materiais usados em lavouras. Na propriedade do arrozeiro Ivo Barili havia arroz colhido amontoado na terra, à espera dos procedimentos para a retirada.
(Folha Online, 12/05/2008)