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smam plano diretor de porto alegre
2008-05-08
Entusiasmado com o que caracteriza hoje como "uma secretaria bem estruturada", o ex-titular da Secretaria do Meio Ambiente de Porto Alegre (Smam), Beto Moesch, retomou suas funções como vereador há pouco mais de um mês. Em busca de um novo mandato na Câmara de Vereadores, Moesch falou no último dia 30 de abril, ao AmbienteJÁ, sobre sua experiência no Executivo municipal. Após enfrentar momentos polêmicos, como um conflito com indígenas no Morro do Osso, no primeiro ano de sua pasta, e uma disputa pela melhoria da qualidade de vida dos moradores do entorno do Parque Farroupilha, atormentados pelo som no Café do Lago, que acabou tendo um desfecho favorável ao empreendedor, Moesch lançou uma crítica à sociedade porto-alegrense: "Ela não está optando pelo meio ambiente, sabia?" Mas também admitiu: "O porto-alegrense tem uma história ecológica riquíssima, é uma parcela significativa da sociedade, mas que não é ainda, talvez, a maioria". Em muitos momentos da entrevista, foi difícil distinguir o agora vereador do ex-secretário:

AmbienteJÁ – Como o Sr. avalia a situação da Secretaria Municipal do Meio Ambiente (Smam) antes e após a sua gestão como secretário, quais os principais desafios que o Sr enfrentou?
Moesch – Bem, primeiro uma secretaria totalmente quebrada, sucateada. Sem estrutura nenhuma, carros quebrados, insuficientes. Uma secretaria desunida, com equipes que nem se comunicavam, enfim, uma secretaria – todos sabem – periférica. A Smam era o patinho feio, não era uma secretaria central. Hoje nós temos uma secretaria muito bem estruturada, informatizada. Antes não tinha quase computadores, era uma disputa. Hoje todas as equipes têm computadores. Estamos informatizando as licenças ambientais. Carros, motoristas. Então não atrasa mais vistoria. Capacitação. Todos com curso de capacitação, inclusive fora do Estado são feitos. Com relação a praças e parques, operários até semi-analfabetos que foram alfabetizados. Não havia equipamento de segurança, se trabalhava com chinelo de dedos. Hoje, todos com botas. Não tinha equipamento de combate a incêndio. Hoje tem. Tudo conveniado com Ibama, Brigada Militar. A Smam fez cursos de capacitação junto com o Ibama. Nós não fizemos nada sozinhos. Sempre buscamos convênios para aprimorar.

AmbienteJÁ – Qual a causa desse desleixo que o Sr. descreveu quanto à secretaria, na época em que a assumiu?
Moesch – Eu acho que a cidade é que tem que buscar esta resposta. Eu sou suspeito de falar. Estou só dando dados, aqui, de uma secretaria sucateada, uma secretaria que não tinha mais sequer... em que não se confiava nas licenças ambientais. Não eram licenças confiáveis. Tanto que eram várias anuladas em juízo.

AmbienteJÁ – Por exemplo...
Moesch – Nós não tivemos, em três anos e três meses, uma licença ambiental sequer contestada em juízo. É o único caso no Brasil. Então nós padronizamos as licenças ambientais. As condicionantes são iguais para o mesmo empreendimento. Não muda. Elas são padronizadas. Por isto agora a informatização. Enfim, então, hoje é uma secretaria que todos conhecem, todos sabem que existe. Todos sabem que ela é central, nada se faz na cidade sem passar pela Smam, como tem que ser, porque ela é mais do que uma secretaria. A Smam é uma secretaria e é o órgão ambiental de Porto Alegre. Portanto, ela é o Ibama e a Fepam no território de Porto Alegre. Então ela tem que ter independência e autonomia, porque senão ela perde a legitimidade para licenciar empreendimentos da própria prefeitura, por exemplo. Porque quem é o maior empreendedor da cidade? É a própria prefeitura. Quem licencia esses empreendimentos? É a Smam como órgão ambiental e não como secretaria da prefeitura. Isso foi difícil de mostrar para a própria prefeitura. E aí o prefeito Fogaça deixou claro: "Não quero mais obras sem licença ambiental".

AmbienteJÁ – Como se conseguiu instrumentalizar a Smam e ter recursos para fazer essas mudanças que o Sr mencionou?
Moesch – Aí é saber entender o que vem a ser o Sistema Nacional do Meio Ambiente. Nós passamos a ser muito rigorosos. Licenças ambientais com rigor, exigindo monitoramento, exigindo preservação, exigindo mitigação, exigindo contrapartida e compensação.

AmbienteJÁ – Os recursos de compensações ambientais ajudaram a aparatar a Smam?
Moesch – Não, nós não admitimos. Isto é uma coisa que nós mudamos também. Eu não admito que uma compensação ambiental venha para estruturar o órgão. Isso tem que vir do orçamento, que continua baixo.

AmbienteJÁ – Quanto é o orçamento da Smam?
Moesch – Dá 1,6% do total do orçamento [do município].

AmbienteJÁ – Para termos uma referência, esse orçamento é muito diferente do de outras secretarias de Porto Alegre?
Moesch – Vou dar um exemplo. A Smov [Secretaria Municipal de Obras e Viação] tem R$ 40 milhões por ano para investimento e custeio, e a Smam tem R$ 6 milhões. Isso é histórico. Sempre foi assim.

AmbienteJÁ – Mas a Smov está no topo da lista no orçamento municipal?
Moesch – É uma das... o Dmae [Departamento Municipal de Água e Esgoto] tem quase R$ 300 milhões por ano.

AmbienteJÁ – É muita diferença...
Moesch – Mas isso aí é a cidade... ela tem que optar. Ela não está optando pelo meio ambiente, sabia? Não há demanda por meio ambiente no OP [Orçamento Participativo]. Não existe demanda para meio ambiente no OP. Então a cidade reclama de meio ambiente, mas não dá a estrutura para o órgão.

AmbienteJÁ – Como foram geridos os recursos da compensação ambiental?
Moesch – A compensação ambiental é uma parte. Mais importante do que isto são as contrapartidas, as multas, tudo transformado em serviço.

AmbienteJÁ – E como isto foi gerenciado na sua gestão?
Moesch – Bem, de várias formas. Com reuniões com a comunidade, uma coisa totalmente inédita. Já que não existe o Estudo de Impacto de Vizinhança, a Smam fez o seu Estudo de Impacto de Vizinhança reunindo a comunidade antes de autorizar a obra no que diz respeito à Smam. Então, a compensação, o plantio de mudas era determinado pela própria comunidade, nós quadruplicamos a compensação ambiental, é um decreto de 2003. O valor é hoje quatro vezes maior.

AmbienteJÁ – Que outros instrumentos existem nas ações da Smam com relação aos empreendimentos?
Moesch – Existe a contrapartida do EIA-RIMA [Estudo e Relatório de Impacto Ambiental] para unidade de conservação, existe medida mitigadora, existe a contrapartida da licença e existe a compensação ambiental. A compensação ambiental é só para corte de árvores.

AmbienteJÁ – A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), no dia 09 de abril, de eliminar o mínimo de 0,5% para compensação ambiental referente a grandes empreendimentos, pode afetar os municípios quanto às compensações ambientais que passem a exigir?
Moesch – Não, nada a ver. Ao contrário, é até melhor porque não há mais um mínimo. Se pode até pedir mais.. Mas a Smam não pedia isso para empreendimentos menores. Ela passou a pedir para esses empreendimentos também.

AmbienteJÁ – É possível usar então a lei federal 9.985/2000, do Sistema Nacional de Unidades de Conservação, o Snuc, para as compensações ambientais no âmbito do município?
Moesch – O Sistema Nacional do Meio Ambiente o que é? Se é a Smam, ela é o Ibama e a Fepam dentro de Porto Alegre, ela pode e deve usar a lei federal. Não precisa de lei municipal. Nós estamos querendo incluir aqui o Sistema Municipal de Unidades de Conservação, que não está sendo votado. Nós apresentamos em junho de 2007.

AmbienteJÁ – Foi apresentado pelo Executivo?
Moesch – Apresentado pelo Executivo, e a gente está com dificuldade de votar este projeto.

AmbienteJÁ – Qual a dificuldade?
Moesch – São várias, talvez a falta de compreensão, enfim, da importância do Smuc, o Sistema Municipal de Unidades de Conservação... mas essa contrapartida de que tu falas é uma das contrapartidas. Isso não é uma compensação ambiental, é uma contrapartida do empreendedor. Existem outras contrapartidas para beneficiar o meio ambiente, que são contrapartidas, por exemplo, que as equipes da Smam exigem. Então, por exemplo: melhoria de praças, praças novas, parques. Nós passamos a ampliar isso. O monitoramento do ar, que não existia, passamos a exigir. Planos de gerenciamento dos resíduso gerados pelo empreendedor, que também não tinha. Equipe de resíduos da Smam. Nós passamos a ter uma equipe de resíduos. É. O órgão ambiental de Porto Alegre não tinha uma equipe de resíduos sólidos. Tem desde 2006. A Smam não tinha uma equipe de fauna silvestre. Hoje tem. Era um órgão ambiental sucateado. Sucateado. Não era um órgão ambiental real. Ele era parcial. Hoje ele é real, pleno. Ele é considerado, disparado, o melhor órgão ambiental municipal do país. É referência no Brasil e no mundo, mesmo sem ter aumento orçamentário, lamentavelmente. Mesmo sem ter tido o apoio da cidade, da cidadania, que não nos deu mais verba orçamentária para isto. Nós buscamos via Sistema Nacional do Meio Ambiente, com multas, contrapartidas e compensações ambientais. Foi assim que a gente conseguiu. Com o apoio do Comam, do Conselho Municipal do Meio Ambiente, que nos ajudou a estruturar melhor o Fundo Municipal do Meio Ambiente, que hoje é controlado pela sociedade, não mais pelo secretário da Smam, como era antes. Agora, o orçamento não aumentou. E isso tem que vir da cidade. A cidade tem que demandar o seguinte: nós queremos o meio ambiente melhor: tem que estruturar melhor a Smam.

AmbienteJÁ – Na Conferência das Cidades, realizada em fevereiro deste ano na PUCRS, num sábado, o Sr. comentou publicamente, durante um evento sobre licenciamento ambiental, que deveriam estar ali, presentes, funcionários da Smam.
Moesch – Isto é uma coisa menor, eu acho, agora.

AmbienteJÁ – Houve algum conflito entre o pessoal que já trabalhava na Smam, quando o Sr. assumiu, e a nova gestão?
Moesch – Ah, sim, porque nós tivemos antes uma gestão de 16 anos, isto é muito ruim para a democracia.

AmbienteJÁ – A questão partidária atrapalhou a sua gestão?
Moesch – No início, sim. De alguns servidores, de uma minoria. A grande minoria. Uma desconfiança muito grande.

AmbienteJÁ – Foi possível mudar isto? Como?
Moesch – Com diálogo. Muito diálogo e mostrando que nós assumimos a Smam para melhorar o meio ambiente, para melhorar a cidade, e não para se utilizar da Smam. Nós não nos utilizamos da Smam, ao contrário.

AmbienteJÁ – Esse pessoal colaborou espontaneamente?
Moesch – A maioria sim. Como em qualquer parte do mundo, nada é unânime. A maioria dos servidores da Smam não só correspondeu como deu idéias, como se engajou.

AmbienteJÁ – A sua saída da Smam tem a ver com a eleição apenas ou com alguma insatisfação?
Moesch – Não, eu acho que isto está muito claro. Toda a cidade sabe disto, eu tinha uma desincompatibilidade eleitoral. Se eu não saísse, eu não poderia concorrer neste ano e, em 31 de dezembro, eu teria que sair da Smam e da vida pública. Eu sairia da vida pública se eu não saísse da Smam agora. Eu tenho certeza de que quem fez 11.300 votos em 2004... eu tenho certeza de que a cidade não queria que eu saísse da vida pública agora, ao menos eu tenho que fazer uma eleição de novo , que é para saber se é para eu continuar ou não. Então, eu não tinha o direito de ficar na Smam. Porque daí eu ficaria na vida pública só até 31 de dezembro, porque o meu mandato atual vale até 31 de dezembro.

AmbienteJÁ – Mas aí o Sr voltaria como secretário?
Moesch – Aí eu ficaria dependendo do futuro prefeito, que pode ser o atual ou outro.

AmbienteJÁ – O Sr acha que o prefeito Fogaça não se reelege?
Moesch – Eu acho que sim, acho que se reelege, e vou trabalhar para isto.

AmbienteJÁ – Se o prefeito for reeleito, o Sr. voltaria como secretário?
Moesch – Olha, eu não sei. Agora é muito cedo, eu estou recém retornando para a Câmara, adoro o parlamento, acho que no parlamento a gente pode fazer coisas que no Executivo a gente não consegue fazer. Tem coisas que só o Executivo consegue fazer.

AmbienteJÁ – Como é essa experiência dupla de estar à frente como parlamentar e como Poder Executivo?
Moesch – Tem coisas que só o Poder Executivo pode realizar, e o Legislativo não. Tem coisas que, ao contrário, só o Legislativo consegue realizar, tem coisas que não. Então são experiências importantes, são diferentes, o Executivo é aquela coisa do dia-a-dia, tens que ir lá, cuidar, ver como é que está o combustível, a conta da energia, hora extra, enfim, tem que cuidar da licença de cada empreendimento, e não só de estruturar o Sistema de Licença Ambiental. Então, é muito do dia-a-dia, o Executivo. O Parlamento, em princípio deveria ser, embora nem sempre faça isso, mais macro. Então, é aí que a gente pode tentar estruturar melhor o órgão ambiental, via Câmara, fazer audiências públicas para resolver problemas da cidade que muitas vezes o Executivo não tem a legitimidade que o Legislativo tem, enfim, algumas adequações à legislação que às vezes não se consegue no Executivo e se consegue no legislativo.

AmbienteJÁ – O que o Sr considera mais difícil na sua experiência: ter passado pela Câmara ou pelo Executivo?
Moesch – Os dois. Qual é a maior dificuldade do meio ambiente? É o preconceito. As pessoas não estão preparadas, ainda, para o meio ambiente. O meio ambiente é um estigma. Tu achas que as pessoas são ecologistas?

AmbienteJÁ – Não, mas há uma visão mais aberta ao meio ambiente, hoje.
Moesch – Mas é muito pouco. Na hora de mudar.... as pessoas não querem deixar os seus carros em casa.

AmbienteJÁ – Mas o Sr fala numa questão de comportamento...
Moesch – Mas é isto! O resultado é o que interessa. As pessoas estão preocupadas com o meio ambiente, mas elas continuam, na sua maioria, não fazendo algo para melhorar o meio ambiente. Elas estão preocupadas. Mas não agindo. A maioria. A sociedade está cada vez mais preocupada com o meio ambiente. Ponto. Mas fazer... as pessoas não querem deixar seus carros em casa, querem tirar a árvore que está sujando a calçada. Mas estão preocupadas com a Amazônia.

AmbienteJÁ – Isto não seria uma atitude equivocada em vez de preconceito?
Moesch – Claro que é preconceito. É preconceito pelo seguinte: é o preconceito com a árvore, que está lá atrapalhando a sua calçada. As pessoas basaltam tudo. Bom, é minha opinião. É a opinião de quem está há mais de 20 anos só fazendo isto. Há mais de 20 anos eu milito, eu sou ativista, eu sou ecologista. Eu coordenei todas as leis ambientais do Estado do Rio Grande do Sul, todas elas. Está ali, ó [aponta para um quadro de José Lutzenberger, na parede da sala de reuniões de seu gabinete]. Quando ele estava vivo, eu trabalhava com ele. Se tu achas que as pessoas são ecologistas...

AmbienteJÁ – Eu não disse que as pessoas são ecologistas...
Moesch – As pessoas não estão preparadas para o meio ambiente. É uma mudança cultural. Nós temos que fazer uma revolução cultural para as pessoas passarem a agir pró-meio ambiente. Melhorou um pouquinho? Melhorou. Hoje as pessoas separam o lixo, a maioria ainda bota no chão. As pessoas botam lixo no chão. As pessoas não botam lixo no chão? Tu não vês isto? (...) Como vereador, como secretário, como militante, como ativista, a seguinte... sabe qual é o meu grande problema? É que as pessoas, na minha opinião, não priorizam o meio ambiente. O meio ambiente não é uma prioridade no seu dia-a-dia. Minha opinião é essa: de quem milita há mais de 20 anos e que só faz isto no dia-a-dia. Então, o problema não é do secretário, do vereador, é do cidadão que quer melhorar o meio ambiente e não consegue, como gostaria, porque a maioria das pessoas não prioriza o meio ambiente. O que melhorou, pouco, foi a preocupação com o meio ambiente, mas não fazem na sua casa, no seu bairro, algo para isso. Pelo contrário. E volto a insistir. É só pegar os dados: todos os dias as pessoas pedem, todos os dias, para cortar e podar árvores porque está sujando a calha e sujando a calçada. Essa é a maior demanda. As pessoas querem podar árvores. As pessoas querem árvore, mas não ali, na sua calçada. Elas basaltam tudo. Eu estou falando da maioria... tem muitas pessoas... o porto-alegrense tem uma história ecológica riquíssima, é uma parcela significativa da sociedade, mas que não é ainda, talvez, a maioria. Isso se reflete no OP. Por que o OP não demanda meio ambiente? Está ali, estou dando dados. O orçamento é pequeníssimo para o meio ambiente. As demandas são mais para cortar árvores do que para plantar árvores.

AmbienteJÁ – Qual o orçamento da Smam em relação ao do município todo?
Moesch – O do município deve estar hoje em 2 bilhões e 600 milhões por ano.

AmbienteJÁ – E a Smam fica com 1,6%. Por exemplo, na Secretaria do Meio Ambiente do município de São Paulo, qual a percentagem do orçamento destinada à área ambiental?
Moesch – Todos são pequenos. Isto não é um problema só de Porto Alegre. Quando eu falei da sociedade, é a sociedade internacional. O alemão é assim. Nós estamos no planeta Terra. O porto-alegrense é de uma das sociedades mais maduras, ambientalmente falando, do mundo. Quando eu estou falando isto, não é do porto-alegrense. Eu estou falando da humanidade. Nós estamos em uma das cidades as mais preocupadas e com uma das histórias as mais ricas em defesa do meio ambiente do mundo! Quando eu falo da sociedade, é a sociedade internacional, mundial. Aí a demanda ambiental é pequena, sim, no mundo inteiro. O orçamento para os órgãos ambientais é pequeno no mundo inteiro. Não é um problema de Porto Alegre.

AmbienteJÁ – Quando o Sr foi secretário, como era a relação entre a Smam e as outras secretarias, como a Smov e a da Saúde, com suas divisões de Vigilância Sanitária, por exemplo? Havia conflitos?
Moesch – Na realidade, o que existia era o seguinte: a prefeitura não aceitava a licença ambiental da Smam. Não aceitava que a Smam desse licença ambiental. Os órgãos que faziam obras não aceitavam... EPTC [Empresa Pública de Transporte e Circulação], Smov, Dmae, DEP [Departamento de Esgotos Pluviais]...

AmbienteJÁ – Não aceitavam a licença?
Moesch – Não. Isso mudou com o prefeito. Ele passou a exigir a licença ambiental com rigor.

AmbienteJÁ – Essa era uma cultura?
Moesch – Sim.

AmbienteJÁ – Houve muitos conflitos com relação às licenças ambientais?
Moesch – Sim, houve escândalos. Teve licenças ambientais anuladas, colocando secretários para responder processos por improbidade administrativa, com bens indisponíveis... isso é passado.

AmbienteJÁ – Qual o foco da sua campanha a vereador neste ano?
Moesch – Vou continuar como sempre foi, priorizando o meio ambiente e a cidade.

AmbienteJÁ – O Sr tem alguma proposta de lei nova para a área ambiental?
Moesch – Não, acho que tem que mais é aplicar as leis existentes. O grande desafio é aplicar, como eu fiz lá na Smam. As pessoas não conheciam o Código Estadual do Meio Ambiente, eram só decretos e o Plano Diretor. E a Lei 6938 de 1981 [Lei da Política Nacional do Meio Ambiente]? E o Código Estadual do Meio Ambiente [Lei 11.520/2000]? Então nós temos que aplicar as leis já existentes. Claro que a gente tem que fazer aprimoramentos, mas nós, a Smam, passou a exigir, nas licenças ambientais, a legislação que já existia, mas que não era usada porque se entendia que a Smam só podia usar a licença, lei municipal. Não. A Smam não pode e não deve usar apenas leis municipais. Ela pode e deve, por ser o órgão ambiental e, portanto, por ser o Sisnama – o Sistema Nacional do Meio Ambiente – dentro de Porto Alegre, ela tem que também usar, quando achar conveniente, quando achar importante para o meio ambiente, quando for importante para a política do meio ambiente, usar leis estaduais e federais. Isto nós passamos a fazer, e não era feito.

AmbienteJÁ – Mas isto é bem lógico, o município pode absorver leis de hierarquia superior, estaduais e federais....pode restringir mais até...
Moesch – Pode e deve. Se não seguir, vai deixar de ser Sisnama. E isso foi difícil de entender. O prefeito entendeu isso.

AmbienteJÁ – A lei do Código Estadual do Meio Ambiente é inclusive muito rigorosa quanto ao licenciamento ambiental....por exemplo, diz que se um Estudo de Impacto Ambiental não apresentar alternativa tecnológica, uma licença ambiental decorrente dele pode ser anulada.
Moesch – Nós fizemos isto. A Smam passou a fazer isto. A Smam passou, em janeiro de 2005, a exigir isto das licenças ambientais: tudo o que está no Código Estadual do Meio Ambiente. Tudo o que está na 6938, na Política Nacional do Meio Ambiente, e outras. Por que a gente, por exemplo, criou a Reserva Legal Urbana? É a única cidade no mundo que aplica. Nenhuma cidade do mundo, nem cidade alemã, aplica isto. O que é Reserva Legal Urbana? Tu não podes cortar toda a vegetação do terreno em área urbana. E se não tiver vegetação, vais ter que plantar. Por quê? Nós usamos o Código Estadual do Meio Ambiente. É uma interpretação.

AmbienteJÁ – Isto serviu de referência para outros municípios fazerem algo parecido?
Moesch – Sim, sim... não exatamente igual. Mas Goiânia está usando muito isto para empreendimentos com mais de 1 hectare, por exemplo. Passa a ter que ter a contrapartida para parques, praças e assim por diante. São Paulo está fazendo muito neste sentido, também, exigindo pavimento permeável na calçada dos novos empreendimentos. Porque nós também criamos uma outra coisa importante... nós não ficamos aqui, isolados. Eu busquei as redes Anama – Associação Nacional dos Órgãos Ambientais Municipais; eu fui o primeiro vice-presidente e o secretário-geral da Anama. ICLEI (International Council for Local Environmental Initiatives, ou Conselho Internacional para Iniciativas Ambientais Locais, Metrópoles (Observatório das Metrópoles), então nós criamos uma rede internacional e trocamos muitas experiências. E ensinamos e aprendemos. Trouxemos experiências e levamos experiências. É a rede dos municípios de níveis nacional e internacional que funciona bem, porque os municípios são a parte mais fraca da federação. Então nós precisamos nos unir. Isto nós fizemos, agora mesmo fiquei muito honrado, ia pela Câmara, mas fui convidado pela Anama, na semana que vem [nesta semana], para participar da Conferência Nacional do Meio Ambiente, vou como convidado especial da Anama. Isto mostra a rede que nós criamos. Porto Alegre é hoje referência internacional em gestão ambiental. Não se faz mais debate, seminário, congresso de meio ambiente, no mundo, sem Porto Alegre. Nós vamos para Bonn, na Alemanha, agora em maio, vamos voltar à França, em setembro, vamos a Sidney, na Austrália, em outubro... Por quê? Porque as pessoas se impressionam como uma cidade, como um órgão ambiental com tão pouca estrutura, com tão pouco orçamento, consegue fazer tanto.

AmbienteJÁ – Como estão as discussões sobre o Plano Diretor?
Moesch – Está tudo parado. Nós temos um Plano Diretor que, em sua maior parte é bom, mas o que é bom está genérico, não foi regulamentado. O que é ruim já está sendo aplicado, que é o índice construtivo nos bairros já existentes. O problema do Plano Diretor é o índice construtivo muito alto nos bairros já existentes. É denso. Nós temos coisas boas, a exigência de ciclovias, que está no Plano Diretor. Isso é bom, mas passou a ser aplicado pela Smam, numa instrução normativa que eu assinei em dezembro de 2007, dizendo que não vamos mais aceitar empreendimentos que envolvam a operação nova malha viária sem ciclovia. A lei prevê Área de Preservação Permanente, APP, que é a lei federal, Código Florestal Federal, Código Estadual Florestal, Código Estadual do Meio Ambiente. Mas o Plano Diretor traz um novo mecanismo, que é a Apan, Área de Proteção do Ambiente Natural, que é diferente da APP, então é um plus. O problema é regulamentar isto. Então, nós temos coisas boas no Plano Diretor, mas que não foram regulamentadas e que não estão sendo aplicadas, que a Smam passou a aplicar dentro da sua limitação. Agora aquilo que, na minha opinião, é ruim, que gerou conflito, que é o adensamento exagerado nos bairros já existentes, isso já passou a ser aplicado há muito tempo, isso não foi alterado e precisa ser urgentemente alterado.

AmbienteJÁ – Mas há como alterar isto?
Moesch – Tem que mudar o Plano Diretor.

AmbienteJÁ – Há discussões na Câmara de Vereadores segundo as quais quase todo o Plano Diretor precisa mudar...
Moesch – Sim, mas eu acho que uma lei é isto, ela tem que ser flexível, não é uma coisa estanque. Veio um Plano Diretor em 99, como eu falei, ele prevê reuniões com a comunidade, mas não foram regulamentadas. Então ele prevê coisas boas, mas ficou lá, parado, porque é genérico. Diz que "lei terá que regulamentar....". E aquilo que gerou conflito, que é o índice construtivo, altíssimo nos bairros, já é auto-regulamentado pelo Plano, esse é o grande problema. A minha prioridade, como vereador, é fazer de tudo para votar o Plano Diretor ainda neste ano. Sim, em ano eleitoral. A gente tem que desmistificar a eleição. A eleição é uma coisa boa, saudável. Voto é uma coisa maravilhosa. Eu não sei por que o preconceito do voto. Quem bom que é ano eleitoral. Se nós estamos em uma eleição municipal, qual é a coisa mais importante para a cidade, não é o Plano Diretor? Portanto, é agora que a gente tem que discutir o Plano Diretor, mais do que nunca. É ano eleitoral? É agora que a gente tem que ver quem é quem. Nós temos que amadurecer democraticamente também. Parece que num ano eleitoral não se pode fazer mais nada, não se pode ajudar ninguém, não se pode fazer mais nada porque é ano eleitoral. Mas então a eleição passou a ser uma coisa ruim no Brasil? Se lutou tanto para acabar com a ditadura e voltar à democracia, agora que nós temos eleições, voto, agora é ruim isso? Não! Então eu defendo a urgência urgentíssima da votação do projeto de lei do Executivo, este que está tramitando no Poder Executivo. E que se não é o melhor, ele é melhor do que o atual plano. Ele diminui a altura, aumenta a área de recuo, introduz a área livre vegetada, que é reserva legal urbana. Então, ele é melhor do que o que gostaríamos? Não, mas é melhor do que o atual. Então vamos votar, depois a gente tenta melhorar de novo.

AmbienteJÁ – E como fica o Estudo de Impacto de Vizinhança?
Moesch – Ele [o Plano Diretor] não é o que nós gostaríamos, mas já traz o Estudo de Impacto de Vizinhança, ao menos. Agora, por que esperar para votar algo que já está melhor? Vamos votar o que já está melhor. Uma lei pode ser alterada a qualquer momento.

AmbienteJÁ – Como ficou a questão dos outdoors?
Moesch – É a poluição visual. Poluição visual não se resume a outdoor e frontlight. Que bom que fosse. Poluição visual são fachadas de lojas, faixas, das residências, inclusive, cavaletes etc. Nós retiramos, em 2007, 80 mil propagandas irregulares.. Só tem duas cidades no Brasil que combatem a poluição visual: São Paulo e Porto Alegre. Portanto, Porto Alegre é a única cidade do Rio Grande do Sul que tem um trabalho, há muitos anos – não é na minha gestão – que faz isto. O outdoor e o fontlight são tipos de poluição visual. O que nós fizemos? Nós firmamos um termo de compromisso e ajustamento com a mídia exterior, nós congelamos novos outdoors e frontlights, estamos regularizando aqueles que a lei prevê, é uma lei de 89. Inclusive muitos têm que ter educação ambiental, um percentual para a educação ambiental – alguma coisa já foi feita – e precisamos agora, num segundo momento, fazer o aprimoramento da lei. Então nós apostamos primeiro no cumprimento da lei já existente para depois fazer o aprimoramento da lei. Seria muito fácil mudar a lei sabendo que ela não iria funcionar, se nem a atual está funcionando. Então eu entendo que a lei, em alguns aspectos, é ainda permissiva demais. Por exemplo, dependendo do tamanho do terreno, pode ter seis outdoors, eu acho que teria que ser no máximo dois. E ainda pode haver a sobreposição do back ou frontlight com os outdoors, eu acho que não pode, ou uma coisa ou outra. De qualquer maneira, a lei prevê coisas boas, Por exemplo, 80 metros de distância de um backlight de outro. Isso é bom. Teria que ser 120, mas 80 metros é uma distância interessante. Mais: não pode perto de viadutos, de rótulas, não pode na orla. Então, nós temos pontos, na lei, muito bons, que precisam ser respeitados. Isto não estava sendo feito. Nós apostamos no cumprimento. O termo de compromisso de ajustamento, além de resultar nisto que eu falei, que é no congelamento, na dminuição e na regularização, está gerando milhões de reais de multas transformadas em serviços à cidade. Milhões. São Paulo não conseguiu isso. São Paulo aspostou no diálogo, apostou no termo, e não conseguiu... por isto eles tiveram que radicalizar. Aqui, nós conseguimos dialogar com o empresariado muitos resistiram, outros não. Aqueles que resistiram viram que não tinham outra saída. Aqueles que resistiram, nós começamos a retirar outdoors e frontlights, e aí eles vieram para o diálogo. Isto foi algo inédito no Brasil. Inédito. Com diálogo. Porque não somos nós que estamos retirando, porque é caro. São os empreendedores, e ainda com contrapartida. Agora estamos apostando nas lojas porque as grandes lojas se regularizaram, mas a maioria está com fachadas impróprias. Então, a maior poluição visual na cidade, hoje, é decorrente das lojas, das fachadas de lojas. Nós tínhamos aqueles banners amarelos, que infestavam todos os postes. Continua-se vendo isso em Viamão, continua-se vendo em Cachoeirinha, continua-se vendo em Gravataí, continua-se vendo em Canoas, Esteio, menos em Porto Alegre. Por quê? Porque nós pegamos os infratores, em flagrante. Nós não vemos mais algo que infestava todos os postes de Porto Alegre, que eram aqueles banners de plástico amarelo. Continua tendo em todo o Rio Grande do Sul, menos em Porto Alegre. Porque aqui nós temos uma ação efetiva e conseguimos fazer algo que impressionou São Paulo, que eles não conseguiram fazer lá. É acabar com a poluição visual dos postos de gasolina. Os postos de gasolina todos estão em locais estratégicos. Antes, eram infestados de cavaletes, verdadeiros outdoors de preços e faixas. Com a Sulpetro e com as próprias distribuidoras, Petrobras, Ipiranga, nós conseguimos um acerto, e hoje é muito raro, quase não se vê posto de gasolina com poluição visual. Nem São Paulo conseguiu isso. Então, estamos conseguindo – não conseguimos ainda – resolver este problema da poluição visual.

AmbienteJÁ – O que o Sr pensa da publicidade usando bicicletas? Grandes empresas que não podem mais usar outdoor estão recorrendo a este tipo de publicidade...
Moesch – Eu acho bom. Porque é móvel. O problema da poluição é quando ela está fixa, parada. Acho que não podemos ser tão radicais. Eu sou favorável. Acho que a propaganda móvel não está lá, comprometendo um espaço.

(Por Cláudia Viegas, AmbienteJÁ, 07/05/2008)

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