Para religiosos e representantes de ONGs e de trabalhadores rurais do Pará, a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado de ser o mandante da morte da religiosa Dorothy Stang, reforça o sentimento de impunidade e pode aumentar os casos de violência e intimidações contra lideranças sem-terra.
O bispo do Xingu, dom Erwin Krautler, que era amigo de Dorothy e está ameaçado de morte, disse ontem que o resultado do julgamento não deve intimidar "o povo que luta por justiça". "Tenho fé e esperança em Deus que isso [o julgamento] vai se reverter", afirmou.
O bispo dom Flávio Giovenale, da prelazia de Abaetetuba, disse que a absolvição pode incentivar o aumento da violência. "Achamos que a absolvição dará mais força aos grupos interessados não só na eliminação de dom Erwin Krautler, mas em continuar um projeto em que os grandes [posseiros] podem fazer grilagem, explorar os demais, e quem se opõe a eles é eliminado", disse.
Para José Batista Afonso, advogado da CPT (Comissão Pastoral da Terra) e assistente da acusação, a absolvição é uma "incitação ao crime". "É uma licença para matar", disse.
A ONG Justiça Global, que acompanha o caso Dorothy, irá relatar a decisão do júri à ONU (Organização das Nações Unidas), que já vem sendo informada do processo. Para a advogada Tamara Melo, da Justiça Global, a absolvição de Bida não é um caso isolado. "Ela [a decisão] se insere em um contexto de impunidade absoluta."
O Ministério Público Federal no Pará divulgou uma nota na qual afirma que a absolvição é "um prêmio à impunidade" e que contribui para o acirramento da violência no campo.
Os procuradores pedem reforço das polícias Federal e Civil das regiões de conflitos agrários, sob o risco de ter concretizadas as ameaças de morte a trabalhadores rurais, índios, quilombolas e religiosos.
A governadora do Pará, Ana Júlia Carepa (PT), criticou ontem a fragilidade do Judiciário no combate à impunidade. "A decisão mostra o quanto o sistema Judiciário brasileiro é frágil para combater a impunidade. A culpa só recai sobre quem apertou o gatilho", disse.
(Por Sílvia Freire e Pablo Solano, Folha de São Paulo, 08/05/2008)