Estudo brasileiro indica quais zonas devem receber prioridade na América Latina para a conservação de anfíbios
No Brasil, litoral do Sudeste e da Bahia, interior do Paraná e norte da Amazônia estão sob risco; só 26,60% das regiões estão intactas
O mapa latino-americano das áreas prioritárias de conservação dos sapos, rãs e pererecas, divulgado hoje, é conclusivo. Para salvar as 700 espécies mais ameaçadas de extinção desse grupo será preciso "blindar" 66 regiões. No Brasil, elas estão no litoral do Sudeste e da Bahia, no interior do Paraná e no norte da Amazônia.
"Nossa função é identificar o problema, agora cabe aos formuladores de políticas públicas o restante", afirma Rafael Loyola, aluno de doutorado da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) e principal autor do estudo, publicado hoje na revista científica "PLoS ONE". Ele é assinado por mais cinco pesquisadores do Brasil.
O desafio é gigantesco. As 66 regiões representam uma área de 6.254.500 km2, o que significa 73% da área do Brasil. Apenas 26,60% desse território ainda estão intactos. Todas as regiões brasileiras mapeadas agora estão em perigo.
O levantamento, afirma o pesquisador, considera tanto as espécies que precisam de água para a reprodução quanto aquelas que se desenvolvem sem passar pela fase de girino. Apesar de a lista das 700 espécies mais ameaçadas de extinção ser conhecida, é a primeira vez que a distribuição desses bichos é analisada a partir de uma óptica geográfica.
Os cientistas processaram os dados das espécies por meio de um modelo matemático.
De Cuba a Ushuaia
Outras regiões vitais para a população de sapos, rãs e pererecas que precisam de água na fase reprodutiva estão no México, nas ilhas do Caribe, no norte dos Andes, na América Central e no sul da América do Sul (Patagônia).
Em todos os casos estudados, diz Loyola, é sempre importante considerar a diferença de ciclo reprodutivo de cada grupo.
"As espécies que têm girinos, e por isso precisam de corpos d'água para a reprodução, sofrem mais com a fragmentação das regiões", diz o pesquisador. O corte de florestas por estradas, plantações ou construções faz com que lagoas freqüentadas por determinadas espécies do litoral paulista, por exemplo, comecem a sumir.
No caso das espécies com desenvolvimento apenas terrestre, segundo Loyola, os riscos são outros. "Aqui entram impactos desde o aumento da temperatura, por causa, por exemplo, do aquecimento global, até a competição provocada pela invasão de espécies exóticas". Os focos de ameaça a esses animais foram flagrados, segundo o mapa dos biólogos, em áreas mexicanas, brasileiras, chilenas, dos Andes tropicais e também da Costa Rica (Montanhas Talamancan).
A preocupação com sapos, rãs e pererecas, diz Loyola, é justificável, porque esses invertebrados -o grupo dos anuros- fazem parte do grupo animal mais ameaçado de extinção hoje no mundo.
Segundo o pesquisador, existem hoje, em todo o planeta, 6.184 espécies conhecidas de anfíbios. Um terço delas corre o risco de desaparecer.
"Por isso essas 66 regiões são as mais importantes mesmo, na América Latina", afirma o biólogo. "Elas reúnem boa parte das espécies que estão realmente ameaçadas de extinção."
Endemismo
O mapeamento latino-americano dos sapos, além dos grupos sob risco, também detectou aqueles que são endêmicos das regiões analisadas, ou seja, que são exclusivos dessas regiões ecológicas do mundo.
Somando tanto as espécies terrestres como aquelas que têm girinos, os cientistas identificaram a ocorrência de 422 dessas espécies endêmicas.
Isso, segundo Loyola, aumenta ainda mais a importância de preservar as 66 áreas prioritárias para conservação.
(Folha de São Paulo, 07/05/2008)