Vítima de sucessivas ameaças de morte há mais de três anos, sem que até agora a polícia tenha conseguido identificar seus autores, o bispo de Xingu (PA), dom Erwin Kräutler, fez um desabafo nesta terça-feira (06/05), durante a reunião de audiência pública realizada pela Comissão da Amazônia, Integração Nacional e de Desenvolvimento Regional da Câmara dos Deputados para discutir o tráfico de mulheres e crianças para exploração sexual na Amazônia, e a situação dos religiosos ameaçados de morte por combatê-lo.
"Estou com minhas atividades cerceadas, mal posso sair de casa, minha situação está chegando ao limite", disse dom Erwin, cobrando das autoridades policiais que descubram, afinal, de onde partem as ameaças. Para dar uma idéia do ponto a que chega a violência no Pará, o bispo de Xingu contou que sua "eliminação" foi recomendada até em matéria assinada publicada pela imprensa estadual, sem que qualquer providência tenha sido tomada. Segundo ele, o autor da matéria é o jornalista Armando Soares, do jornal O Liberal, que defendeu abertamente a "eliminação" do bispo, e mesmo assim continua escrevendo para o jornal.
A audiência foi presidida pela deputada Janete Capiberibe (PSB-AP), que anunciou sua intenção de procurar o presidente Luiz Inácio Lula da Silva para propor a criação de uma força-tarefa, integrada por diversos setores dos Poderes Públicos, destinada especificamente a combater o crime e a violação dos direitos humanos na Amazônia.
Proteção rigorosa
Companheiro de trabalho da irmã Dorothy Stang, assassinada em fevereiro de 2005, dom Erwin Kräutler atribui as ameaças a grandes interesses econômicos contrariados pelas pessoas que defendem a preservação ambiental, os povos indígenas, as comunidades ribeirinhas e o povo pobre em geral. O bispo de Xingu, assim como outras pessoas, religiosos e leigos, começou a ser ameaçado desde a época do crime contra irmã Dorothy.
Ele está sob proteção policial desde meados de 2006. A partir do final de 2006, essa proteção tornou-se mais rigorosa. Desde então, dom Erwin passou a ser acompanhado dia e noite por três agentes policiais. "Foi porque marcaram minha morte, disseram que eu não passaria do dia 29 de dezembro de 2006", explicou o bispo.
Dom Erwin Kräutler lembrou que os acusados pela execução do assassinato de irmã Dorothy estão sendo julgados justamente hoje. "É preciso que eles sejam punidos", advertiu o bispo, acrescentando que todas as pessoas que defendem o fim da impunidade tornam-se também vítimas de ameaças. Segundo dom Erwin, o objetivo dos criminosos é quebrar a resistência das pessoas, fazê-las desistir do combate pela justiça. "Mas eu não vou pendurar minhas chuteiras", garantiu.
Apelo à consciência
Também ameaçado de morte, o bispo de Marajó (PA), dom José Luís Azcona, fez, "em nome do Evangelho", um apelo à consciência pública dos brasileiros. "A história do Pará está manchada pelo sangue de muitos inocentes, pessoas que ousaram lutar pelos direitos humanos. Isso mostra o quanto nossa sociedade é perversa e submetida à lei do mais forte, como diz o papa Bento 16. É preciso erradicar essas manchas que destroem a vida" - pediu o religioso.
Ele disse que há muitas pessoas bem intencionadas, mas a maioria delas acaba recuando diante do perigo da morte. "No entanto, a esperança de liberdade depende de enfrentarmos esses riscos", acrescentou dom Azcona, exortando as pessoas a assumir sua coragem cívica. O bispo de Marajó acusou as autoridades de inércia. "Foram publicadas reportagens e todo mundo sabe da exploração sexual de menores em Marajó, na rota entre Breves e a Guiana Francesa, mas ninguém faz nada", denunciou.
Dom Azcona lembrou ser de amplo conhecimento que cerca de trezentas pessoas - sindicalistas, lideranças comunitárias e indígenas, religiosos, políticos e outros - estão na lista dos ameaçadas de morte no Pará. Destas, cerca de cem pessoas vivem com proteção policial. A morte de um sindicalista, por exemplo, está valendo em torno de R$ 30 mil.
(Por Luiz Cláudio Pinheiro, Agência Câmara, 06/05/2008)