Gente, vou começar contando as boas notícias! Em Criciúma-SC, em março de 2007, nasceu uma decisão judicial - muito importante - para a defesa e proteção do meio ambiente. O juiz federal Germano Alberton Júnior proibiu a FATMA - órgão estadual licenciador e fiscalizador -, de tratar do licenciamento ambiental que envolva o carvão.
Por quê?
Porque ele acatou um dos pedidos da Ação Civil Pública ajuizada pelo Ministério Público Federal, em 2004.
Porque ele entendeu que o licenciamento da atividade minerária, até hoje, esteve nas mãos de pessoas não habilitadas tecnicamente para tanto. Nessa decisão, o Juiz confirmou o que todos já sabem, "que a atividade de mineração na região sul do Estado de Santa Catarina vem sendo feita há muito tempo, sendo a responsável por boa parte dos problemas ambientais da região e que as visíveis omissões dos órgãos ambientais contribuem para tal resultado".
Gente, agora pasmem com a má notícia!! O IBAMA atacou esta decisão do Dr. Germano. Tudo isso porque ele não quer cumprir o seu dever de cuidar do licenciamento ambiental do carvão mineral em SC. Bom, isso é legalmente possível: no Brasil, quem está insatisfeito com alguma decisão judicial, pode reclamar/recorrer desta para uma instância superior. Neste caso, o IBAMA valeu-se de um ‘agravo de instrumento’. Mas seus argumentos comprovam o óbvio e ululante: o SISNAMA faliu! Olhem só o que ele diz:
- para constituir a equipe necessária para licenciar o carvão, precisaria buscar técnicos em todo canto do Brasil. E isso seria altamente oneroso ao Erário;
- sua participação tornaria o processo de licenciamento mais demorado, já que seus técnicos estão espalhados pelo Brasil, cuidando de vários licenciamentos...
Gente, é absurdo ou não é?!?!
Ora, na liminar, o Dr. Germano só mandou o IBAMA cumprir a Lei. Querem ver? Vou falar difícil. A Lei 6.938/1981 c/c Lei 7.804/1989 estatui a competência do IBAMA para o licenciamento de atividades poluidoras. A Lei 10.165/2000, que regulamenta a TCFA - Taxa de Controle e Fiscalização Ambiental exigida do empreendedor para controle/fiscalização das atividades poluidoras e utilizadoras de recursos naturais, define que a competência para fiscalização a atividade minerária é do IBAMA. E aponta, como pagador desta taxa, quem exerce atividade de extração e tratamento de minerais tais como "pesquisa mineral com guia de utilização; lavra a céu aberto, inclusive de aluvião, com ou sem beneficiamento; lavra subterrânea com ou sem beneficiamento, lavra garimpeira, perfuração de poços e produção de petróleo e gás natural".
Como pode o IBAMA dizer que licenciar o carvão vai custar caro aos cofres públicos, se ele recebe a TCFA para custear este encargo? O que é feito com este dinheiro? Não pode, então, o IBAMA vir com esta história de que o licenciamento da atividade mineraria não é sua atribuição; que, aqui, isso é encargo da FATMA. E o desembargador, ao acatar essa tese e suspender a liminar do Dr. Germano, foi induzido em erro pelo IBAMA.
O pior de todo este pesadelo é que o próprio autor desta ação - o MPF - também reclamou/recorreu da decisão do Dr. Germano Alberton. Pediu em 2004 e não gostou do que levou em 2007! No seu recurso, o MPF pede que a liminar seja revista devido à ausência de profissionais do IBAMA aptos ao licenciamento lotados em Santa Catarina. E, pasmem: pede que o licenciamento continue com a FATMA porque está possui corpo técnico mais habilitado.
Esse chumbo grosso, vindo de vários lados, suspendeu a decisão do Dr. Germano!
E quem suspendeu a liminar do Dr. Germano foi o Desembargador Federal Luiz Carlos Lugon. Ou seja, o mesmo julgador que, ao analisar o "chumbo" da FATMA neste causu, que ficou insatisfeita com a retirada dela do licenciamento do carvão, alegou: "Nada há a modificar na decisão combatida que deve ser mantida pelos seus lúcidos fundamentos. A necessidade de profissionais habilitados para o licenciamento ambiental é medida que se impõe em casos que tais, ante a importância de ser resguardados os potenciais naturais. A proteção ao meio ambiente é tema de extrema relevância; o direito ambiental alçou novos rumos e dimensões, adaptando-se a uma nova realidade mundial em que os temas referentes à degradação ambiental e ao exaurimento dos recursos naturais preocupam cada vez mais, sendo imperiosa a adoção de regras disciplinadoras".
O apoio à liminar do Dr. Germano foi tão enfático que o Dr. Lugon escreveu tudo isso na resposta ao recurso da FATMA: "O mero risco de dano ao meio ambiente é suficiente para que sejam tomadas todas as medidas necessárias a evitar sua concretização. Isso decorre tanto da importância que o meio ambiente adquiriu no ordenamento constitucional inaugurado com a Constituição de 1988 quanto da irreversibilidade e gravidade dos danos em questão, e envolve inclusive a paralisação de empreendimentos que, pela sua magnitude, possam implicar em significativo dano ambiental, ainda que este não esteja minuciosamente comprovado pelos órgãos protetivos".
Apenas de todo esse fundamento, a liminar está suspensa.
Não se preocupem se não entenderam nada dos "trâmites legais". Eu também não estou entendendo mais nada! No momento, duas certezas eu tenho: o meio ambiente da região sul de Santa Catarina vai continuar sendo destruído pelos "Senhores do Carvão"; a sadia qualidade de vida da população de lá vai virar peça de museu. Peraí: uma terceira certeza surgiu agora: tudo isso é muito bom para os construtores de cemitérios, para os vendedores de dinamite, para a indústria de produtos hospitalares e de medicamentos... e, claro, para aqueles que ganham rios de dinheiro com a venda do carvão mineral.
(Por Ana Candida Echevenguá *, Adital, 29/04/2008)
* Advogada ambientalista. Coordenadora do Programa Eco&ação