Jean Ziegler volta a atacar biocombustíveis, que segundo ele são os causadores de ‘verdadeira tragédia’ ao mundoÀs vésperas de se aposentar do cargo de relator da ONU para o Direito a Alimentação, o polêmico Jean Ziegler culpa o etanol pela crise de alimentos no mundo e pede uma moratória (suspensão da produção) de cinco anos para o biocombustível. Para ele, o mundo vive uma “verdadeira tragédia” e os biocombustiveis são “intoleráveis”.
Depois de quase oito anos no cargo, Ziegler termina seu mandato amanhã, tendo visitado mais de 20 países, entre eles o Brasil. Polêmico por ter denunciado nos anos 90 o sistema bancário suíço, acusado Israel e elogiado a modesta abertura em Cuba, Ziegler agora não poupa críticas ao etanol.
Para ele, os biocombustíveis são “um crime contra grande parte da humanidade”, já que provocam a alta nos preços dos alimentos. Sua tese é combatida pelo secretário-geral da ONU, Ban Ki Moon, que disse ao Estado não concordar com a visão de Ziegler.
Segundo o relator, novos modelos de combustíveis precisam ser encontrados para substituir o petróleo e combater a mudança climática. Mas isso não pode “matar as pessoas de fome”, ressalva. A solução seria implementar outras fontes de energia e melhorar o transporte público. “O direito à vida e à alimentação é o principal.”
Apesar de criticar o etanol, Ziegler concentra suas críticas nos países ricos. O suíço acusa os americanos de destinar 35% da produção de milho às usinas de álcool em 2007. Ele também alerta que a meta da União Européia de ter 5,75% do etanol nos carros até 2010 não é viável.
O próprio governo brasileiro já o criticou e, entre os diplomatas, uma tentativa de retirar o apoio ao relator foi ensaiada. Mas Ziegler acabou modificando sua avaliação para tentar agradar aos brasileiros e disse que o etanol nacional não seria o responsável pelos problemas no mundo (leia mais ao lado).
“O massacre cotidiano da fome não é novo. Mas agora novas classes sociais caíram no abismo da fome em poucos meses.” Os mais atingidos foram os países em desenvolvimento, por enquanto. Nos países ricos, uma família destina cerca de 12% da renda à alimentação. Nos pobres, essa taxa já chega a 85%.
Segundo ele, os preços do milho subiram 53% em um ano, ante 87% da soja e 130% do trigo. O arroz teve alta de 74%. Ziegler concorda que restrições às exportações, como fez o Brasil, não colaboram. Mas ele diz entender os motivos dos governos ao tomar tais decisões.
No entanto, o etanol não seria o único responsável. Para Ziegler, a especulação nas commodities teria sido a culpada por 30% da explosão dos preços. Etanol e a especulação não são fatalidades.”
As políticas do Fundo Monetário Internacional (FMI) e da OMC também são atacadas por Ziegler, que os acusam de contribuir para os grandes exportadores, mas se esquecer da situação dos pequenos produtores.
(O Estado de S. Paulo,
FGV, 29/04/2008)