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biocombustíveis segurança alimentar etanol de milho
2008-04-28

No início do inverno de 2006 produtores rurais e economistas dos Estados Unidos iniciaram uma discussão para saber qual seria o impacto na economia global com a destinação de milho para a produção de etanol, biocombustível para substituir ou ser misturado aos derivados de petróleo para abastecer veículos. Os produtores rurais rapidamente perceberam que, com o aumento dos preços do petróleo, e o crescimento da demanda por milho, os preços iriam subir, o que torna plantar milho um bom negócio. E quando uma commoditie sobe no mercado americano a tendência é que o efeito se espalhe por outras commodities agrícolas, como o trigo, o arroz e demais produtos que cumprem papel essencial na segurança alimentar.

O alerta sobre os impactos negativos da destinação do milho para a produção de combustível foi feito, então, por Lester R. Brown, especialista em agricultura e presidente do Instituto de Políticas da Terra, de Washington. Ele acredita que não é possível abastecer a cadeia do milho, que inclui o fornecimento de matéria prima para a produção de alimentos industrializados e rações animais, e ainda assim produzir etanol para mover motores de automóveis. Ainda em 2006, Joachim Von Braun, diretor do Instituto de Pesquisas em Políticas Alimentícias dos Estados Unidos, fez o alerta de que mesmo uma pequena mudança nas políticas agrícolas poderia ter efeitos nefastos na produção de alimentos, porque “vai criar a disputa entre automóveis e pessoas com fome”, disse ao New York Times. Outro fator de alta é o crescimento dos mercados de consumo na Índia, China e Brasil, entre outros países em desenvolvimento, onde mais gente passou a ter acesso à comida diariamente.

No Brasil a produção de álcool para veículos é feita a partir da cana de açúcar, uma tecnologia que vem sendo dominada desde os anos 70. Nas cidades brasileiras a discussão sobre a utilização de biocombustível já é feita nos postos, onde cada motorista que tem um carro flex faz a conta para ver qual o melhor custo benefício entre o álcool e a gasolina. E os que já assumiram algum compromisso ambiental abastecem sempre com biocombustível para reduzir seu impacto no meio ambiente global. A reunião da Organização das Nações Unidas para a Alimentação e Agricultura (FAO), que aconteceu em Brasília de 14 a 18 de abril, fez um alerta de que a produção de biocombustíveis a partir de cultivos agrícolas importantes para a alimentação pode ser um risco para a segurança alimentar das populações mais pobres do mundo.

Falar na utilização de milho para a produção de biocombustíveis na América Latina é considerado uma verdadeira heresia. A maior parte das culturas das Américas utilizava o milho como alimento antes do descobrimento e, ainda hoje, é a base da alimentação principalmente no México, na América Central e nos países andinos. O primeiro sinal da crise de aumento nos preços de commoditties agrícolas na região veio da Argentina, onde a alta dos preços internacionais fez com que os produtores destinassem a maior parte da produção para os mercados internacionais, deixando o mercado interno desabastecido. A partir daí o debate sobre a disputa mesa x motores ganhou corpo em todo o mundo.

Ao mesmo tempo em que a alta dos alimentos oferece riscos à segurança alimentar, abre-se oportunidades para agricultores familiares em toda a América Latina. . De acordo com estimativas do governo brasileiro, há no País 4,2 milhões de unidades familiares agrícolas, com dois milhões de famílias em situação de pobreza. A alta dos preços representa oportunidades para a agricultura familiar, que recebeu R$ 5 bilhões em créditos em 2007 e deverá continuar a receber apoio do Pronaf – Programa Nacional de Agricultura Familiar. Este apoio já está se refletindo na safra 2007/2008 de milho, que está se beneficiando de um crescimento do consumo do milho na produção de rações para frangos, suínos e bovinos.

Enquanto o consumo do milho no Brasil está estimado em 44 milhões de toneladas em 2008, o que representa um crescimento de 10% em relação ao período anterior, os indicadores de produção apontam uma safra recorde de 53,3 milhões de toneladas. Mesmo assim a exportação brasileira deverá cair cerca de 10% em relação a 2006/2007. O setor também enfrenta outros questionamentos, como por exemplo, a introdução ou não de sementes transgênicas na produção brasileira. O País ainda mantém a maior parte de sua produção com sementes não modificadas, apesar de a CTNBio – órgão técnico de biossegurança – ter liberado a venda de duas variedades de sementes transgênicas no Brasil. E esta dúvida tem um componente de preço em relação ao mercado externo. Se por um lado a Europa valoriza a produção não transgênica, por outro o milho brasileiro situa-se em um patamar de preço um pouco superior ao de concorrentes que já se renderam à transgenia. (Envolverde)

BOX - A opção pela mesa

O Brasil já fez sua opção pelo milho na mesa e não no tanque dos automóveis. Desde antes de Colombo os índios da região tinham no milho seu prato principal. A planta mais utilizada para a produção de biocombustíveis é a cana-de-açúcar, e, agora, buscam-se oleaginosas que possam garantir a expansão da produção de biodiesel.

A culinária brasileira é recheada de milho em todas as regiões. O cuscuz paulista, a minera ou, até mesmo, o cuscuz doce, os pães, a pipoca e os bolos de fubá, além de outros pratos que povoam as mesas brasileiras são delícias que nenhum brasileiro desconhece. O milho é parte importante da cultura popular brasileira e existem, inclusive, receitas de pratos típicos na internet, onde a gula tem espaço privilegiado. O site Paragon Brasil, especializado em cultura popular, mantém uma página com receitas que vão desde a tradicional pamonha, até um inusitado bombom de pipoca.

Da sofisticação de um creme de milho, ao bom milho verde comido na palha, não há como pensar, por aqui, em destinar um alimento rico, barato e completo para a produção de combustíveis. Seja para consumo humano, ou para a produção de rações, o milho brasileiro garante a estabilidade e a segurança na oferta de alimentos para o mercado interno e para a exportação.


(Por Adalberto Wodianer Marcondes, Envolverde, 27/04/2008)


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