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transgênicos monsanto bill gates
2008-04-28

Às vezes as soluções para os problemas da humanidade estão à distância de um clique do mouse. "Como você alimenta meio milhão de pessoas no deserto?", pergunta uma animação no site do projeto África Sorgo Biofortificado (ABS). A resposta que ele propõe é: "Super Sorgo!"

"Faça ele crescer!", sugere sucintamente o site, patrocinado por um consórcio formado pela indústria agrícola e a comunidade científica. Uma criança feliz e sorridente enfatiza a intensa mensagem do site: o mundo está sendo salvo aqui mesmo, e estamos fazendo isso com a ajuda da engenharia genética. Os cientistas do projeto estão tentando desenvolver novas variedades de sorgo que seriam mais nutritivas e mais fáceis de digerir do que as variedades convencionais. Os desenvolvedores prometem que o novo grão fornecerá mais ferro, zinco, aminoácidos essenciais e vitaminas.

"O super sorgo pode melhorar a saúde de milhões de africanos de forma sustentável", diz a diretora do projeto, Florence Wambugu, da organização Africa Harvest (Colheita Africana). A melhor coisa do projeto, diz Wambugu, é que a planta "é capaz de crescer nas regiões mais inóspitas e inacessíveis do continente africano, onde a ajuda para a alimentação não consegue chegar." Será que a solução é assim tão simples? Será que os frutos de plantas geneticamente modificadas (GM) podem de fato evitar que dezenas de milhares de pessoas morram de fome todos os dias?

A indústria da engenharia genética está convencida de que sim. "Evitar a fome requer que nós usemos completamente todas as possibilidades tecnológicas", diz Martin Taylor da gigante suíça da agricultura Syngenta. As descobertas divulgadas por um relatório da Avaliação Internacional de Ciência e Tecnologia Agrícola para o Desenvolvimento (IAASTD, na sigla em inglês), todavia, são mais céticas. Mesmo hoje a agricultura moderna "não atingiu a todos", diz Robert Watson, coordenador do relatório elaborado por mais de 400 cientistas. É possível, de acordo com Watson, que as plantas GM tenham algum papel na luta contra a fome no futuro. Mas, acrescenta, devemos examinar com cuidado se a tecnologia está de fato ajudando os produtores pobres ou simplesmente enchendo os cofres das companhias agrícolas.

O fato é que a indústria da engenharia genética vende cada vez mais suas sementes, e 43% dos campos onde elas estão sendo usadas ficam em países em desenvolvimento e economias emergentes, especialmente na Argentina, Brasil, Índia e China. Uma variedade de soja chamada "Roundup Ready" desenvolvida pela companhia de engenharia genética Monsanto tem feito muito sucesso na América do Sul. A planta é resistente ao glifosato, o ingrediente ativo do herbicida Roundup. A Monsanto promete que tudo o que os fazendeiros precisariam fazer seria aspergir o glifosato sobre os campos de soja GM, e o produto em tese eliminaria quase todos os tipos de pragas.

O algodão batizado de "algodão Bt" da companhia também é visto como um sucesso. A semente, que contém um gene da bactéria Bacillus thuringiensis (Bt), encontrada no solo, é supostamente resistente à lagarta do algodão - uma praga que cava túneis dentro de até 60% das plantas. Graças ao algodão Bt, os produtores indianos aumentaram sua safra em mais de um terço, diz Terri Raney da Organização de Agricultura e Alimentação (FAO) das Nações Unidas. Eles também gastaram cerca de 41% a menos em pesticidas e herbicidas. Apesar do alto custo das sementes, seus lucros aumentaram quase 70%, de acordo com Raney.

Apesar desses sucessos, o especialista da FAO continua cético em relação ao fato de que esse rápido desenvolvimento não garante benefícios aos mais pobres. Apenas quatro tipos de plantas (algodão, milho, colza e soja) e dois atributos (resistência a insetos e tolerância a herbicidas) que foram introduzidos utilizando a engenharia genética representam mais de 99% de todas as plantações GM existentes hoje. "E essas plantas com certeza não são destinadas aos pequenos produtores dos países em desenvolvimento", diz Raney.

Em economias emergentes como a Argentina e a Índia, as safras de GM se destinam principalmente à produção de bens para exportação. Isso significa que as plantas GM interessam sobretudo aos fazendeiros com áreas relativamente grandes de terras cultiváveis. Os pequenos produtores, por sua vez, são deixados para escanteio. Na Argentina, por exemplo, a monocultura de soja desmantelou as estruturas rurais estabelecidas, argumenta a organização ambientalista Amigos da Terra, o que levou à pobreza e a migração para as cidades.

Na Índia, o alto custo das sementes GM patenteadas está levando muitos dos produtores mais pobres à falência. "A indústria biotecnológica está nos dizendo que precisamos de plantas GM para atender às necessidades de alimento de nossa população", diz Nnimmo Bassey, da Amigos da Terra na Nigéria. "Mas como podemos acreditar nessas afirmações quando a maior parte dos grãos GM é usada para alimentar os animais dos países ricos ou para produzir biocombustíveis?"

Aí está o principal problema. As novas variedades de plantas significam principalmente bons negócios quando servem ao mercado global e são cultivadas em vastas extensões de terra. Mas as plantas que seriam adequadas para o uso na luta contra a fome são as que se conformam ao solo, ao clima e às condições de infra-estrutura locais, e que ao mesmo tempo continuam sendo um recurso público acessível a todos, inclusive em termos de preço, mesmo para os pequenos produtores.

"O mundo em desenvolvimento precisa de plantas com melhor valor nutricional e maior resistência à seca, salinização e doenças", diz Janice Jiggins da Universidade de Wageningen na Holanda, uma das autoras do relatório da IAASTD. De acordo com Jiggins, variedades locais de arroz e trigo, feijão, sorgo e teff [grão produzido na Etiópia] são culturas importantes para os mais pobres. "Muitas dessas variedades com certeza não são as mais importantes para a indústria", disse.

Há alguns anos os especialistas têm demandado pesquisas patrocinadas pela iniciativa pública sobre as variedades de grãos locais tradicionais. Vários projetos promissores já estão sendo realizados. Os cientistas da África do Sul, por exemplo, desenvolveram um tipo de milho resistente ao devastador vírus estriado fino do milho. Uganda está testando bananeiras com maior resistência à doença Sigatoka Negra, uma infecção por fungos que pode destruir até 50% da colheita.

Os cientistas da África e da Ásia estão fazendo experiências com tomate, berinjela, folhas de mostarda e couve-flor geneticamente modificados. O arroz, grão mais importante para quase metade da população mundial, já está sendo modificado em laboratórios de genética.

Os cientistas chineses estão testando um arroz resistente a insetos no próprio país. Uma variedade similar de arroz já está sendo cultivada comercialmente no Irã. Novos testes em campo com o "arroz dourado" começaram no início desse mês nas Filipinas. Com a intervenção genética, o arroz de grãos amarelos contém beta-caroteno, um precursor da vitamina A. A esperança é que o arroz dourado possa eventualmente prevenir a deficiência da vitamina que causa cegueira em cerca de meio milhão de crianças a cada ano.

Institutos de pesquisa de sete países juntamente com a companhia agrícola suíça Syngenta estão envolvidos no desenvolvimento do arroz dourado, como parte de um modelo que poderia apontar para o futuro dessas iniciativas. No futuro, prevê Joachim von Braun do Instituto Internacional de Pesquisa em Política Alimentar de Washignton, "as companhias biotecnológicas, com sua alta tecnologia, farão parcerias com os institutos biotecnológicos de países em desenvolvimento que fornecerão o conhecimento local."

Braun espera que as plantas GM compensem as safras prejudicadas pelas secas ou enchentes no futuro, "mas isso não acontecerá rapidamente". Apesar dos grandes orçamentos para pesquisa das companhias de biotecnologia, a própria tecnologia ainda permanece como um empecilho.

As plantas criadas geneticamente podem funcionar?

"A pesquisa está avançando em um ritmo muito mais lento do que se esperava", diz Klaus-Dieter Jany, do Instituto Max Rubener na cidade de Karlsruhe no sudoeste da Alemanha. Plantas resistentes à seca e tolerantes ao sal para áreas de água salobra, por exemplo, ainda estão em desenvolvimento, diz Jany. Usar as ferramentas da engenharia genética para aumentar a produção das lavouras é tão complicado que a maior parte dos pesquisadores geneticistas ainda não tentou.

Isso significa que as plantas modificadas são incapazes de satisfazer todas as expectativas? Algumas companhias agora voltaram a incentivar os métodos de cultivo convencionais. "Estamos utilizando toda a paleta de tecnologias agrícolas", diz Robert Berendes, integrante da equipe de planejamento da Syngenta, "não há uma solução patente". Berendes cita a "proteção química moderna" como exemplo e enfatiza as vantagens de se cultivar beterrabas pelo método convencional, com o qual as plantas podem crescer "num solo improdutivo com um alto teor de sal."

A Syngenta também enfatiza um processo conhecido como seleção baseada na marcação. O método acelera o cultivo porque a análise do material genético é usada para selecionar os brotos com características mais promissoras. Nas Filipinas, por exemplo, uma equipe do Instituto Internacional de Pesquisa do Arroz descobriu uma seqüência genética que faz com que as plantas sobrevivam melhor às enchentes.

O arroz normalmente morre rápido quando submerso pela água. Mas se a seqüência genética mais vantajosa for inserida nas variedades comerciais, suas chances de sobreviver às enchentes aumentam.

A maioria dos especialistas concorda que, a longo prazo, os produtos desenvolvidos pelos engenheiros genéticos vão terminar nas lavouras dos mais pobres. "Todavia, as plantas modificadas terão de ser planejadas com maior eficiência, sob medida para as condições naturais e sociais dos países em desenvolvimento", diz a cientista social Jiggins. Além disso, ela acrescenta, será necessário muito mais investimento em pesquisa antes que os grãos GM dêem frutos no mundo em desenvolvimento.

Será que os financiadores privados irão preencher esta lacuna mais uma vez? A primeira revolução verde da metade do século 20, que até hoje é controversa, foi financiada em parte pelas fundações Ford e Rockefeller nos Estados Unidos. Em 2006, este último formou uma aliança com a fundação estabelecida pelo criador da Microsoft Bill Gates para fazer uma nova revolução verde na África. Gates também doa milhões de dólares através de um programa chamado Grandes Desafios da Saúde Mundial. Esse programa já investiu cerca de US$ 18 milhões no projeto do Super Sorgo de Florence Wambugu.

Os ambiciosos planos de Wambugu, ex-funcionária da Monsanto, falharam inicialmente por conta do debate em torno da engenharia genética. No fim das contas, o medo humano pode impedir uma segunda revolução verde. As autoridades sul-africanas já proibiram os primeiros experimentos em estufa com o super sorgo de Wambugu, argumentando que ele seria muito perigoso para o meio-ambiente.

(Por Philip Bethge, Der Spigel, tradução de Eloise De Vylder, UOL, 27/04/2008)


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