A Suzano Papel Celulose - que possui plantações no norte do Estado - e a Votorantim Celulose e Papel (VCP) estão proibidas por tempo indeterminado de realizar novos plantios de eucalipto no município de São Luís do Paraitinga (SP). A decisão é inédita no estado, e foi motivada por Ação Civil Pública movida por pequenos agricultores da região.
O desembargador Samuel Júnior, da 1ª Câmara Ambiental do Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo, deferiu decisão favorável ao Agravo de Instrumento 759.170.5/3-00, impetrado pela Defensoria Pública de Taubaté, em Ação Civil Pública de número 593/2007, proposta em nome do Movimento em Defesa dos Pequenos Agricultores (MDPA) local, contra o plantio indiscriminado de eucalipto no município.
O desembargador determinou a suspensão imediata de novos plantios, replantios e corte de eucalipto por tempo indeterminado, incluindo também os plantios realizados através da estratégia do fomento, até que seja feito um estudo aprofundado de impacto ambiental e elaboração do relatório EIA/Rima.
Figuram como réus na ação as gigantes do setor de celulose Suzano e Votorantim e os governos estadual e municipal, que têm o dever constitucional de fiscalizar e exigir o cumprimento da legislação ambiental, e estavam sendo omissos, como aponta a ação.
As empresas são apontadas como responsáveis por degradar o meio ambiente e causar danos à saúde dos camponeses. Movida pelo defensor público Wagner Giron, a ação afirma que já há casos de perda de memória e convulsões, devido à contaminação por agrotóxicos.
De acordo com o documento, além dos prejuízos aos agricultores, muitas são as vítimas dos agrotóxicos. A Sra. Benedita foi vítima da intoxicação da mina d'água que abastece sua casa. Em função disto, a camponesa passou a sofrer convulsões, enrijecimento dos membros, perda de memória, diminuição da capacidade de trabalho e depressão profunda, como conta o defensor público. Denuncia ainda que a Suzano e a Votorantim utilizam venenos que são carregados pela chuva e pelo ar, contaminando, assim, os animais que se alimentam do capim envenenado.
Na região, as denúncias feitas neste sentido foram ignoradas pelas autoridades, que chegaram a aconselhar a população a não mexer com "os grandes".
A Votorantim Celulose e Papel S/A e Suzano Papel Celulose são conhecidas também pelo plantio de eucalipto no norte do Estado, e apontadas pelo Movimento dos Pequenos Agricultores (MPA-ES) como responsáveis por problemas semelhantes aos vividos em São Paulo.
O MPA ressalta que os casos de intoxicação da água, da terra e mesmo de pequenos agricultores são comuns em locais ilhados pelo eucalipto da Aracruz Celulose, nos municípios de São Mateus e Conceição da Barra, antigo território do Sapê do Norte. Além disso, o solo já está bastante debilitado devido à monocultura do eucalipto, que exige intensa aplicação de venenos.
Contra esta situação, os agricultores de Paraitinga reuniram mais de 800 registros de pessoas da região que relatam, com fidelidade, a série de devastações ambientais e sociais, deflagrada a partir do início do ciclo da monocultura há três décadas, e que foram enumerados na Ação Civil Pública.
A empresa deu início ao seu ciclo industrial em São Paulo através de uma propriedade rural, e com o tempo foi adquirindo mais áreas. A cidade de São Luiz do Paraitinga já tem 20% de seu território ocupado e a intenção do Movimento em Defesa dos Pequenos Agricultores (MDPA) é impedir que o eucalipto ocupe mais do que a metade do território, como ocorreu no município capixaba de Conceição da Barra, onde 70% do território já foi coberto pelas plantações.
Mesmo com menos da metade de sua área ocupada, os camponeses de São Paulo descrevem que a terra do município de São Luiz de Paraitinga está arrasada pelos anos de exploração da Suzano e da Votarantim. "Nenhum pássaro, nenhuma planta nativa, nenhum curso d'água sobreviveu a tão criminosa investida do grande capital através da devastadora monocultura do eucalipto, eu certo que entorta a vida do povo e de toda a biodiversidade".
Além disso, as empresas são acusadas de utilizarem árvores geneticamente modificadas, deixando a comunidade local ainda mais apreensiva quanto aos efeitos da atividade, que na ação, é apontada como uma atividade que opera em promiscuidade com os governos locais e em descumprimento às leis ambientais.
"Elas entram com a tecnologia, com o controle do mercado comprador europeu-americano, ficam com os altos lucros e nos deixam a pobreza, o desemprego, a poluição, a degradação do meio ambiente, a redução do lençol freático, terras imprestáveis para a agricultura, alteração no clima e a contaminação das águas pelo uso intensivo da soda cáustica para transformar a madeira em pasta de celulose, e no dióxido de cloro para o branqueamento do papel, que gera toxinas cancerígenas que permanecem na água utilizada".
Diz ainda a ação: "Toda essa gama de pareceres científicos, ou mesmo singelas observações empíricas do fenômeno social e ambiental da expansão da monocultura do eucalipto, como se infere, não é uma questão limitada aos interesses municipais".
O documento conclui que a degradação no município deriva-se de um processo planetário de degradação ambiental implementada sempre com o concurso das empresas envolvidas na própria ação. Para o defensor público Wagner Giron, o que ocorre em São Paulo, ocorre também em outras partes do país em que haja essa cultura e é, portanto, decorrência direta do sistema capitalista global que ignora os direitos e a vontade das comunidades locais, nos mais diversos recantos do planeta.
(Por Flávia Bernardes,
Século Diário, 24/04/2008)