Um inseto do tamanho de um grão de arroz poderá ser o responsável por transformar as florestas da América do Norte em gigantescas fontes de dióxido de carbono, o mais importante gás ligado ao aquecimento global. Um novo estudo indica que o besouro em questão, ao se multiplicar descontroladamente e matar árvores, alteraria um bocado -- e para pior -- a interação entre as matas do Canadá e o clima da Terra.
A afirmação parece catastrofista, mas se baseia nos dados mais recentes sobre a ação nefasta do besouro Dendroctonus ponderosae, que afeta várias espécies de pinheiros nas regiões mais frias e montanhosas da América do Norte. Na Colúmbia Britânica (sudoeste do Canadá), o surto atual de multiplicação do bicho é dez vezes pior do que todos os outros eventos do tipo registrados até hoje. E, levando em conta o aquecimento projetado para a próxima década, a tendência é que a situação fique mais grave ainda.
A estimativa foi feita por uma equipe de pesquisadores capitaneada por Werner Kurz, do Serviço Florestal Canadense, e deve ser publicada na edição desta semana da revista científica "Nature". O trabalho é assustador por demonstrar claramente um dos temidos "feedbacks positivos" -- efeitos colaterais do aquecimento provocado pelo homem que tendem a intensificá-lo ainda mais nas décadas vindouras.
Vermelho-morte
Apesar de pequeno, o Dendroctonus ponderosae é capaz de levar um pinheiro adulto à morte com facilidade. O bicho parasita o floema, parte do sistema vascular da planta que carrega sua seiva. Ao botar ovos nessa região e se alimentar da camada abaixo da casca da árvore, os bichos se multiplicam de tal maneira que acabam com a circulação de nutrientes nos pinheiros. Restam apenas grandes áreas avermelhadas de floresta -- as árvores mortas acabam assumindo essa cor.
Acontece que o habitat da criatura se expandiu consideravelmente nos últimos anos: no Canadá, os invernos estão mais quentes, a temperatura máxima no verão também aumentou, e as florestas estão menos chuvosas. Quando as árvores morrem, todo o carbono armazenado em seu tronco, folhas e raízes é transformado em dióxido de carbono e lançado na atmosfera. Por enquanto, o balanço ainda é positivo: a quantidade do gás-estufa produzida pelas árvores que morrem é menor do que o gás carbônico absorvido pelas plantas que estão crescendo.
No entanto, as projeções feitas por Kurz e seus colegas indicam que, nos próximos anos, o sinal da equação vai se inverter. A quantidade de gás carbônico emitida passará a ser bem maior, de forma que, infestada de besouros, a mata deixará de aliviar o aquecimento global e passará a agravá-lo. A questão que fica no ar é quão comuns serão os eventos imprevistos desse tipo, nos quais a mudança de temperatura vai desencadear processos biológicos que, por sua vez, darão força ainda maior ao aquecimento.
(Por Reinaldo José Lopes, G1, 23/04/2008)