Itamaraty concorda com manutenção de parte das subvenções agrícolas adotadas por nações ricasChanceler Celso Amorim afirma ser necessário haver "redução substancial" em pagamentos a agricultores de países industrializados
Acra (Gana) O Brasil está disposto a aceitar a manutenção de parte dos subsídios agrícolas dos países ricos, se esse for o preço para concluir a bastante atrasada Rodada Doha da OMC (Organização Mundial do Comércio).
A promessa foi feita ontem em Acra, capital de Gana, por um dos principais negociadores dos países em desenvolvimento, o chanceler brasileiro, Celso Amorim. Teria que haver, no entanto, uma redução "substancial" desses subsídios para que um acordo ocorra, segundo Amorim, que não citou de quanto seria tal diminuição.
"No caso dos subsídios internos, o correto seria acabar. Mas na política se tem que lidar com realidades. Talvez acabar seja muito difícil, mas uma redução substancial é importante em relação ao que é permitido hoje", afirmou Amorim, pouco antes de deixar o país, onde participou da conferência da Unctad, órgão das Nações Unidas para o desenvolvimento.
Os subsídios internos são aqueles que os países ricos (europeus, EUA e Japão, principalmente) oferecem a seus agricultores, fechando, assim, seus mercados às importações. São, por isso, os mais difíceis de eliminar politicamente. Além deles, há os subsídios à exportação, quando os países auxiliam seus produtores a vender produtos para fora, freqüentemente tirando outros mercados de países pobres. Esses devem acabar totalmente, segundo Amorim.
O pragmatismo do brasileiro, conhecido por ser um negociador duro, é movido pela urgência de fechar logo um acordo.
Amorim reuniu-se ontem com o diretor-geral da OMC, o francês Pascal Lamy, em Acra, e disse que é preciso concluir a rodada neste ano, porque a nova administração norte-americana, que assumirá em janeiro, deverá levar um tempo para se inteirar do processo, atrasando-o ainda mais. A Rodada Doha se arrasta há sete anos, e a questão agrícola se mantém como grande entrave. "Além de um certo momento em junho, será tarde demais. Estou realmente preocupado com isso", disse Amorim.
Biocombustível enfrenta onda de ceticismoA crise alimentar derrubou a unanimidade em torno dos biocombustíveis, inclusive entre os países mais pobres, mostrou debate ontem no encontro da Unctad, em Gana. A política brasileira enfrentou uma barragem de ceticismo por representantes de países tão diversos como Holanda, Peru, Zâmbia e Moçambique. Não descartaram o biocombustível, mas deixaram claro que a prioridade é investir na alimentação. O diretor do Departamento Econômico do Itamaraty, Carlos Cozendey, afirmou que existe certa "hipocrisia" contra o biodiesel. "Não vejo ninguém falando sobre a sustentabilidade do petróleo." (FZ)
(Folha de S.Paulo,
FGV, 23/04/2008)