Os biocombustíveis perderam o prestígio que tinham. Na segunda-feira, 21 de abril, o presidente peruano, Alan Garcia, os acusou de estarem na origem da atual crise alimentar. A ministra alemã da cooperação e do desenvolvimento fez um apelo para suspender a produção de combustíveis à base de cereais até que esta crise seja solucionada. Além disso, eles foram alvos de uma saraivada de críticas por ocasião de uma reunião do Fórum Internacional da Energia, em Roma.
Desde já, os industriais do setor começaram a trabalhar no desenvolvimento da segunda geração de biocombustíveis, baseada na biomassa (o conjunto das matérias orgânicas). Esta, segundo prometem, apresentará muito mais virtudes do que a primeira. Por enquanto, a proposta corresponde antes a uma aposta. Enquanto pesquisadores, em inúmeros lugares do planeta, vêm trabalhando duro para encontrar o recurso e a tecnologia ideais, será preciso esperar uma dezena de anos até que se consiga passar para a produção em quantidade industrial deste combustível do futuro.
"Ainda restam muitas questões para serem resolvidas", insiste Dominique Dron, o responsável da nova cátedra da Escola das Minas, dedicada às novas estratégias energéticas. O futuro dos biocombustíveis da segunda geração depende das respostas que serão fornecidas para as seguintes questões.
O recurso à biomassa evitaria mesmo disputar espaços com as culturas de vocação alimentícia? Este é um dos principais argumentos que motivam a desenvolver a segunda geração: o fato de utilizar a totalidade da planta - e não mais apenas a semente ou o tubérculo - permite valorizar a parte não comestível das culturas. A ausência de toda concorrência com a produção de gêneros alimentícios fica ainda mais evidente quando a biomassa provém da madeira ou dos seus resíduos.
Entretanto, a exploração de recursos não alimentícios também apresenta diversos problemas. O primeiro diz respeito à necessária preservação dos solos. "As reservas de humo (camada superior do solo composta por matérias de origem orgânica, essencialmente vegetal, decompostas ou em decomposição) que desempenham um papel muito importante na fertilidade dos solos, dependem dos aportes de resíduos de culturas", explica Cathy Neill, da Escola Normale Supérieure. Portanto, o fato de interferir na quantidade de humo poderá ter conseqüências sobre o meio ambiente. Tanto mais que, segundo a pesquisadora, "estima-se que o humo possui uma capacidade de estocagem do carbono três vezes superior àquela das plantas terrestres". Além disso, existe um segundo limite: a utilização da madeira não deve conduzir ao desmatamento, pois o preço a pagar seria o de acentuar ainda mais o aquecimento climático.
O rendimento energético dos biocombustíveis da segunda geração será mesmo satisfatório? "Por enquanto, os rendimentos permanecem muito reduzidos", constata Claude Roy, o coordenador interministerial para a valorização da biomassa. O processo de conversão das moléculas celulósicas que compõem a biomassa requer a utilização de tecnologias complexas, que deverão ainda progredir consideravelmente para que elas venham a oferecer um verdadeiro ganho energético. A sofisticação e o custo dessas tecnologias são fontes de preocupação para a Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento (Cnuced), que teme que os países do Sul não possam ter acesso a elas.
O impacto sobre o meio ambiente será menor, se comparado àquele exercido pela primeira geração? A resposta a esta pergunta depende da equação tecnológica precedente. Mesmo se os promotores dos biocombustíveis de segunda geração sublinham, por exemplo, que não é preciso utilizar nem adubos nem pesticidas para cultivar árvores.
Ninguém deverá esperar dos avanços rumo à segunda geração que eles revolucionem a posição dos biocombustíveis na classificação das soluções alternativas às energias fósseis. Thomas Guillé, um pesquisador no Cirad (Centro de Cooperação Internacional em Pesquisas Agronômicas para o Desenvolvimento), calculou que dos 4 bilhões de toneladas de resíduos agrícolas produzidos anualmente em todo o mundo, e considerando-se os diferentes usos que se faz deles, 300 milhões de toneladas apenas poderiam ser convertidas em energia.
Este número deve ser comparado, mesmo se ele não leva em conta a produção de madeira, com a atual produção mundial de energia primária, que alcança 11 bilhões de toneladas, incluindo-se aqui o petróleo e os seus equivalentes.
(Por Laurence Caramel, Le Monde, tradução de Jean-Yves de Neufville, UOL, 22/04/2008)