"Perigo, sujeito a inundações", avisa a placa junto à taipa da represa da barragem de Ernestina, a primeira das cinco grandes existentes no Jacuí. O alerta soa como piada. O rio está tão raso, em função da estiagem, que a enorme murada de concreto ficou praticamente seca. A parede, que deveria formar cascatas, está lisa e apenas filetes imperceptíveis de água escorrem por ela.
Abaixo da represa, situada a 300 quilômetros de Porto Alegre, o Jacuí sumiu e, no lugar dele, ficaram milhares de poças de água, formadas no solo rochoso, feito crateras lunares. O rio vira ali um riacho, e não deixa nem sombra do portento que abastece toda a Região Metropolitana.
A estiagem compromete a irrigação das lavouras e o abastecimento urbano das cidades próximas. Tio Hugo, município situado às margens da barragem, decretou situação de emergência em função da seca. O cálculo de técnicos da Emater é de que 40% das plantações de soja e 60% das de milho tenham sido perdidas em decorrência da falta de chuva. Ontem, enquanto a Grande Porto Alegre era atingida por chuvarada, o sol brilhava, calcinante, sobre a região da Ernestina.
Navegar ali tornou-se um perigo. Maior balneário da região do Planalto Médio e point de veranistas de Passo Fundo, a barragem está quase quatro metros abaixo do nível normal.
Com a seca, aflorou uma verdadeira floresta de troncos de árvore apodrecidos - resquícios da inundação que gerou o lago, em 1962. Mesmo com barcos pequenos, é difícil driblar os tocos. Para lanchas, o perigo é maior, pois as hélices podem arrebentar na madeira, deixando o barco à deriva.
- Nunca vi seca tão grande. E olha que navego aqui há uns 20 anos - comenta o comerciante Marcos de Oliveira, dono de restaurante em Passo Fundo e de uma canoa que ele botou para navegar durante o feriadão.
Oliveira acertou no diagnóstico. Conforme o técnico da Emater Carlos Groth, desde 1986 a região não é atingida por um período tão longo de estiagem.
(Por Humberto Trezzi, Zero Hora, 22/04/2008)