Jesus Leon Santos, ganhador do Prêmio Ambiental Goldman 2008, viveu desde criança o drama da escassez de árvores.
México, 21 de abril (Tierramérica).- As empresas de sementes transgênicas subornam autoridades e realizam campanhas milionárias de publicidade repletas de mentiras a fim de “criar monstros que atentam contra a vida”, denunciou o indígena mexicano Jesus Leon Santos, ganhador do Prêmio Ambiental Goldman 2008. “Demonstramos que as técnicas de cultivo de nossos antepassados são as melhores e que representam a vida. Estamos no caminho verdadeiro”, disse Santos em entrevista exclusiva ao Terramérica.
Este camponês, de 42 anos, que desde os 18 comanda iniciativas de regeneração de terras inspirado em ancestrais conhecimentos indígenas, foi distinguido, no dia 14 de abril, com o prêmio concedido anualmente pela norte-americana Fundação Ambiental Goldman, considerado o Prêmio Nobel ecológico. O programa de Santos é executado em uma empobrecida região indígena do Estado mexicano de Oaxaca, parte da Mixteca, uma das áreas de maior erosão do mundo, segundo estudos das Nações Unidas, e também convertida em uma fábrica de emigrantes.
O Centro de Desenvolvimento Integral Camponês da Mixteca, dirigido por Santos, semeou ali cerca de quatro milhões de árvores, desenvolveu sistemas de retenção de água da chuva e promoveu cultivos tradicionais. Cerca de 400 famílias indígenas se beneficiaram diretamente com os projetos e muitos moradores mais se somam às suas iniciativas. Mas, sobretudo, recuperou a tradição da milpa, forma de cultivo das culturas pré-hispânicas da Mesoamérica, que ajuda a manter o solo fértil.
A Mixteca inclui parte dos Estados de Guerrero, Oaxada e Puebla, no sul do país, habitada pela etnia mixteca ou ñuu savi (povo das chuvas ou das nuvens). Sua porção oaxaquenha compreende 16 mil quilômetros quadrados. O prêmio de Santos, de US$ 150 mil, correspondeu à região da América do Norte. Também foram premiados os equatorianos Pablo Fajardo e Luis Yanza, o moçambicano Feliciano dos Santos, a porto-riquenha Rosa Hilda Ramos, a russa Marina Rikhvanova e o belga Ignace Schops.
P- O que significa para você e sua organização o Prêmio Goldman?
R- Foi o que de mais importante me aconteceu em muito tempo. Isto nos une com pessoas que estão conservando o meio ambiente e nos fortalece. Os US$ 150 mil irão para um fundo de minha organização para continuar desenvolvendo nosso trabalho. Imagine só, representa o orçamento de todo um ano, pois manejamos US$ 100 mil provenientes de organizações européias.
P- Idealizar e desenvolver projetos como o seu em uma região pobre, com terras degradadas e de alta emigração é uma tarefa difícil. Como começou?
R- Me envolvi porque quando era criança via que tínhamos muitas dificuldades. Meus país me mandavam buscar lenha e tinha que caminhar horas e horas porque era muito escassa, pois as árvores tinham desaparecido. O que pensamos é que a Mixteca tinha que ser novamente verde, como no passado, e isso, na verdade, era apenas palavras, pois não sabíamos o que fazer. Depois veio a luz, e 25 anos depois vimos que conseguimos o que jamais imaginamos.
P- Quais são as mudanças mais palpáveis?
R- Muita gente diz que é um paraíso, e de repente lhes digo que é um paraíso que se foi criando. Hoje desfrutamos de madeira, lenha e aves que há anos não ouvíamos o canto porque não havia árvores. O solo começa a mudar. Quando se caminha, o ruído das folhas que fazem nossos pés, jamais havíamos ouvido.
P- Que papel tiveram nesse êxito as formas pré-hispânicas de cultivo e conservação de terras?
R- Além de plantar árvores e criar faixas para reter a água da chuva, recuperamos sistemas tradicionais de cultivo, a milpa, que consiste em plantar milho, abóbora, feijão e outros na mesma área, usando as sementes retiradas da própria colheita, sem comprar nada. Isso faz com que os solos não sofram deterioração e melhorem a fertilidade. Ao contrário das monoculturas, estes sistemas não só fornecem uma alimentação balanceada, mas conservam a fertilidade. Nos anos 70 e 80, quando aqui se começou a utilizar fertilizantes e sementes melhoradas, foi se afastando esse conhecimento que tinham nossos povos, mas o recuperamos.
P- As empresas de sementes transgênicas pedem ao México que permita plantar suas variedades de milho, pois afirmam que são muito mais produtivas. O que diz sobre isso?
R- As sementes transgênicas podem ser monstros diante do que a natureza faz. Não podemos brincar como que é natural, e estas companhias, na verdade, estão criando monstros que atentam contra a vida, não apenas das sementes nativas, mas contra nós. Digo às empresas de sementes que fazem campanhas pouco éticas, porque mentem e subornam os governos.
P- Mas, a cada ano aumentam os cultivos transgênicos no mundo e os promotores afirmam que sua tecnologia veio para ficar.
R- A todos que pensam que nossos sistemas antigos são questões românticas dizemos que estamos no caminho verdadeiro. O que eles estão propondo é um desastre. Quando estas sementes modificadas não puderem ser controladas, poderão causar uma catástrofe mundial.
P- Como enfrentar esse perigo, que você vislumbra?
R- Temos que fazer como eles, campanhas. Eles têm muito dinheiro e podem fazer sua propaganda milionária e às vezes até comprar as autoridades para permitir a plantação. Nós temos que trabalhar de outra forma, convencendo o público e demonstrando que, na verdade, o que estamos fazendo é vida.
(Por Diego Cevallos, IPS, FGV, 20/04/2008)