Presidente eleito do Paraguai diz que quer 'preço justo' por energia produzida na usina de Itaipu
O bispo Fernando Lugo, presidente eleito do Paraguai, declarou nesta segunda-feira, 21, que espera uma reunião "o mais rápido possível" com o governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva para iniciar o diálogo sobre a revisão antecipada do Tratado de Itaipu. Lugo pretende conseguir o que denomina de "preço justo" para as tarifas que o Brasil paga ao Paraguai pela energia elétrica que o país não consome e repassa como excedente ao mercado brasileiro. Lugo, ao longo da campanha, havia dito que o Paraguai reenviava a energia ao Brasil a "preço de custo" e não a "preço de mercado".
Em declarações aos enviados especiais da imprensa brasileira, entre eles o Estado, Lugo disse que "a primeira medida sobre o caso de Itaipu será o de formar uma equipe técnica" para analisar o preço real da energia produzida nessa hidrelétrica binacional.
Lugo exige que o governo brasileiro aceite a revisão antecipada do Tratado de Itaipu (marcada originalmente para 2023). "Lula mostrou-se disposto a isso", sustentou, em referência à reunião que teve com o presidente brasileiro em Brasília recentemente. "Ele diz que em muitos casos, nem seus técnicos coincidem sobre os números" explicou Lugo, para destacar que dentro do próprio governo Lula existem divergências sobre os preços pagos ao Paraguai.
Segundo Lugo, eleito neste domingo com 40,82% dos votos, "queremos a chance de sentar à mesa, com diversidade de opiniões, e falar sobre o tratado de Itaipu, a administração, a transferência de energia, e definir o que é um 'preço justo' e o que é preço de mercado".
"Esperamos que isso possa ser dialogado o mais rápido possível", disse o presidente eleito, líder da Aliança Patriótica para a Mudança (PAC), uma colcha de retalhos que une sob seu comando grupos de extrema esquerda, sem-terra, movimentos indígenas e setores conservadores tradicionais, junto com grupos de centro e centro-direita como o Partido Liberal Radical Autêntico (este último, será sua principal base no Parlamento).
Sem efeito Evo
Lugo não será um "Evo Morales paraguaio", afirmam os analistas em Assunção em referência ao comportamento que o presidente da Bolívia teve em relação ao fornecimento de gás de seu país para o Brasil. Eles afirmam que, ao contrário do socialista boliviano, o bispo paraguaio "não pode fechar uma torneira de um gasoduto e pressionar o Brasil. Com Itaipu é diferente".
Ele admite que sua via terá que ser diplomática. Nesta segunda, afirmou que está descartado que as divergências paraguaias com o Brasil sobre Itaipu possam levar à uma crise como a ocorrida nos últimos anos entre o governo da Bolívia e a Petrobras. "Acho que é muito diferente. Nós temos um tratado binacional em Itaipu. E a Bolívia tinha um contrato com uma empresa. Isso marca uma diferença. No nosso caso, a conversa é de Estado para Estado. Vamos buscar um consenso que seja bom para os dois países".
Segundo ele, "esperar até 2023 (data prevista para a revisão do acordo de Itaipu) não é algo que convenha aos paraguaios".
Lugo disse que descarta apelar à Corte Internacional da Haia para resolver a controvérsia, em caso de impasse entre seu governo e o de Lula: "se for o caso, esperamos resolver isso de forma local, talvez pedindo a mediação de um país da região". No entanto, evitou especular qual país poderia eventualmente ser convocado para mediar entre o Paraguai e o Brasil. "Eu confio na racionalidade e objetividade do governo brasileiro".
Diversos setores da sociedade paraguaia costumam criticar a política do Brasil em relação ao país, afirmando que os diversos governos brasileiros - e o empresariado - são "imperialistas" com o Paraguai. Mas, perguntado sobre o suposto "imperialismo brasileiro", Lugo rejeitou esse rótulo: "não acho que seja assim".
(Ariel Palacios, O Estado de São Paulo, 21/04/2008)